Sanders reforçado e Biden ligado à máquina depois de primárias no New Hampshire

Ciente do mau resultado no New Hampshire, Biden deslocou-se para a Carolina do Sul para garantir o voto negro.

Saídos os resultados preliminares das primárias do New Hampshire, na terça-feira (madrugada de quarta-feira em Portugal), o comentador da CNN Anthony Van Jones, antigo membro da administração de Barack Obama, furou o entusiasmo dos seus colegas com a senadora do Minnesota Amy Klobuchar e com Peter Buttigieg, ex-mayor de South Bend.

“Acho que não devemos perder o óbvio aqui. Bernie Sanders é um fenómeno. Ele não recebe nenhuma atenção, as pessoas não falam dele mas ele continua a acumular estes grandes números”, constatou Jones, notando o apoio do senador do Vermont entre os jovens, pessoas de cor e mulheres. “Ele tem um exército incrível de doadores. Se alguém tivesse isso tudo, estávamos a dizer: ‘Este é o nosso tipo’. Por qualquer razão, continuamos a falar de toda a gente, exceto de Bernie Sanders”.

A afluência às urnas nas primárias do New Hampshire ultrapassou o recorde de 2008, perfazendo mais 290 mil votos. E o resultado foi renhido entre Sanders (25,9%) e Buttigieg (24,4%), com uma diferença de pouco mais de 4 mil votos entre os dois: seguiram-se Klobuchar (19,8%); a senadora do Massachusetts Elizabeth Warren (9,8%); e o ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Joe Biden (8,4%). Só os três primeiros arrecadaram delegados, por terem obtido mais de 15% dos votos – Buttigieg e Sanders com nove cada e Kobluchar com seis.

Com a vitória neste pequeno estado, Sanders toma o controlo da ala esquerda do Partido Democrata, em detrimento da rival progressista Warren, cuja candidatura tem perdido fulgor desde a entrada do novo ano e com os maus resultados alcançados no Iowa e na noite desta terça-feira.

O resultado no New Hampshire mostra que Sanders pode estar a captar a grande maioria dos eleitores à esquerda. Segundo as sondagens à boca da urna da CNN, o senador do Vermont conquistou 48% dos eleitores do New Hampshire que se consideram “muito liberais”, enquanto Warren ficou-se pelo segundo lugar nessa disputa a uma larga distância de Sanders. O senador do Vermont também foi muito popular no voto jovem, entre os 18 e 29 anos (51%).

“Deixem-me dizer que a vitória desta noite é o início do fim de Donald Trump”, rematou Sanders, aproveitando para criticar Buttigieg e as doações que tem recebido de multimilionários, algo que o senador do Vermont rejeita. “Nesta altura da campanha, estamos a enfrentar multimilionários, e a confrontar candidaturas financiadas por multimilionários”.

 

Biden enfraquecido

Mas a maior surpresa da noite não foi o triunfo do socialista democrático, que já tinha alcançado uma vitória arrebatadora em 2016 frente a Hillary Clinton no New Hampshire, um estado que se pensava dominado pela poderosa família democrata. Foi, sim, o pobre resultado de Biden, cuja candidatura tem sido considerada, desde o ano passado, como a favorita das favoritas para enfrentar Donald Trump. 

O campo moderado foi-lhe roubado por Klobuchar, que obteve um resultado surpreendente no New Hampshire, e por Buttigieg, que partilhou os dois primeiros lugares do pódio com Sanders nas duas primeiras eleições para a nomeação presidencial: no Iowa, Buttigieg obteve mais um delegado que o senador socialista democrático, mas perdeu em número de votos. 

Não foi por acaso que Biden não permaneceu no New Hampshire e, quando saíram os resultados preliminares, já discursava na Carolina do Sul, onde decorrerão as quartas eleições para a nomeação presidencial, a 29 de fevereiro – o caucus do Nevada é no dia 22 de fevereiro. 

A deslocação prematura à Carolina do Sul visou garantir o apoio do voto negro. Enquanto o Iowa e o New Hampshire são pouco diversos etnicamente, cerca de 30% da população da Carolina do Sul é composta pela comunidade negra, entre a qual o ex-vice de Obama é popular. Ao contrário, Buttigieg não tem sido apelativo para a comunidade afro-americana.

“Os eleitores negros estão a começar a afastar-se dele [Biden]. A grande razão pela qual muitos eleitores negros estavam com Biden é porque pensavam que ele era a melhor pessoa para enfrentar Trump. E pensaram que uma das razões para isso era porque tinha o apoio dos eleitores brancos. Agora veem que se saiu mal com os eleitores brancos e não se parece mais com o candidato elegível”, sustentou ao Politico o diretor executivo da Colective, um comité de ação política que apoia candidatos afro-americanos.

Mas nada está decidido. Para ganharem a nomeação presidencial, os candidatos necessitam de alcançar, no mínimo, 1990 delegados – Buttigieg tem 23 delegados acumulados, seguido de Sanders (21). Muito se decidirá na “super terça-feira”, onde estarão 1344 delegados em disputa. E aí entrará na corrida Michael Bloomberg, multimilionário que tem gasto valores recorde do seu próprio dinheiro em propaganda.

O que determinou o voto dos eleitores?

As sondagens à boca da urna do Washington Post demonstram que os temas mais importantes para os eleitores na determinação do seu voto foram: arranjar um candidato que acreditem poderá derrotar Trump em novembro (quase 60% dos eleitores); substituir todos os planos de seguro de saúde privados por um só, gerido pelo Governo, e para todos (cerca de 60%); universidades públicas com propinas gratuitas (dois terços) – três em dez opõem-se a esta medida, enquanto nove em dez dos eleitores que votaram em Sanders apoiam-na.

Apenas 20% dos eleitores se consideram “muito liberais” e quatro em dez disseram-se “um pouco liberais”, enquanto os outros 40% se afirmam “moderados ou conservadores”. Não obstante, a volatilidade do voto no New Hampshire foi impressionante: 50% dos eleitores decidiram em quem votar à última hora.