A porta giratória…

Com o PS no poder, a porta giratória não pára… sai-se do Governo para sinecuras, mesmo quando se tutelou o ‘agasalho’ que se veste a seguir, sem o menor rebuço, nem cuidar de ‘período de nojo’…

A possível ‘transferência’ de Mário Centeno, das Finanças para o Banco de Portugal, será apenas, a confirmar-se, mais uma história a juntar a outras em que tem sido fértil o nosso quotidiano político.

Não faltarão argumentos para justificar o que deveria ser evitado por vergonha. Dir-se-á – e é verdade – que o PS não tem o exclusivo destas ‘instalações’ pouco criativas.

De facto, nem o PSD nem o CDS poderão excluir-se dessa volúpia de ‘aconchegar’, em luzidos lugares, os ex-governantes que se ‘sacrificaram’ pela causa pública… Reconheça-se, porém, que a ‘folha de prebendas’ do Largo do Rato é imbatível.

Claro que os resultados desse ‘tudo posso e tudo mando’ acabam às vezes mal. Mas que importa?…

Mário Centeno, com o à-vontade que hoje contrasta com o seu perfil inicial de ‘patinho feio’ no Parlamento, já confidenciou ao Expresso que não vê «nenhum conflito de interesses», nem incompatibilidades, na hipótese de substituir, o governador Carlos Costa, no termo do mandato (que tentou abreviar, sem êxito, enquanto ministro das Finanças).

Poderá invocar, a seu favor, que não é inédito – embora erros passados não caucionem novos erros –, ou que conhece bem a casa, onde se resguardou em gabinetes de estudo, afeiçoando ‘ódios de estimação’, segundo reza a crónica.

Quando se libertou da obscuridade, mal chegado ao Terreiro do Paço, Centeno procurou ‘acertar contas’ antigas, com o patrocínio de António Costa, que não se fez rogado, fazendo constar que o governador perdera a confiança do Governo.

Defrontou-se, no entanto, com uma inesperada resistência do visado, que o fez recuar, para não ficar mal visto em Bruxelas. O governador protegeu a sua independência e a do BdP, mas não se livrou de lhe atiçarem as brasas à volta…

Essa hostilidade, nem sequer disfarçada, deveria aconselhar Centeno a não querer rendê-lo, por uma questão de pudor. Mas já se percebeu que não é esse o seu rosário.

O Eurogrupo descobriu-lhe a prosápia e, falhado o FMI para o qual chegou a espreitar apoios, o Banco Central é, ainda, um ‘navio almirante’, cujo timoneiro tem visibilidade, pago com cabedais não desprezíveis, sem precisar de distribuir beijos e selfies ou de aturar romarias e arruadas, em cansativas campanhas eleitorais.

E se Vítor Constâncio chegou ao BCE pela mão de Sócrates, como recompensa pelos seus ‘bons ofícios’ no BdP, porque razão não há de António Costa fazer ‘o jeito’ a Centeno para este ‘cativar’ o BdP?

Afinal, os banqueiros nem se importam, como os media revelaram. Como não se importaram, aliás, quando o ex-ministro das Finanças de Sócrates, Teixeira dos Santos – corresponsável pelo desastre que chamou a troika em 2011 –, se sentou na presidência do Eurobic, financiado por Isabel dos Santos, entretanto caída em desgraça.

Como antes não se importaram, também, quando dois comissários políticos do PS ‘migraram’ da Caixa para tomar conta do BCP, um banco onde o comendador Berardo atuou como ‘cavalo de Troia’ de Sócrates.

É, ainda, a mesma lógica que levou o primeiro-ministro a propor o nome do ex-porta voz de Sócrates, Vitalino Canas, para preencher uma vaga do TC. Ficaria tudo em família, não fosse a proposta ter ‘chumbado’ no Parlamento, com uma votação humilhante, juntamente com outras para o CES e CSM – incluindo votos de deputados socialistas. Pelos vistos, não bastaram os 40 anos de ‘preparação’ de Canas para ser juiz do TC. Um trabalho inglório que ficou ‘no tinteiro’…

Foi uma luz ‘amarela’ que se acendeu para moderar a crescente arrogância socialista, que tem vindo a manifestar-se, por exemplo, perante a publicação de relatórios do Tribunal de Contas, menos ‘meigos’ para o Executivo ou para a CML Depois de Fernando Medina, foi a vez do ministro do Ensino Superior, Manuel Heitor, acusar aquele Tribunal em termos impróprios. Uma tristeza.

Se esta tem sido a prática do PS em minoria, na CML ou no Governo, pode imaginar-se o que seria se tivesse obtido a maioria. A escola de Sócrates está viva entre os socialistas.

Enquanto a ‘porta giratória’ continua bem oleada, a Justiça afunda-se e descredibiliza-se, entre diretivas e pareceres controversos, desde o MP à PGR e às suspeitas que recaem sobre os sorteios de juízes no Tribunal da Relação, o que lembra, irresistivelmente, o caso do sistema eletrónico ‘engasgado’, que, à terceira tentativa, acabou por indicar Ivo Rosa como juiz de instrução para Sócrates e outros arguidos da Operação Marquês.

Assiste-se, assim à progressiva degradação dos ‘contrapesos’ do regime. A ‘mexicanização’ já esteve mais longe…