Na rabada da Europa

O Governo de António Costa e Mário Centeno insiste em apresentar aos portugueses um cenário de crescimento económico acima da média europeia, alimentando a ilusão de que Portugal está a convergir com a Europa.

Só que essa ‘convergência’ fica-se pela comparação com as economias mais desenvolvidas (que determinam essa tal média europeia), como a alemã ou a francesa.

A verdade é que, como o Fórum para a Competitividade tem vindo a alertar e voltou a fazê-lo esta semana, se não nos iludirmos com a propaganda do Governo e nos ativermos à realidade dura e crua dos números, Portugal está cada vez mais na rabada da Europa.

As perspetivas da Comissão Europeia para os próximos anos são mesmo arrasadoras: dos países da coesão, só Espanha (já noutro patamar) deverá crescer menos do que Portugal, sendo previsível que nos próximos quatro anos sejamos ultrapassados por países de leste como Hungria, Roménia, Polónia e Letónia. Ou seja, a manterem-se os registos de crescimento económico que temos tido, em 2024 Portugal será um dos quatro países mais pobres da Europa.

Acontece que, nas mais recentes previsões da Comissão Europeia, nos próximos 10 anos (até 2031), também a Croácia e a Grécia deverão ultrapassar Portugal, quedando-se este apenas à frente da Bulgária, sendo uma questão de tempo até se assumir mesmo como país mais pobre do Velho Continente.

Pedro Ferraz da Costa, do Fórum Competitividade, diz que não é possível «ficar parado à espera que todo este desastre se concretize sem fazer nada para o contrariar».

Ora, esta análise e estas previsões da Comissão Europeia coincidem no tempo com alguns acontecimentos que nos atiram para o terceiro do mundo e cavam o fosso, abissal, para o primeiro.

Esta semana, Portugal assistiu a um ex-primeiro-ministro a sentar-se no banco dos réus (arguidos) e a responder perante o juiz de instrução num caso de corrupção. E esse ex-primeiro-ministro alega, desde o início, que o seu processo foi distribuído a um juiz de forma viciada e não aleatória.

Também nesta semana, o presidente em exercício do Tribunal da Relação de Lisboa demitiu-se na sequência das pressões do Conselho Superior da Magistratura após serem divulgados factos e contactos comprometedores com o seu antecessor, sendo que este fora constituído arguido num caso que envolve outros juízes de tribunais superiores e acusado de corrupção e abuso de poder, por interferência na distribuição de processos.

Tudo muito mau, mesmo muito mau.

E também esta semana, lá voltámos a ver Carlos Alexandre – que entretanto voltou a concentrar os processos pendentes no Tribunal Central de Instrução Criminal – a liderar uma vastíssima equipa de magistrados, inspetores, militares e agentes que entraram por escritórios de advogados dentro e nas SAD de sete clubes, incluindo os ‘quatro grandes’ (Benfica, FC Porto, Sporting e Sporting de Braga), e nas casas de dirigentes e outros agentes desportivos em mais um megacaso de alegadas fraudes fiscais e de branqueamentos de capitais.

Tudo demasiado mau.

Pior ainda quando a Assembleia da República nem sequer consegue eleger – por gritante ausência de comunicação entre os grupos parlamentares, totalmente incapazes de gerar listas minimamente consensuais – os membros por si eleitos para órgãos como o Tribunal Constitucional, o Conselho Superior da Magistratura ou o Conselho Económico e Social, misturando candidatos controversos com incontroversos mas sujeitando-os a todos a uma dispensável humilhação.

«Ninguém pensava que tanto tempo depois do 25 de Abril fosse possível que um partido de extrema-direita entrasse na Assembleia da República», disse Alegre ao i.

O que é muito mais preocupante é que, 45 anos depois do 25 de Abril, a podridão do regime abala os principais alicerces do Estado e do estado de direito democrático.

Não se pode continuar a fingir que tudo vai bem e o que está mal são meros casos ocasionais e esporádicos.

Até porque já são casos a mais.

Só não vê quem não quer ver.

Pelo caminho que vamos, e com o empobrecimento galopante, não se admirem. É um fósforo.

É por isso que – repetindo a citação de Pedro Ferraz da Costa – é urgente interiorizar que não é mais possível «ficar parado à espera que todo este desastre se concretize sem fazer nada para o contrariar».