A febre do coronavírus

Aconselhar os jovens a lavar bem as mãos e a não espirrar para o ar devia ser uma preocupação diária.

A epidemia do Covid-19 está instalada. Em Portugal a ‘febre’ deste vírus já infetou quase toda a população. É a doença por trás da doença. Algumas pessoas temem uma pandemia, enquanto outras parecem ter sede de ação. As máscaras estão esgotadas nas farmácias, o álcool desapareceu dos supermercados. Os números são seguidos ao minuto por pequenos e graúdos, levando muitas vezes a conclusões erradas.
Para ser mais fácil compreender o que se passa, o Covid-19 tem sido comparado com a gripe sazonal e aí as opiniões dividem-se, o que quer dizer que – para melhor ou pior – muito diferente não será.
Apesar do histerismo e preocupação – quanto a mim excessivos, até porque, apesar de emprestarem alguma emoção a vidas mais desocupadas, não resolvem nada – acho muito bem que se implementem medidas que, de resto, não compreendo por que não são postas em prática anualmente, sobretudo na altura crítica do inverno. Todos os anos há milhares de pessoas infetadas não só com a gripe sazonal, mas também com uma panóplia de outras viroses. As crianças são presas fáceis destas doenças. Há inclusivamente escolas que ficam com as salas vazias durante longos períodos e que aconselham os pais a deixar os filhos em casa.

Nos últimos dias têm sido dadas indicações às crianças e jovens para lavarem bem as mãos, espirrarem para a parte de dentro do cotovelo e evitarem o contacto próximo com outras pessoas. Tirando a parte de evitar abraços e beijinhos, parece-me que aconselhar as populações jovens a lavar bem as mãos e a não espirrar para o ar devia ser uma preocupação diária. Em vez disso o que vemos? Poucas lavagens de mãos, adultos a limparem os narizes de várias crianças com o mesmo papel, que anda no bolso da bata o dia inteiro, copos de água que vão sendo usados e se colocam ao lado uns dos outros numa festa de vírus, permanência de crianças em salas fechadas durante demasiado tempo, já para não falar daquelas que vão para a escola doentes com um ben-u-ron porque não têm com quem ficar. 

E esta leviandade não acontece só com os mais novos. Quando vamos a uma casa de banho pública, quantas pessoas vemos a lavar as mãos antes de saírem? Quantas visitam recém-nascidos com os seus filhos ranhosos pelo braço? Quantas os beijam ou lhes mexem só nas mãos porque estão constipadas? E quanto a ir trabalhar doente? Um funcionário exemplar é aquele que vai trabalhar com 40 graus de febre. O patrão não permite mariquices e o funcionário também se considera fora de série se for um mártir. Ninguém pensa que, poupanças e altruísmos à parte, é uma questão de saúde pública evitar a propagação de vírus.

Esperemos que o coronavírus nos deixe depressa e não cause muitos estragos. Que haja a consciência de ter alguns cuidados extra, como evitar viagens de avião desnecessárias ou sítios fechados cheios de gente. Mas sobretudo que permaneça a ideia de que diminuir a disseminação das infeções em geral está em parte, numa mudança de mentalidade e nas mãos – bem lavadas – de cada um.