Papéis trocados

Ora um dos aspetos mais interessantes provocados pelo vírus em Portugal foi a troca de papéis entre Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa. Até agora, quando acontecia alguma calamidade, era Marcelo quem saía à rua, fazia declarações, confortava as vítimas, não parava.

Estava a pensar escrever hoje sobre o novo aeroporto, mas desisti: as pessoas, neste momento, só se interessam pelo coronavírus. Não querem saber de mais nada.

Ora um dos aspetos mais interessantes provocados pelo vírus em Portugal foi a troca de papéis entre Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa.

Até agora, quando acontecia alguma calamidade, era Marcelo quem saía à rua, fazia declarações, confortava as vítimas, não parava.

Foi assim nos incêndios, quando – incansável – percorreu as zonas atingidas, fez discursos fortes (um dos quais provocou a queda da então ministra Constança Urbano de Sousa), deu apoio às pessoas e aos bombeiros, animou as populações.

Foi assim, também, em Tancos.

Marcelo deslocou-se à base, falou com os militares, exigiu que se apurassem responsabilidades, não deixou cair o caso no esquecimento.

O país habituou-se, portanto, a um Presidente omnipresente, solidário, afetuoso, sempre pronto a ajudar e a apoiar.

Eis senão quando surge o coronavírus.

E ao primeiro pretexto – a ida a Belém de uma turma de crianças onde um aluno (que não foi ao palácio) surgiu mais tarde com análises positivas – meteu-se em casa de quarentena.

E fez exames médicos que todos consideraram extemporâneos.

E deixou de contactar diretamente com os jornalistas, falando com eles a partir do terraço da moradia onde vive, em Cascais!

Todos sabem que Marcelo Rebelo de Sousa é um hipocondríaco, que tem o pavor das doenças e vai para férias com uma mala cheia de medicamentos.

Mas – que diabo! – também não precisava de revelar essa faceta de modo tão ostensivo.

Entretanto, o primeiro-ministro, que nos momentos difíceis habitualmente desaparecia – como aconteceu nos incêndios e no roubo de Tancos -, furtando-se aos olhares dos jornalistas e às perguntas incómodas, agora faz exatamente o contrário: anda numa lufa-lufa. 

Fala a toda a hora, não pára.

Os papéis inverteram-se.

Mais: quando antes era o Presidente da República a ter de pôr a mão por baixo do Governo, livrando-o de situações comprometedoras, agora é o primeiro-ministro quem põe a mão por baixo do Presidente da República, justificando a sua quarentena, louvando-lhe o exemplo, explicando mesmo a necessidade que Marcelo tinha de fazer as análises.

Antes, era Marcelo Rebelo de Sousa a fazer o papel de tio protetor e António Costa o de sobrinho; agora é Marcelo o sobrinho e Costa o tio.

O problema, para Marcelo, vai ser quando terminar a quarentena.

O que irá fazer?

Continuará metido em casa sob outro pretexto qualquer – ou sairá à rua, regressando às andanças pelo país?

E voltará a dar beijinhos e abraços às pessoas, e a tirar selfies?

Não creio que tão depressa isso volte a suceder.

Mas, sem isso, Marcelo Rebelo de Sousa não será Marcelo Rebelo de Sousa.

O Presidente terá de inventar outro ‘personagem’.

Repito: é um problema difícil que Marcelo tem para resolver.

Entretanto, para não deixar os meus leitores desiludidos por não falar concretamente do maldito vírus, partilho a súmula de um texto de um médico italiano que trabalhou no hospital de Shenzhen, na China, e que é informativo, preciso e didático.

– Em primeiro lugar, o vírus infeta a garganta, provocando dor de garganta e tosse seca, que durará três a quatro dias, sem secreção nasal. A secreção nasal não é, pois, sinal de infeção pelo coronavírus. Recomenda-se fazer gargarejo com um desinfetante para eliminar ou minimizar os germes enquanto o vírus está na garganta; 

– Depois, o vírus funde-se com o líquido nasal, pinga na traqueia e entra nos pulmões, causando a pneumonia de Wuhan. Este processo levará cinco a seis dias;

– Segue-se um período de febre alta e dificuldades respiratórias, com sensação de afogamento na água; 

– O vírus é bastante grande, pelo que qualquer máscara normal o retém. No entanto, quando alguém infetado espirra, as partículas espalhar-se-ão por três metros antes de caírem no chão, ficando suspensas no ar;

– Numa superfície metálica, o vírus viverá durante pelo menos 12 horas. Depois de tocar em superfícies metálicas devem lavar-se bem as mãos;

– Nos tecidos, o vírus pode permanecer ativo durante 6 a12 horas. Mas o detergente normal mata-o. E a exposição ao sol também; 

– A forma mais comum de contrair a infeção é tocar em superfícies como corrimãos, maçanetas de portas, pegas, etc., em edifícios ou transportes públicos. Por isso, é conveniente lavar as mãos com frequência. O vírus só pode viver na pele por 5-10 minutos, mas nesse intervalo muita coisa pode acontecer (como esfregar os olhos);

– Finalmente, o coronavírus não é resistente ao calor e morre a uma temperatura de 26-27 graus. Para proteger o organismo, é bom mantê-lo quente, bebendo água morna, chá ou outras infusões. E a exposição ao sol é sempre boa. Pelo contrário, as bebidas geladas são contra-indicadas. 

Et voilà!

Já agora, sobre o novo aeroporto, deixo uma nota: numa altura em que a globalização fica em stand-by, diminuindo a circulação de pessoas em todo o mundo, é de elementar bom-senso não avançar com grandes estruturas ligadas aos transportes.

É que não sabemos de todo até que ponto estas epidemias vão tornar-se habituais, limitando enormemente as viagens e o turismo.