A BCG pode ajudar? ‘Ainda não sabemos mas não vai ser a solução’

Holandeses e australianos vão começar ensaios para perceber se a velha vacina da tuberculose pode ser mais uma arma  contra a covid-19.

É mais uma linha de investigação em torno da covid-19.  Investigadores australianos e holandeses estão a começar ensaios para tentar perceber se a BCG, a vacina que desde 1921 é usada contra a tuberculose, pode ser mais uma arma no combate contra a covid-19. Os ensaios estão a ser dirigidos a profissionais de saúde, um dos grupos mais expostos à nova infeção. A pista são estudos feitos nos últimos anos que sugerem que pessoas vacinadas com a BCG poderão ter um sistema imunitário mais alerta, o que diminuiria o risco de desenvolverem quadros graves de doença por covid-19. Pedro Simas, virologista do Instituto de Medicina Molecular, explica que o sistema imunitário tem duas componentes na maioria dos seres vivos. Uma inata, através do qual o organismo reconhece a entrada de microroganismos, o outro adaptativo, em que o contacto com microorganismos leva ao longo do tempo a uma adaptação, daí haver por exemplo mais defesas contra virus com os quais convivemos há mais tempo – o que nos torna mais susceptíveis a este. As duas componentes estão ligadas e aqui entra a hipótese: «A BCG, além de diminuir o risco de infeção com o bacilo, tem uma componente que estimula a parte inata do sistema imunitário, faz de certa forma que fique mais ativo». Um estudo feito em 2005 em Espanha revelou que crianças que tinham feito a BCG recorriam menos vezes aos hospitais por menos infeções e a hipótese que tem estado a ser colocada é se países com maior taxa de cobertura vacinal contra a tuberculose poderão estar a beneficiar disso no atual surto. «Percebemos que países sem uma política universal de vacinação da BCG, como Itália, Holanda e os EUA, têm sido mais severamente afetados do que outros países com políticas mais consolidadas em torno desta vacina», justificou Gonzalo Otazu, investigador do Instituto de Tecnologia de Nova Iorque, que também está a trabalhar nesta frente. Pedro Simas sublinha que neste momento a resposta deve ser prudente: «Ainda não sabemos se funciona», diz. Mas o investigador sublinha também que mesmo que forneça alguma proteção acrescida, não substituirá a procura por uma vacina específica para a covid-19. «São medidas importantes na gestão hospitalar, não têm resultado a nível de controlo da pandemia. Para controlo da epidemia temos três ferramentas: impedir a disseminação do vírus nesta fase com todas as medidas que estão a ser tomadas, deixar a infeção depois progredir controladamente para se ter a imunidade natural protegendo os grupos de risco ou conseguirmos uma vacina o mais rapidamente possível». No caso da BCG, há outro receio: que haja uma procura à vacina que é usada para proteger contra a tuberculose. Em Portugal passou nos últimos anos a ser dada apenas a grupos em maior risco, depois de várias dificuldades de abastecimento na Europa.