A população mundial feita num 7777777777

Durante esta semana, em plena pandemia, a população mundial atingiu um número mágico: 7.777.777.777. São dez setes consecutivos. Agora caminhamos para os oito mil milhões.

Na passada terça-feira, enquanto a maioria dos portugueses jantava em suas casas, a página online do Worldometer – um projeto que fornece estatísticas em tempo real – assinalava a aproximação de um número singular. Às 20h30 (hora de Portugal) o contador da população mundial daquele site, que avança em rotação acelerada, registou por um instante o valor de 7.777.777.777 – por extenso, sete mil milhões, setecentos e setenta e sete milhões, setecentos e setenta e sete mil, setecentos e setenta e sete: são dez sete consecutivos.

É curioso, mas não surpreendente, que esta cifra seja antingida em plena pandemia que virou o mundo ao contrário. Na realidade, os cerca de 150 mil mortos provocados pela covid-19 desde o final do ano passado nem de perto nem de longe ameaçam o crescimento da população global. Segundo a ONU, todos os dias nascem 360 mil bebés, o que representa qualquer coisa como 130 milhões de nascimentos por ano.

Em crescimento desde a Peste Negra
Na realidade, há séculos que a população do planeta tem vindo a crescer a um ritmo imparável. Nem mesmo acontecimentos tão cataclísmicos como a I e a II Guerra Mundial (cerca de 20 milhões e entre 70 e 85 milhões de mortos, respetivamente), a gripe espanhola de 1918 (que matou, no mínimo, 40 milhões de pessoas) ou a Grande Fome de Mao (1958–62), em que terão perecido cerca de 40 milhões de chineses) fizeram com que o número de humanos sobre a Terra retrocedesse.

Na realidade, crê-se que a última vez que a população global registou um declínio foi nos idos da Peste Negra, em meados do século XIV. Estima-se que nesses sombrios cinco anos (1347-1352) a população europeia tenha caído entre um terço e metade.

Em meados do século XVII, a população total do planeta seria aproximadamente de 500 milhões de pessoas. Com o desencadear da Revolução Industrial, no final do século XVIII, o aumento da população global acelerou, atingindo os mil milhões por volta de 1830. Daí em diante, continuou a expandir-se a um ritmo cada vez mais galopante: dois mil milhões em 1930, três mil milhões em 1959, quatro mil milhões em 1974, seis mil milhões em 1999 e sete mil milhões em finais de 2011.

Dez mil milhões em 2055
Atingidos os 7.777.777.777 em 2020, a contagem não pára. O Worldometer estima que alcancemos os oito mil milhões de habitantes já em 2023, os nove mil milhões em 2037 e a marca dos dez mil milhões em 2055. O ritmo de crescimento está, no entanto, a abrandar, depois de ter atingido o pico em 1968, ano em que aumentou 2,1%. Atualmente, a população cresce à razão de cerca de 1% ao ano. No confronto entre nascimentos e mortes, o saldo é claramente favorável aos primeiros:há cerca de 80 milhões de pessoas a mais no planeta a cada ano que passa.
Mas só depois de 2100, altura em que a Terra deverá atingir os 11 mil milhões de habitantes (a manter-se o ritmo atual), a população acabará por estabilizar, depois de um incremento ininterrupto desde os anos da Peste Negra.

A face negra do sucesso
Se, por um lado, o crescimento global da população fornece um indicador eloquente do sucesso da espécie humana, por outro coloca problemas para os quais ainda ninguém tem resposta. Segundo Paul Crutzen, o Nobel holandês que ajudou a descobrir o buraco do ozono e cunhou o termo ‘Antropoceno’, este período, que terá começado no final do século XVIII e corresponde ao primado do homem sobre a natureza, está a ter efeitos devastadores: entre um terço e metade da superfície terrestre foi alterada; graças à deflorestação e ao uso de combustíveis fósseis, os níveis de CO2 aumentaram 40% neste período e os de metano mais do que duplicaram. David Wallace-Wells, autor de A Terra Inabitável, fala de «concentrações de carbono e partículas de matéria tóxica, como se fossem gás a encher um quarto. O nosso quarto». As outras espécies também estão a sofrer as consequências da expansão da família humana. A jornalista americana Elizabeth Colbert chamou a este processo, que está a decorrer debaixo dos nossos olhos, a Sexta Extinção, prevendo que milhões de espécies de plantas e animais possam ser afetadas.

Juntando ao crescimento da população global o aumento dos padrões de consumo, a combinação é explosiva. A cada ano que passa, a quantidade de recursos naturais exigida é maior. Segundo cálculos dos especialistas, seriam necessários 1,75 planetas Terra para suportar a longo prazo o padrão de vida atual. Ao mesmo tempo que os recursos são consumidos, o rasto de lixo avoluma-se.

Em 1947, na ressaca da II Guerra Mundial, ao criarem o famoso Relógio do Juízo Final, os cientistas atómicos da Unidade de Chicago acertaram-no para as 23h53. Mas a hora vai avançando, consoante os cientistas acreditam que o apocalipse se aproxima. As doze badaladas seriam o sinistro toque de finados que anunciaria o fim do mundo. Atualmente faltam apenas 100 segundos para a meia-noite. O tempo está a esgotar-se e o crescimento vertiginoso da população só acelera o processo.