Má nutrição. Falta de acompanhamento na pandemia pode fazer aumentar casos

APNEP acusa entidades de saúde de esquecerem estes doentes.

No início deste ano, o número de malnutridos em Portugal já era uma preocupação: 73% doentes internados em medicina interna estavam malnutridos. Desses, 56% apresentavam má nutrição moderada e 17% má nutrição grave. Os dados pertencem a um estudo realizado pela Associação Portuguesa de Nutrição Entérica e Parentérica (APNEP) e, se já eram alarmantes no período pré-covid, agora podem ser piores, com o cancelamento de consultas e acompanhamento dos doentes.

O alerta chega da própria associação: “A dimensão de doentes malnutridos que se encontram no ambulatório/domicílio sem qualquer tipo de acesso à nutrição clínica aumentou de forma drástica durante esta pandemia”, alerta o presidente da APNEP, Aníbal Marinho. “Se, antes da covid-19, a realidade destes doentes já era preocupante, agora é ainda mais, sobretudo no domicílio/ambulatório, onde não há qualquer tipo de acompanhamento”, acrescenta o responsável. 
Face a esta situação, o presidente da APNEP explica que a associação está a trabalhar em conjunto com a Sociedade Portuguesa de Medicina Interna para a elaboração de um novo estudo que possa retratar a situação destes doentes durante o período de pandemia.

Aníbal Martins aproveitou o comunicado para acusar as entidades de saúde de se terem esquecido destes doentes nesta altura difícil. “Muitos destes doentes agravam o seu estado nutricional ainda durante o internamento e, quando têm alta, saem sem qualquer apoio do Estado para manter a nutrição clínica em casa”, alertou. 

Aníbal Marinho defende também que, nesta altura, é impreterível criar linhas de apoio para estes doentes “de forma a evitar que voltem para os hospitais em pior estado clínico do que estavam e acabem por lá falecer. A verdade é que ninguém pensou ou planeou o acompanhamento destes doentes numa altura tão crítica como esta que vivemos”, remata, lembrando a falta de nutricionistas a trabalhar nos hospitais e nos centros de saúde, a escassa informação sobre nutrição nos serviços de saúde e a falta de formação dos profissionais de saúde.

Recorde-se que, tal como o SOL já tinha avançado, a crise financeira trazida pela pandemia pode ser também um problema não só para os casos de obesidade como para os de malnutrição. “As pessoas pobres ou empobrecidas vão recorrer à caridade e comprar comida para ‘encher’, que é mais barata. Não vão comprar nem fruta, nem vegetais, nem iogurtes, nem peixe. Mas comprarão um bolo, que é barato e que as consolará. E haverá quem atire a primeira pedra?”, chegou a alertar a médica Isabel do Carmo. Estes produtos “mais baratos” poderão não ter certos elementos essenciais, como proteínas e vitaminas.

Os números são alarmantes: Portugal regista mais de 115 mil casos de doentes no domicílio/ambulatório (1% da população) por ano em risco nutricional, que precisam de apoio nutricional com recurso a nutrição clínica, relembra a APNEP.