Governo e oposição espanhola divididos quanto à Guarda Civil

O Governo espanhol acusa a oposição de “apelar à insurreição” e fala-se de um clima “golpista”. A direita atira que Pablo Iglesias é “discípulo dos aiatolas”.

Aqui ao lado, em Espanha, a tensão é sempre elevada entre o Governo de Pedro Sánchez, dependente do Unidas Podemos e dos independentistas, e a oposição à sua direita. Mas a situação inflamou-se com a polémica demissão do líder da Guarda Civil em Madrid, Diego Pérez de los Cobos, esta semana. Era acusado de deslealdade, por não informar o Governo que se investigava o alastrar da pandemia na capital, em relação com com uma manifestação pelos direitos das mulheres, a 8 de março. Sucederam-se demissões, em protesto, na cúpula da corporação: o Governo vê-o como reação dos conservadoras que dominam a justiça e as forças de segurança. “Sempre foi assim”, escreveu o El País – mas teme-se que a extrema-direita, do Vox ganhe preponderância nessa esfera. Já a oposição viu a demissão Pérez de los Cobos como interferência do Executivo no Judiciário, e subiu o tom das críticas.

Aliás, esta quarta-feira Teodoro García Egea, número dois do Partido Popular (PP), chegou a ser a acusado de “apelar à insubordinação” das forças de segurança, em pleno hemiciclo, por Pablo Iglesias, vice-primeiro-ministro e líder do Unidas Podemos – já circulam nas redes sociais montagens de Egea, de braço estendido e uniforme franquista. “Impostor”, retorquiu a porta-voz do PP, Cayetana Álvarez de Toledo, que apelidou Iglesias de “discípulo dos aiatolas do Irão, filho adotivo de Nicolás Maduro” e “embaixador da ETA-Batasuna no Governo”.

Como é habitual, os insultos mais gravosos da direita foram reservados ao líder do Unidas Podemos. Mas o grande alvo da era sessão era Fernando Grande Marlaska, do PSOE, ministro do Interior, responsável direto pela demissão de Pérez de los Cobos: o Governo inteiro reagiu cerrando fileiras à sua volta. Não que Marlaska, em tempos proposto pelo PP para o Conselho Geral do Poder Judicial, e Iglesias, antigo ativista radical, se tenham alguma vez dado particularmente bem: representam faces completamente diferentes do Executivo, chocam de frente em quase tudo, por exemplo em relação à imigração.

Enquanto o ministro do Interior garante que a demissão de Pérez de los Cobos foi um processo “normal”, a oposição acusa o Governo de silenciar investigações incómodas, que põe em causa a gestão da pandemia. Para Isabel Díaz Ayuso, do PP, que lidera o Executivo da comunidade de Madrid, “Pérez de los Cobos é um herói da democracia espanhola”, assegurou, citada pelo ABC,  creditando-o pela “defesa da ordem constitucional no 1-O de 2017”. Referia-se ao referendo à independência da Catalunha, quando agentes foram filmados a carregar brutalmente sobre quem defendia as urnas, às ordens de Pérez de los Cobos, na altura dirigente da Guarda Civil na região.

Entretanto, o descontentamento alastra-se entre o ramo judicial. “Nenhum de nós pensava que teríamos de enfrentar um ambiente golpista como este”, disse um ministro, em condição de anonimato, ao El País, que descreve a Guarda Civil como “Estado dentro de um Estado”.