Quatro irmãos, quatro países. Joana Moreira da Cruz: “No mesmo mar, mas em barcos diferentes…”

Parece que a maioria das pessoas se esqueceu da razão do confinamento. Vêm-se multidões nas grandes cidades e são poucos os que usam máscara. Será que já ninguém tem medo?

O primeiro-ministro italiano Giuseppe Conte decretou 18 de maio como data oficial para a abertura de cabeleireiros, bares, restaurantes e lojas. Finalmente o país transalpino volta a respirar. As italianas, vaidosas e presumidas, suspiram de alívio! Apesar dos estabelecimentos públicos continuarem fechados e todos os pedidos serem feitos pela internet os habitantes (principalmente os do sexo feminino) retomaram as suas rotinas porque não há nada mais importante que cortar o cabelo, fazer as madeixas, arranjar as unhas, comprar roupa e tomar um cappuccino na esplanada.

Há vários dias que o país anda numa grande agitação: as ruas são limpas, os jardineiros cortam a relva, as lojas são desinfetadas, há casas e prédios em construção. A azáfama é tanta que custa a crer que estivemos mais de dois meses fechados em casa. Parece que a maioria das pessoas se esqueceu da razão do confinamento. Vêm-se multidões nas grandes cidades e são poucos os que usam máscara. Será que já ninguém tem medo? Eu não consigo ser tão descontraída porque este vírus é perigoso e continua bem presente. Nem o calor o mata! É importante recuperar a liberdade perdida, é saudável sair à rua, mas devemos ser vigilantes e cautelosos porque mais vale prevenir que remediar.

O momento histórico desta semana foi… a reabertura das praias públicas! Italiano que se preze anda bronzeado todo o ano. Durante o inverno apenas na cara, graças às férias brancas em Cortina d’Ampezzo ou na Cervinia e o resto do ano com o corpo dourado pelo sol nas praias banhadas pelos mares da Ligúria, Mediterrâneo, Adriático, Jónico e Tirreno. A oferta é vasta e a escolha é difícil, mas nem todas as praias são acessíveis.

Em Itália há praias públicas e privadas. E, embora, o mar, a areia e o sol sejam os mesmos tudo o resto é diferente. Nas praias públicas joga-se à bola, ouve-se música (às vezes parece uma discoteca ao ar livre), traz-se o farnel de casa e faz-se o piquenique, estende-se a toalha onde há sítio (quase sempre colado ao vizinho do lado). Ouvem-se gritos, gargalhadas, birras e insultos, ao mais puro estilo Italiano.

As praias privadas são uma instituição em Itália e ultrapassam as 30.000. Tão perto e tão longe das gratuitas. O número de pessoas é restrito (o distanciamento é praticado desde sempre), não se pode trazer comida nem bebidas, todos os jogos são proibidos e reina a tranquilidade. As cadeiras, espreguiçadeiras e barracas estão meticulosamente alinhadas e as pessoas não falam, sussurram, fazendo-nos esquecer que estamos no país da confusão e do alvoroço. O silêncio, os toldos ou guarda-sóis bicolores, a limpeza constante e o vigilante pagam-se a peso de ouro e, às vezes, não basta ter dinheiro. É que o direito a usufruir de um lugar no paraíso também passa de geração em geração. Na maioria dos casos o apelido dos proprietários serve de denominação do lugar, mas também há praias que têm o nome das famílias mais ilustres que lá veraneiam. Nesses casos, só podemos estender a toalha através de um convite.

Itália tem uma longa costa e o Veneto não é exceção. Eu e o meu marido decidimos passear de mota, sem pressa nem destino, ao sabor do vento. Descobrimos, por acaso, uma praia lindíssima onde renovamos o ar dos pulmões, passeamos descalços à beira-mar, avistamos gaivotas e tiramos fotografias para enviar à família. Havia várias crianças a brincar, a correr, a fazer castelos na areia…felizes e despreocupadas. E tudo isto grátis! Por instantes, esqueci-me da pandemia e desfrutei apenas do momento. Ainda assim, dei por mim a pensar que estamos todos no mesmo mar, mas navegamos em barcos diferentes.