Zonas com mais novos casos podem ver retoma de consultas adiada

Sintra, Amadora, Loures e capital preocupam. “Estávamos a ver a ponta do icebergue, agora estamos a atacar as raízes mais subterrâneas”, disse ontem Marta Temido.

O Governo espera conseguir estancar nos próximos dias o aumento de casos na região de Lisboa e Vale do Tejo e o plano começou a ser afinado no fim de semana com reuniões com os autarcas dos concelhos onde têm sido detetados mais casos. Ontem de manhã, Marta Temido esteve na Amadora e durante a tarde deslocou-se a Sintra. Esta segunda-feira é a vez de Lisboa, Odivelas e Loures, concelho que passou durante o fim de semana a barreira dos mil casos confirmados e onde tem havido maior pressão hospitalar, com o Hospital Beatriz Ângelo no limite da capacidade inicialmente prevista. Ontem a ministra da Saúde sublinhou que existe capacidade para abrir mais 10 camas de cuidados intensivos mas, em caso de necessidade, os outros hospitais de Lisboa darão resposta. “O SNS, funcionando em gestão pública ou parceria público-privada, funciona em rede”, deixou claro Marta Temido.

A situação em Lisboa e Vale do Tejo é a que causa maior apreensão. Este sábado, os dados divulgados no boletim de ontem, foram diagnosticados 297 casos de covid-19 em todo o país, 268 na região de Lisboa. Desde o balanço de sexta-feira apareceram mais 61 casos positivos em Loures e 58 na Amadora, sendo que os dados do concelho de Sintra não foram atualizados – um facto criticado este domingo por Basílio Horta na reunião com o Governo, onde esteve também o Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro.

Geralmente ao sábado e domingo costuma haver menos diagnósticos, sendo que uma melhor fotografia da evolução da epidemia na região deverá surgir a meio da semana. Ainda assim, os 297 casos no boletim divulgado este domingo são o número mais elevado neste dia da semana desde abril. Já o número de doentes internados continuou a diminuir no fim de semana e este domingo havia mais um doente em UCI, sendo que a ocupação está muito aquém da capacidade de resposta de 713 camas – ontem havia 64 doentes em cuidados intensivos. Em Lisboa, a maioria dos novos casos têm sido em pessoas jovens, casos em que o receio é sobretudo o potencial de propagação. Registam-se, no entanto, também casos em pessoas mais velhas: este sábado houve 27 novos casos em pessoas com mais de 60 anos, 16 das quais com mais de 80 anos. Um lar em Queluz, onde já morreram três idosos e estão identificados mais de 30 utentes infetados, é um dos focos e a unidade tem estado debaixo de críticas de familiares, depois de ter suspendido a realização de videochamadas para diminuir o risco de propagação do vírus.

 

Testar, testar, testar

A ministra da Saúde disse ontem que a ação em Lisboa vai passar pelo reforço da testagem em setores com surtos como a construção civil, que de resto foi anunciado que arrancaria ainda no fim de semana, e a definição de locais alternativos para o confinamento obrigatório de pessoas infetadas ou suspeitas que não tenham condições adequadas em casa. Também os doentes em casa ou outros locais passarão a ter visitas domiciliares de médicos e enfermeiros, isto ao mesmo tempo que a reabertura de centros comerciais e outros serviços públicos, como lojas de cidadão, foi adiada nos distritos de Lisboa e Setúbal pelo menos até 4 de junho, data em que haverá uma nova avaliação da situação. Estão também proibidos em Lisboa ajuntamentos de mais de 10 pessoas.

 

Retoma de consultas adiada

“Temos a convicção de conseguir reduzir nos próximos dias o número de contágios e reduzir a transmissão comunitária, garantindo o alinhamento de Lisboa e Vale do Tejo com o resto do país”, disse Marta Temido, apontando para um esforço que vai durar os próximos 15 dias. Entre locais públicos e laboratórios privados, a região tem capacidade para 7000 testes por dia – que não tem sido usada nos últimos dias. O INEM tem também capacidade para colher 200 a 300 amostras por dia para análise. Luís Pisco, presidente da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, explicou ao i que a estratégia passa por reforçar a testagem na área metropolitana de Lisboa, em articulação com as equipas do INEM que até aqui tinham dado sobretudo apoio nos rastreios no Norte. Também em algumas áreas dedicadas à covid-19 nos cuidados primários será possível fazer a colheita para análise, com o apoio do Instituto Ricardo Jorge.

Marta Temido disse ontem que, dada a situação na região, a retoma da atividade assistencial no SNS será mais lenta. O presidente da ARS adianta que se manterá toda a assistência urgente e no âmbito da saúde materna e infantil, como aconteceu nas últimas semanas, mas as consultas de rotina presenciais e alguns rastreios que estavam a ser remarcados serão adiados mais uma ou duas semanas nas zonas onde tem havido um aumento dos casos de covid-19, sendo a expectativa que no final deste período de reforço da testagem e controlo das cadeias de transmissão será possível retomar a atividade como estava previsto.

Trabalhadores de grandes entrepostos comerciais, construção civil e setores de trabalho de prestação de serviços de limpeza são os prioritários para testes, mas Marta Temido pediu este domingo para não ser criado um estigma. “Isto não tem a ver com nenhuma culpa específica. Há pessoas que pelas suas vidas se deslocam mais, vivem mais em aglomerados, o risco é maior”, disse, admitindo que o problema já estaria emergente. É isso que mostram os dados, dado que os casos em Lisboa e Vale do Tejo têm vindo a aumentar a um ritmo superior ao resto do país há várias semanas. “Estávamos a ver a ponta do icebergue, agora estamos a atacar as raízes mais subterrâneas.”