O vírus do silêncio

A impossibilidade de fazer concertos levou muitos músicos independentes a perderem os seus rendimentos e a temerem pelo seu futuro. Os relatos de todo o mundo e dos mais diferentes géneros musicais, e mostram que o silêncio provocado pela pandemia está a causar sérios problemas.

É triste quando uma cara bem conhecida e amada por milhões de fãs, como Elton John, se vê envolvida numa tragédia financeira deste calibre. Contudo, é trágico quando milhares de músicos anónimos não sabem o que vai ser o seu futuro. E não conseguimos associar uma cara a este problema.

De todos os estilos de música chegam relatos devastadores de artistas que não acreditam que irão conseguir continuar a exercer a sua paixão. Um estudo feito pelo Musician’s Union, uma organização que representa mais de 30.000 músicos que trabalham em todos os setores da indústria musical britânica, indica que um em cada cinco músicos (19%) estão a ponderar terminar a sua carreira devido ao impacto financeiro causado pelo coronavírus. 

O estudo incidiu nas respostas de 1549 membros desta organização e concluiu ainda que 38% dos inquiridos não são elegíveis para receber fundos do estado.

Até ao momento em que estas conclusões foram publicadas, no final de março, o Musician’s Union estimava que os músicos britânicos já tinham perdido cerca de 16 mil euros em rendimentos.

Segundo um artigo publicado no World Economic Forum, a indústria musical tem um valor global de 50 mil milhões de dólares. Até 27 de maio, o cancelamento de concertos já tinha gerado um prejuízo total de 10 mil milhões de dólares, apenas em publicidade.

Da música clássica ao punk

«Todos os músicos que conheço estão prestes a entrar em falência. Não conseguimos pagar a nossa renda, nem comprar comida e não vemos um fim para esta situação», disse foi a violinista Miriam Davis à Classic FM, uma das três estações de rádio nacionais independentes do Reino Unido. 

A impossibilidade de dar concertos e a paralisação do setor deixou os intérpretes de música clássica numa posição delicada, uma vez que não têm hipótese de gerar qualquer tipo de rendimento pelo que se viram obrigados a virar-se para outro tipos de atividades e começar a dar aulas de música online, por exemplo.

Ainda no Reino Unido, mais concretamente, em West End, uma zona no centro de Londres que contém muitas das principais atrações turísticas ligadas à cultura, nomeadamente o West End Theatre, um dos maiores teatros comerciais do mundo. Onde antes as pessoas iam procurar felicidade e uma distração em musicais ou teatros, agora encontra-se um clima de incerteza e preocupação. Mais de 75% dos músicos que trabalham nos teatros desta região, se as salas de concertos e teatros não reabrirem, vão enfrentar dificuldades financeiras em setembro.

A flautista Jennah Smart disse ao site de notícias sobre teatro The Stage que as suas poupanças terminam em junho e que se encontra assustada com o seu futuro. «Se não voltar ao trabalho em setembro ou ao final do ano, porque os teatros ainda estão fechados por causa do coronavírus, de certeza absoluta que vou passar dificuldades, que não só vão ter um efeito negativo financeiramente, mas também na minha capacidade psicológica. É uma perspetiva assustadora», concluiu.

Do outro lado do Oceano Atlântico chegam relatos de Marisa Dabice, vocalista da banda punk Mannequin Pussy, que contou ao site Vulture como o cancelamento da sua tour resultou na perda de 80 mil dólares (aproximadamente, 70 mil euros), que consistiria no seu rendimento e da banda para os próximos seis meses. «Todas as pessoas que conheço estão no limite», disse. «Acho que ainda estamos todos a tentar processar. Este vírus não afeta apenas os músicos, é toda a indústria. Existem muitas pessoas envolvidas nas atuações ao vivo e [a pandemia] também as está a afetar». 
A Vulture também contactou Yako, produtor e DJ de Hong Kong, para perguntar como este está a lidar com o cancelamento da sua tour com mais de 50 concertos. Apesar de lamentar o dinheiro que não vai receber pelos concertos adiados, o DJ mostrou uma atitude positiva perante o novo tempo livre que adquiriu com a quarentena. «Tenho mais tempo para passar no estúdio e fazer nova música. É uma situação que não é assim tão má, mas também não é assim tão boa, neste momento, é mais uma forma de me preparar para o próximo capitulo da minha vida», confessou o produtor.
Justin LaBrash, músico country neozelandês, falou da dificuldade que os músicos independentes estão a enfrentar nesta altura, mas, ao DiscoverMooseJaw, rádio canadense, também falou sobre inovação. Para além de ter feito atuações online, este sábado, dia 13 de junho, o músico e a sua banda, True North, vão fazer um concerto num drive-in.
«Os concertos nas redes sociais foram bons, mas agora estou farto de tocar na minha roupa interior para um ecrã», disse Labrash à rádio, que ofereceu ainda conselhos sobre como podemos apoiar os nossos artistas favoritos. «A melhor coisa que podemos fazer neste momento, especialmente para apoiar músicos independentes, é ir aos seus sites online. A maioria dos artistas tem uma loja online com merchandise e CD’s. Comprar uma t-shirt ou um CD é uma grande ajuda para todos os artistas»