1970. Solstício do futebol-poema

Dia 21 de junho. Cumprem-se 50 anos sobre a final do Campeonato do Mundo do México. A vitória do Brasil, por 4-1, sobre a Itália, ficará para sempre como o ponto culminante de uma equipa que não voltou a ter igual. Nunca o esplendor sobre a relva atingiu tal estado de criatividade, de arte e…

Dizem-me que o Carlos Alberto morreu e que o Pelé vai fazer 80 anos. E eu, simplesmente, não acredito, pode lá ser? Ainda há pouco os vi na conclusão do movimento mais bonito alguma vez desenhado por uma cadeia de homens em corrida. O do golo irremediável. Irretocável. Clodoaldo às voltas com a bola e consigo próprio, parecendo um cão que procura morder a cauda, os adversários confusos, incapazes; depois a arrancada de Jairzinho, a bola em Pelé e este, adivinhando apenas, sem olhar para trás, dando um toque certeiro para que Carlos Alberto chutasse com a alma de um Brasil inteiro e a parte de fora do pé direito.

Éramos miúdos apenas e sabíamos de cor uma canção: «Do meio do gramado/Vem a bola p’ra Tostão/Tostão p’ra Rivelino/Está formada a contorção/Rivelino p’ra Pelé/Olha aí, olha o neg’ão/Olêlê olálá, estão botando p’ra quebrá’».

Não importava muito que não soubéssemos o que era a contorção. Os nomes soavam como se cometas colidissem num céu feito à sua medida. Tostão, o doutor, no seu jeito de filigrana, fazendo tabelinhas com Pelé; Jairzinho que avançava da direita para o centro como um furacão das caraíbas, o cabelo em forma de bola, uma velocidade que a televisão parecia não conseguir acompanhar; Gerson, o careca, acertando o relógio com o seu pé esquerdo; Rivelino e a violência dos seus pontapés devastadores. Edson Arantes do Nascimento, por extenso Pelé, homónimo da bola.

Alguns chamaram-lhe a equipa dos números dez. Mário Zagallo, o treinador, encaixou do meio campo para a frente cinco jogadores que eram números dez nos seus clubes: Pelé (Santos), Tostão (Cruzeiro), Rivelino (Fluminense), Gerson (São Paulo) e Jairzinho (Botafogo). Juntou-lhes o guarda-redes Félix, os centrais Brito e Piazza, e os laterais Carlos Alberto e Everaldo. Construiu a equipa mais perfeita de todos os tempos.

O Mundial de 1970 não foi apenas Brasil, embora pela primeira vez um campeão do mundo tivesse realizado um percurso limpo e imaculado como os lençóis que a freguesa dava ao rol n’A Aldeia da Roupa Branca, de Chianca de Garcia: Checoslováquia (4-1), Inglaterra (1-0) e Roménia (3-2), na fase de grupos; Peru (4-2), Uruguai (3-1) e Itália (4-1)._Nesse final de primavera, no México, juntaram-se todas as grandes selecções do planeta, da campeã do Mundo, Inglaterra, à vice-campeã, Alemanha, da Itália a um renascido Uruguai, de um Peru ofensivo como nunca a uma URSS que fora quarta classificada do Mundial anterior. Faltou Portugal de Eusébio, a equipa sensação de Inglaterra em 1966.

Os nomes pareciam explodir de imponência; Teofilo Cubillas, Mazurkiewicz, Sepp Maier, Gerd Müller, Uwe Seeler, Karl-Heinz Schnellinger, Franz Beckenbauer e Wolfgang Overath, Giacinto Facchetti, Roberto Rosato, Sandro Mazzola, Luigi Riva, Gianni Rivera e Roberto Boninsegna, Gordon Banks, Bobby Moore, Geoff Hurst, Martin Peters e Bobby Charlton… O elenco não seria mais completo se tivesse sido convidado. Luzes! Câmara! Acção!

 

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