Contar espingardas para chegar a acordo

Holanda, Áustria, Suécia e Dinamarca têm estado em desacordo em relação ao fundo no valor de 750 mil milhões de euros.

Mark Rutte, primeiro-ministro holandês, esteve até ao fecho da edição a trocar as voltas aos restantes líderes europeus, no que diz respeito ao plano de relançamento da economia e em torno do orçamento da União para 2021-2027 e do Fundo de Recuperação. O encontro estava marcado para sexta e sábado, mas teve se ser prolongado por mais um dia. Segundo fontes europeias, nesta fase das conversações a principal questão a ultrapassar é a do montante global do Fundo de Recuperação e do equilíbrio entre convenções e empréstimos. E o assunto voltou estar em cima da mesa à hora de jantar.

Charles Michel, o porta-voz do presidente do Conselho Europeu, começou por colocar sobre a mesa uma proposta idêntica àquela avançada no final de maio pela Comissão, de um Fundo num montante de 750 mil milhões, dois terços dos quais (500 mil milhões) a serem canalizados na forma de subsídios a fundo perdido para os Estados-membros – e 250 mil milhões como empréstimos –, de acordo com uma chave de repartição também ainda a ser negociada.

No entanto, os países ‘frugais’ – Holanda, Áustria, Suécia e Dinamarca e também a Finlândia continuam a considerar os montantes excessivos e a reclamar uma redução dos subsídios, tendo já Charles Michel proposto então que a fatia de subvenções fosse diminuída para 450 mil milhões de euros, subindo os empréstimos para 300 mil milhões, solução que os quatro países continuaram a rejeitar, defendendo antes que o montante do Fundo seja reduzido para 700 mil milhões, com 350 mil milhões para subvenções e outro tanto para empréstimos

 

Contar espingardas

O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán não hesitou em condenar o primeiro-ministro holandês por este impasse, ao afirmar que o acordo entre os 27 líderes europeus está bloqueado “por causa do tipo holandês”, classificando como “inaceitáveis” as insistências de Haia sobre o Estado de direito. O primeiro-ministro húngaro disse não gostar “do jogo de culpas”, mas reforçou que “o tipo holandês é o verdadeiro responsável por toda esta confusão”.

“Não sei qual é a razão pessoal para o primeiro-ministro holandês me odiar ou odiar a Hungria, mas ele está a atacar-nos severamente e a deixar claro que quem não respeita o Estado de direito deve ser punido em termos financeiros, essa é a sua posição, e isso é inaceitável”, vincou Viktor Orbán.

Tanto a Hungria como a Polónia estão contra condicionalidades nas ajudas europeias subordinadas ao respeito pelo Estado de Direito, desde logo por terem abertos contra si procedimentos por supostas violações nesta matéria.

Também em declarações prestadas antes da cimeira de líderes, o chefe de Governo polaco, Mateusz Morawiecki, notou que a ligação entre o Estado de direito e o orçamento europeu tem vindo a “ser utilizada em excesso” ao ser apontada como uma condição geral. “Não podemos concordar”, acrescentando que esta “é uma ferramenta nas mãos de países mais fortes que podem começar a chantagear outros países.

Também o primeiro-ministro português disse esperar que o Conselho Europeu chegue a um compromisso sobre o plano de resposta europeia à crise de coronavírus, advertindo que “será uma péssima notícia” para a Europa se tal não acontecer.

António Costa disse, no entanto, que, para se chegar a um compromisso a 27, não podem ser apenas 23 a ceder às reivindicações de quatro, os autodenominados ‘frugais’ — Países Baixos (Holanda), Áustria, Suécia e Dinamarca –, que “também têm de fazer algum esforço, porque até agora todos os movimentos [de aproximação] que têm sido feitos, têm sido feitos em direção àqueles quatro países”.

Pouco otimista estava a chanceler alemã, Angela Merkel ao considerar que era possível não chegar a acordo, apesar de destacar a “boa vontade”. “Há muito boa vontade, […] mas também é possível que nenhum resultado seja alcançado”, referiu. Uma posição contrária tinha o Presidente francês: “Penso que ainda é possível chegar a um bom compromisso, mas esse compromisso não pode pôr em causa a ambição e os valores europeus”, declarou Emmanuel Macron, acrescentando que “é preciso mais do que nunca haver unidade na Europa”, dada a “crise inédita, em termos sanitários, económicos e sociais” criada pela pandemia.