O acordo europeu

Apesar de alguns grandiosos anúncios políticos que chegam a falar em 1.8 biliões de euros, em rigor a real novidade é o pacote de 750 mil milhões que se junta aos habituais 1.1 biliões de orçamento plurianual europeu.

A União Europeia deu esta semana um sinal importante na resposta conjunta ao risco económico induzido pelo coronavírus através da aprovação dum fundo de recuperação de 750 mil milhões de euros. Esta negociação serviu também para salientar as vantagens para o bloco dum processo de decisão que já não inclui a força tradicionalmente bloqueadora do Reino Unido no pós-Brexit. Os sinais são para já encorajadores.

Apesar de alguns grandiosos anúncios políticos que chegam a falar em 1.8 biliões de euros, em rigor a real novidade é o pacote de 750 mil milhões que se junta aos habituais 1.1 biliões de orçamento plurianual europeu. O pacote – Fundo de Recuperação – inclui 390 mil milhões de subvenções a fundo perdido que serão garantidas pelo orçamento europeu, valor que baixou dos 500 mil milhões originalmente propostos pela liderança Franco-Alemã como concessão aos ‘países frugais’ a norte. Os restantes apoios consistirão em empréstimos e ambas as componentes terão algum grau de condicionalismo que visa garantir a correta execução dos fundos – a fiscalização competirá à Comissão Europeia que funcionará sob aviso de qualquer um dos estados membros.

Este passo é uma vitória para o eixo Merkel-Macron e tem claros benefícios económicos e sociais para a Europa. Desde logo porque o maior recipiente de apoio será a Itália, que é claramente o elo europeu que comporta mais riscos económicos e políticos no pós-pandemia. Isto porque o país transalpino já se encontrava estagnado há décadas mesmo antes do choque dos lockdowns, logo num registo de ainda maior dívida seria extremamente difícil encontrar um motor de crescimento puramente doméstico. O risco político é uma derivada do económico, devido ao facto do eurocético Salvini ter navegado esta crise na oposição ao Governo, procurando capitalizar no descontentamento provocado pela crise com o objetivo de regressar ao poder com um plano para retirar a Itália do Euro – algo que seria uma verdadeira caixa de Pandora que a Europa procurou evitar por via deste apoio suplementar.

A resposta europeia fica também mais equilibrada no tempo. Em 2020 o enfoque será apoio fiscal com base nos orçamentos nacionais, que será suportado ao nível regulatório via relaxamento das regras de défice e ao nível monetário pelo programa de compras de emergência iniciado pelo BCE. No ano seguinte o testemunho começará a ser passado para o Fundo de Recuperação, à medida que os projetos financiáveis sejam aprovados e executados. Em 2022 e 2023 será quando a fatia de leão dos fundos europeus será executada para apoiar uma nova fase de crescimento europeu.

O plano é positivo pois evita a criação explícita das politicamente tóxicas coronabonds ao mesmo tempo que cria novos mecanismos de apoio via um orçamento comunitário que há muito necessitava de alargar a sua capacidade e alcance. Resta agora esperar por alguns detalhes ao nível de fiscalização de execução e perceber até que ponto este tipo de consenso será possível obter em crises que sejam mais assimétricas entre países.

Gestor de fundo de investimento macro