O pecado mortal de Donald Trump

A acusação de que o Presidente gozou com soldados caídos em combate está a causar indignação a menos de um mês das eleições. Uns dizem que são fake news, outros estão furiosos.

Donald Trump é acusado do pecado mortal da política norte-americana: dizer mal das tropas. A notícia de que Trump, em 2018, terá recusado visitar o cemitério americano Aisne-Marne, perto de Paris, onde estão soldados caídos na i Guerra Mundial, por estar “cheio de falhados”, surge a menos de um mês das presidenciais, avançada pela Atlantic e negada pelo Presidente. As alegações cairiam mal fosse em que país fosse, mas estão a tornar-se um enorme problema para Trump, num país conhecido pelo seu zelo nacionalista, onde boa parte das crianças começam as aulas a jurar lealdade à bandeira e o hino nacional é omnipresente.

O timing das alegações é crucial. Para o Presidente e os seus apoiantes, a proximidade das eleições mostra que, obviamente, esta é mais uma cabala da imprensa, fake news, como costumam dizer. Não é uma versão difícil de vender: quase 90% dos norte-americanos creem que os média têm viés político, segundo sondagens da Gallup. Contudo, partes da história da Atlantic, que citava quatro fontes anónimas, incluindo generais, já foram confirmadas por fontes da AP, CNN e até da Fox News, tão leal ao Presidente.

As confirmações trouxeram à ribalta outros relatos semelhantes da visita do Presidente a França, no centenário do final da Grande Guerra. “De acordo com uma fonte nas reuniões, o Presidente Trump não quis incluir na parada, e passo a citar, ‘tipos feridos’. Disse que não dava bom aspeto”, avançou Jennifer Griffin, na Fox. Horas depois, a notícia da jornalista era ignorada pelos comentadores políticos da sua própria estação.

“Ele sempre descreveu os veteranos do Vietname como aqueles que não conseguiram escapar”, acrescentou Griffin. Aliás, o próprio Trump, como tantos jovens abastados nessa altura, evitou a conscrição obrigatória graças a um relatório médico, que se suspeita fosse falso, diagnosticando-o com osteocondroma, uma espécie de tumor benigno nos pés. Entretanto, Trump já exigiu no Twitter à Fox que demitisse Griffin.

 

Militares furiosos

Uma explicação para os súbitos testemunhos de militares, tão próximo das eleições, pode ser o acumular de tensões entre o Presidente norte-americano e altos cargos das Forças Armadas.

É que, durante muito tempo, Trump “pareceu receber as suas orientações estratégicas mais da Fox News que dos seus comandantes. Os generais e almirantes mantiveram a boca fechada, mas o ressentimento cresceu”, lembrou David Ignatius, colunista do Washington Post.

“Pensar que eu faria declarações negativas contra os nossos militares, quando ninguém fez o que eu fiz com os orçamentos militares”, defendeu-se Trump. Pouco tempo depois, apelava ao seu secretário da Defesa, Mark Esper, para não cortar os fundos à Stars and Stripes, a revista das Forças Armadas.

Não seria a primeira vez que Trump fazia comentários desdenhosos quanto a veteranos. Durante a campanha de 2016 gozou publicamente com o senador John McCain, um dos seus poucos críticos republicanos, cujo avião foi abatido quando bombardeava Hanói, em 1967, na operação Rolling Thunder, onde pereceram mais de 180 mil civis vietnamitas. McCain acabou capturado e brutalmente torturado durante anos.

“É um herói porque foi capturado. Eu gosto de pessoas que não foram capturadas”, disse publicamente Trump, salientando que McCain era “um falhado”. Ainda assim, meses depois, viria a vencer as eleições.