Jornalistas australianos conseguem fugir da China

As autoridades chinesas queriam interrogar Mike Smith e Bill Birtles quanto ao caso de Cheng Lei, uma jornalista australiana detida o mês passado.

Bill Birtles, correspondente em Pequim da Australian Broadcasting Corporation (ABC), e Mike Smith, correspondente em Xangai da Australian Financial Review (AFR), fugiram da China esta terça-feira, após serem questionados pela polícia chinesa, relativamente ao caso  Cheng Lei, uma outra jornalista australiana, que trabalhava como apresentadora do canal estatal chinês CGTN, detida a semana passada. O caso surge num momento de tensões altas entre a China e a Austrália, dois países cujas relações sempre foram complicadas, mas pioraram nos últimos meses quando Canberra se colocou abertamente do lado de Washington no seu conflito com Pequim.

“Senti como se eu, súbita e acidentalmente, me tivesse tornado num peão em algum tipo de disputa diplomática”, descreveu Birtles ao seu canal, assegurando que sai da China com mais perguntas que respostas.

“Por um lado, isto foi urgente o suficiente para eles me baterem à porta à meia noite, com um total de sete pessoas, para dizer que estou envolvido num caso de segurança do Estado”, contou. “Por outro, disseram: ‘Olha, vamos ligar-te amanhã para organizar uma conversa’”.

Contudo, Birtles não se deixou ficar. Ligou de imediato à embaixada da Austrália, onde se refugiou a semana passada, enquanto os diplomatas australianos negociavam a sua fuga e de Mike Smith, após os dois serem proíbidos de sair do país, uma restrição levantada ontem de manhã.

Ambos os jornalistas foram informados de que estavam a ser interrogados em relação ao caso de Cheng Lei, que está detida desde o mês passado, acusada de pôr em risco a segurança nacional. Cheng, nascida na China e criada em Melbourne, era um dos rostos da versão inglesa da CGTN, a CCTV. Vários amigos e colegas australianos garantem que Cheng sempre conseugiu manobrar com perícia entre a objetividade exigida a um jornalista e a censura chinesa. Pelo menos até agora.

“É difícil de imaginar que ela possa ter feito algo que causasse isto”, considerou Geoff Raby, antigo embaixador australiano em Pequim, um amigo de longa data de Cheng. “Ela compreendia muito bem o contexto em que operava e era muito cuidadosa”, assegurou à BBC.

 Suspeita-se que a detenção de Cheng e a pressão sobre Birtles e Smith seja uma retaliação contra a Austrália, que em 2018 proibiu a Huawei de participar na construção da sua rede 5G, e que pediu uma investigação à origem da covid-19, seguindo a batuta norte-americana. Agora, a fuga dos correspondentes da ABC e da AFR deixou a China sem qualquer jornalista australiano pela primeira vez em quase 50 anos, desde os tempos de Mao Tsé-Tung.