N2. O país numa estrada

De carro, mota, caravana ou a pé, foram muitos os que se fizeram ao caminho este verão. A Nacional 2 faz 75 anos e voltou a ter vida.Guia para uma das muitas viagens possíveis na terceira maior estrada do mundo.

Estão a fazer a N2? Também gostava». Foram muitas as vezes que o ouvimos, de Faro a Chaves, numa viagem de sete dias que percorreu os 739,260 km da estrada que em 1945 ligou o país de norte a sul e que nos últimos anos se tornou um ícone da identidade nacional. Em ano de aniversário redondo, foram muitos que ficaram curiosos e outros tantos os que a percorreram de carro, mota, caravana e a pé. Só faltou haver fila para carimbar os passaportes que tornam a conquista do asfalto uma aventura para todas as idades. Não sabe do que estamos a falar? Não estranhe, basta fazer-se ao caminho para se sentir parte desse clube cada vez maior que passa a conhecer as terras pelos quilómetros dos marcos, vibra com a criativa toponímia nacional (Picha?) e termina com aquela sensação de que as autoestradas encurtaram distâncias mas também cortaram a vista para o país. Não há viagens iguais, esta foi a nossa: caravana alugada, duas filhas, de dois e quatro anos. Houve muitos «já chegámos?», mas também jogos com a paisagem e cantigas. Está a ver o ‘indo eu indo eu a caminho de Viseu’? Quilómetro 179.

COM OU SEM PLANO

Pode optar por fazer o percurso de Chaves a Faro, do km 0 ao km 739 (km 738 na realidade, porque o marco do km 739 já não existe) ou o inverso, que foi o que seguimos. Vale a pena investir em alguma preparação, mesmo que sirva apenas de ponto de partida. O passaporte, que a ideia é carimbar em cada um dos 35 concelhos atravessados pela estrada, pode ser comprado por antecedência no site www.rotan2.pt, da Associação de Municípios da Rota da Estrada Nacional 2. Escolhemos também o guia da Papa Figos, que ajuda descobrir a história da estrada, inaugurada a 11 de maio de 1945. Não vai dar para ver tudo, mas há desvios que de outra forma poderiam passar despercebidos e pelo menos uma entrada no IP3 que é incontornável, já que o traçado se sobrepõe ao da velha N2. Será por menos de um quilómetro se estiver atento às saídas e mais vale desligar o Google Maps, que vai insistir que há caminhos bastante mais curtos para chegar ao destino – as máquinas nunca perceberão a nostalgia humana. Pode parecer que não é assim tanto, mas é a terceira maior estrada do mundo, só atrás dos 5194 km da Ruta 40 na Argentina e dos 3 939 km da route 66, nos EUA.

DE TRÁS PARA A FRENTE

As ruínas romanas de Milreu foram a primeira paragem, ainda no concelho de Faro, junto a Estoi, onde estacionámos a caravana para dormir no parque junto ao cemitério. Acordámos com um convívio de anciãos da terra num banco de jardim às primeiras horas da manhã, hábitos que pandemia não levou.

A serra algarvia dá lugar à planície do baixo Alentejo. Em Almodôvar, vale a pena visitar o Museu da Escrita do Sudoeste, e descobrir como eram os recados dos nossos antepassados de há 2500 anos. Elas sorriram com os rabiscos nas pedras – como assim, não existiram sempre tablets? – mas o certo é que também não conhecíamos os vestígios do que é uma das escritas mais antigas da Península Ibérica. A mais icónica é a imagem de um guerreiro com uma lança, ou quem sabe guerreira. A interpretação continua a ser alvo de estudo. Fui caçar e já volto?

O CÉU COMO NUNCA O VIMOS

Dormimos a segunda noite em Ferreira do Alentejo, no parque de campismo Markádia. Não podíamos ter acertado melhor: o céu estrelado do Alentejo é cada vez mais famoso, mas assim nunca o vimos e de repente senti-me de novo no deserto de San Pedro de Atacama, onde há romarias só por causa das estrelas. A caravana adormece junto à barragem de Odivelas, onde durante o dia dá para aproveitar para mergulhos, paddle ou simplesmente ver como saltam grandes peixes da água. E já vamos com cinco carimbos no passaporte. A paisagem começa a mudar, com pinheiros a irromper no dourado da planície alentejana.

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