A que estado chegámos…

Em que mundo nos encontramos! O puritanismo da linguagem obriga-nos a ter de especificar tudo, com todos os géneros e feitios. Sim… nem imagino dentro de dez anos o que irá acontecer, porque terá de falar nos Irmãos, nas Irmãs, nos neutros e demais géneros que já se podem encontrar.

"Irmãos todos” é o título que o Papa escolheu para a sua nova encíclica dedicada, como pode ler no subtítulo, à “fraternidade” e à “amizade social”. O título original em língua italiana permanecerá como está – e também sem ser traduzido – em toda as línguas nas quais o documento será difundido. Como é claro, as primeiras letras da nova “carta circular” (este é o significado da palavra “encíclica”) foram tomadas dos apontamentos do grande Santo de Assis dos quais o Papa Francisco escolheu o nome.

Enquanto se espera para conhecer o conteúdo desta carta, que o Sucessor de Pedro quer dirigir à humanidade inteira e assinará no próximo dia três de outubro sobre o tumulo do santo, nos últimos dias assistimos a discussões a propósito do único dado disponível, o título e o seu significado. Tratando-se de uma citação de São Francisco (que se encontra em Ammonizioni 6, 1: ff 155), obviamente que o papa não a modificou. Mas será absurdo pensar que o título, na sua formulação, contenha a intenção de excluir dos destinatários mais de metade dos seres humanos, quer dizer, as mulheres”.

Estes dois primeiros parágrafos não são da minha autoria, mas do diretor do Osservatore Romano, jornal diário da Santa Sé, Andrea Tornieli. Parecem ser um tanto ou quanto enigmáticas as palavras, mas eu tentarei comentar o que aqui assistimos.

A história conta-se em poucas palavras.

O Papa Francisco quer aproveitar esta situação de saúde pública mundial para se dirigir a todos os homens com uma mensagem, não sobre saúde, mas sobre fraternidade. Ele próprio já tinha assinado um documento com os muçulmanos há dois anos atrás e que comprometia os católicos a viverem esta fraternidade mútua.

Tendo escolhido o nome de Francisco por causa do nome do santo de Assis, o Papa decidir tomar umas palavras dos apontamentos daquele santo. É normal que as encíclicas fiquem conhecidas pelas duas primeiras palavras.

Neste caso, dado ser uma encíclica social, sobre a fraternidade humana, decidiu tomar as palavras “Irmãos todos”, dado resumir de forma clara a intensão que presidiu à elaboração da mensagem do Papa.

É romanticamente uma palavra linda, com contornos franciscanos, de inclusão dos homens numa fraternidade, numa irmandade. Muitos dirão… finalmente o Papa não se dirige só aos cristãos e trata todos por igual, como irmãos, e reconhece que Deus é Pai de todos…

Nada mais enganador…

Assim que se soube o título da Encíclica que será publicada dentro de quinze dias, houve logo críticas de alguns irmãos, que se calhar até são apenas meios irmãos, ou talvez só filhos de um dos membros do casal, ou quem sabe até nem são nada e que levaram o diretor do Osservatore Romano a fazer uma explicação.

Mas qual é a polémica?

Já se está mesmo a ver!

Afinal, ao escolher “Irmãos todos” o Papa está a excluir as “Irmãs todas”!

Em que mundo nos encontramos! O puritanismo da linguagem obriga-nos a ter de especificar tudo, com todos os géneros e feitios. Sim… nem imagino dentro de dez anos o que irá acontecer, porque terá de falar nos Irmãos, nas Irmãs, nos neutros e demais géneros que já se podem encontrar.

O que parece ser aquilo muitos chamam de linguagem inclusiva, não passa de um jogo de palavras para esvaziar de sentido os conteúdos dos textos e das comunicações que os homens e, já agora, as mulheres têm uns com os outros.

A minha professora primária ainda é viva… e lembro-me de nos ter ensinado que dentro da palavra irmãos então incluídos os dois géneros – masculino e feminino. Acontece que alguns em vez de quererem inclusão querem mesmo uma divisão para demarcar as diferenças…

A que estado chegámos…