Farmacêutica mostra-se “arrependida” por montar esquema de burla ao SNS com médicos

“Nunca foi minha intenção prejudicar o SNS. Se fosse hoje, fechava a porta e não fazia nada”, confessou a farmacêutica.

Uma farmacêutica testemunhou esta terça-feira perante o tribunal criminal de São João Novo, no Porto, e confessou ter burlado o Serviço Nacional de Saúde (SNS), pedindo a médicos que emitissem receitas que não correspondiam a uma verdadeira prescrição e sem decorrerem de consultas.

De acordo com a agência Lusa, a farmacêutica explicou que tudo começou porque o SNS lhe devolveu “30.000 e 40.000 euros” de receitas, sendo que parte delas foram por ter trocado medicamentos prescritos com o mesmo princípio ativo. A mulher chegou mesmo a admitir que cedeu um espaço para consultas ao primeiro médico, também arguido no processo, a “transcrever” as receitas que o SNS lhe devolveu. Em troca pelas transcrições das receitas, a arguida pagava uma percentagem aos cinco médicos que colaboravam com ela.

Segundo a acusação do Ministério Público (MP), os médicos emitiram receitas fraudulentas, utilizando dados de mais de uma centena de pacientes ou clientes das farmácias, que lhes eram fornecidos pelas farmacêuticas. "Nessas receitas médicas, prescreviam invariavelmente medicamentos com custo de aquisição dispendioso e com elevada taxa de comparticipação do SNS [até 90%]", diz a acusação.

Depois, as receitas eram entregues às farmacêuticas, que as apresentavam ao SNS como pagamento da comparticipação devida pelo Estado, “como se tivessem sido efetivamente aviadas a cliente da farmácia que daquele fosse beneficiário”.

"Estou muito arrependida. Nunca foi minha intenção prejudicar o SNS. Se fosse hoje, fechava a porta e não fazia nada", afirmou a farmacêutica, citada pela agência noticiosa.

Nesta sessão de tribunal, não compareceram três dos médicos arguidos: um por alegado erro de comunicação com o advogado e outros dois justificaram a ausência com doença.

A investigação e a acusação do processo surgem relacionadas com uma megaburla de comparticipações de medicamentos que aconteceu noutra farmácia de Braga, em Prado, concelho de Vila Verde, em que serão julgados entretanto em separado uma segunda farmacêutica e um sexto médico no dia 13 de janeiro de 2021, no tribunal de Matosinhos.

O SNS terá perdido mais de 1,3 milhões de euros em ambos os casos, segundo cálculos do Ministério Público (MP) divulgados em outubro de 2016 pela Procuradoria regional.

De acordo com a Procuradoria do Porto, os arguidos, incluindo as farmárcias como coletivas nos processos, estão acusados dos crimes de burla qualificada, falsidade informática e falsificação de documento. As farmácias e as farmacêuticas foram acusadas de corrupção ativa e os médicos de corrupção passiva.

Os crimes aconteceram desde meados de 2011 até 2015. O MP considerou que, nesse período, as farmacêuticas se “conluiaram” com os médicos para conseguir “ganhos indevidos à custa do Serviço Nacional de Saúde”.