Portugal precisa de um solavanco

Salazar percebeu o problema e chegou a dizer, em tom crítico, que a aspiração de boa parte dos portugueses era terem um emprego no Estado e fazerem o menos possível

Um dos grandes problemas do país, talvez o maior, é o gigantismo do Estado.

O problema é evidentemente antigo.

Compreende-se que um país tão pequeno, com um tão grande império colonial, tivesse uma administração pública desmedida: havia que gerir um território dezenas de vezes superior à minúscula metrópole.

Até porque, ao contrário de outras colonizações que assentavam muito na iniciativa privada, a nossa colonização sempre foi uma empresa do Estado, liderada pelo Estado e controlada por ele.

E com a independência do Brasil a situação não mudou muito.

Salazar percebeu o problema e chegou a dizer, em tom crítico, que a aspiração de boa parte dos portugueses era terem um emprego no Estado e fazerem o menos possível.

Mas, aí, ele ainda não sonhava ser ministro das Finanças e muito menos primeiro-ministro.

Logo que ascendeu ao poder, começou a ver a questão de outro modo.

Por um lado, percebeu que os portugueses tinham pouca capacidade de iniciativa, pelo que os privados não conseguiriam, nem de perto nem de longe, dar emprego a toda a gente; por outro, viu que politicamente lhe dava jeito ter um funcionalismo público extenso e relativamente acomodado.

O Estado manteve-se, portanto, omnipotente.

Veio o 25 de Abril e foi o que sabemos: em vez de libertar a sociedade civil, que era aquilo de que o país precisava, quis seguir o modelo comunista e pôs-se a fazer nacionalizações a esmo, afugentou os empresários e concentrou ainda mais gente na esfera pública.

Bancos, grupos económicos importantes, grandes herdades foram confiscados aos seus proprietários e açambarcados pelo Estado. 

Esta situação só começaria a ser revertida de modo sistemático no tempo do cavaquismo.

O cavaquismo foi o momento mais importante desde o 25 de Abril, porque, com as privatizações, libertou um pouco a sociedade civil.

Tirou-lhe as algemas.

Pode até dizer-se que, ironicamente, Cavaco Silva foi o grande salvador do 25 de Abril: se não fosse ele, o país ter-se-ia atolado num pântano económico donde seria depois muito difícil sair.

Mas daí para cá as coisas voltaram a piorar.

O Estado é hoje um enorme fardo que o país carrega às costas e não o deixa crescer.

E a situação não tende a inverter-se.

O PCP e o BE só falam em nacionalizar, em aumentar o investimento público, em contratar gente para a Função Pública, enquanto atacam o ‘grande capital’ (onde está ele?) e diabolizam o lucro das empresas.

E o PS está refém deles, quer para aprovar os orçamentos quer para controlar os protestos nas ruas, que vão recrudescer de intensidade com a crise.

Há anos, em conversa com o embaixador José Cutileiro, este dizia-me: «Eu tenho uma solução para a Função Pública: despede-se metade dos funcionários e duplica-se o ordenado aos outros». 

Era uma caricatura, evidentemente. 

Mas tinha um sentido: aligeirar o Estado e melhorar a sua qualificação.

Estamos, porém, no caminho oposto: manter um Estado gordo que precisa de muitos impostos para se financiar.

Impostos que sufocam as empresas e impedem o crescimento do país. 

Não tenhamos dúvidas: a continuar assim, Portugal vai ser cada vez menos competitivo no mundo global.

Para fugir a isso, precisaria de um solavanco. 

De algo que rompesse esta lógica infernal, diminuísse o peso do Estado, soltasse a sociedade civil, a libertasse de uma carga fiscal que não estimula ninguém a investir.

A próxima injeção brutal de dinheiros europeus podia ser esse solavanco. 

Mas, pelo que se sabe, a maior parte dos fundos que aí vêm vai ser consumida no Estado e não no reforço do nosso tecido empresarial – aquele que cria riqueza.

Ou seja, em vez de atenuarmos o problema, vamos provavelmente agravá-lo. 

Com esta troika PS+BE+PCP, o choque dos dinheiros europeus corre o risco de tornar o Estado ainda mais omnipotente. 

Continuará a ter muitos funcionários, muitos deles mal pagos, muitos deles inúteis, sendo cada vez mais um peso morto, que consome muitos recursos, retirando dinheiro à economia. 

E o país vai continuar a ser ultrapassado por aqueles que há meia dúzia de anos estavam bem atrás de nós.