Os ‘passos perdidos’ do regime…

Quando um Orçamento de Estado passa por uma ‘unha negra’, é natural que se instale um clima de incerteza e que se interiorize o princípio do ‘salve-se quem puder’…

Quando um Orçamento de Estado passa por uma ‘unha negra’ na votação na generalidade, ou se pressentem sinais nítidos de desorientação nas falanges do Governo, tanto na gestão de dinheiros públicos como na crise sanitária, é natural que se instale um clima de incerteza e que se interiorize o princípio do ‘salve-se quem puder’ e quem vier a seguir que ‘apague a luz e feche a porta’…

A sabedoria popular ensina-nos há muito que ‘casa onde não há pão’. E à mesa do Orçamento não faltam os fiéis de guardanapo posto, enquanto se confia nos fundos europeus que hão de vir, para engordar alguns negócios de ocasião e salvar muitos de aflições.

No meio disto, o Parlamento chumbou o referendo à eutanásia, proposto numa petição assinada por mais de 95 mil cidadãos, e prepara-se para acelerar o processo de votação dos projetos de lei na especialidade, rejeitados na generalidade em maio de 2018, mas aprovados na votação repetida em fevereiro deste ano, por insistência das esquerdas, contas feitas à sua atual vantagem aritmética.

A lição é óbvia e a tática conhecida. Para as esquerdas, quando uma votação lhes corre mal e o resultado não corresponde à sua vontade, repete-se a votação parlamentar (ou repetem-se as eleições nos Açores…), até serem alcançados os seus objetivos.

Enquanto o debate orçamental obrigou a uma pausa na eutanásia – e os media se divertiram com as farpas trocadas entre socialistas e bloquistas –, os números da crise pandémica dispararam de uma forma alarmante, forçando a equivoca ministra Marta Temido a admitir o recurso aos privados, perante o evidente esgotamento do SNS, cuja exaustão já era notória antes de aparecer o covid-19.

Com milhares de cirurgias e milhões de consultas e rastreios em atraso, conforme denunciou a Ordem dos Médicos em carta aberta à ministra, desenha-se um cenário alucinante nos hospitais públicos, depois de o Governo ter desperdiçado a pausa do vírus no Verão, descurando a planificação e a estratégia para enfrentar a segunda vaga, que todos os especialistas adivinhavam.

Confiou-se no ‘milagre’ e no improviso do ‘logo se vê’, em vez de levar a sério os avisos e a experiência de terceiros. Exerceu-se o poder de autorizar a uns o que se negou a outros, desde a festa do Avante! à Fórmula 1 no autódromo do Algarve, com público, enquanto a GNR se entretinha a intervir em festas pontuais, a coberto de fazer cumprir as disposições oficiais.

Pior: proibiu-se, novamente, a circulação entre concelhos – que os constitucionalistas reprovam sem estar declarado o estado de emergência – a pretexto de diminuir os riscos de ajuntamentos nos cemitérios em tempo de Finados.

Avolumaram-se as contradições, e agravaram-se os indicadores da morbilidade em Portugal, colocando já Portugal em 11.º lugar entre os países europeus com maior registo de óbitos por covid.

A ‘lista negra’ engrossou ainda com o número de óbitos  – mais 7936 mortes, entre março e setembro, do que a média dos mesmos meses dos últimos cinco anos, segundo o INE.

É neste contexto sombrio que as esquerdas pretendem impor a eutanásia como lei, como se fosse uma prioridade inadiável na sociedade portuguesa, que assiste, estupefacta, à razia dos idosos residentes em lares, muitos sem as menores condições para os acolher e tratar com dignidade.

De uma penada, o Parlamento achou que seria uma perda de tempo promover um referendo à eutanásia, como se o direito à vida fosse uma irrelevância.

Descontada a cobardia, não se percebe o que pode motivar os deputados a vetar o referendo. Afinal, que medos os tolhem para inviabilizarem a consulta popular?

Curiosamente, o PCP há apenas dois anos, defendia que «a dignidade da vida não se assegura com a consagração da morte». E, conforme então disse o deputado António Filipe, «o direito ao fim da vida em nome da dignidade é inaceitável».

O certo é que votaram contra o referendo, alegando terem-no feito em coerência com o princípio de serem contra a via referendária. Veremos se o PCP rejeita na especialidade a despenalização da eutanásia, como garantiu o mesmo deputado.

Bem a propósito, a Associação dos Médicos Católicos Portugueses, lembrou, que «o médico, assim como não é dono da vida do doente, também não é dono da sua morte».

O regime está a fechar-se sobre si próprio e as esquerdas deitam a mão a todos os expedientes para se perpetuarem no poder.

O país está a viver outro momento crucial da sua existência, com uma crise sanitária galopante e a economia a afundar-se, com o turismo a meio gás.

O maior Governo de sempre, com uma multidão de servidores ao seu dispor, já nem consegue disfarçar o desnorte. Mas a maioria dos media finge que não percebe e cultiva o seguidismo, sem contar os ‘passos perdidos’ do regime…