História política eleitoral dos Estados Unidos da América e previsões para este ano

Com base na História Política Eleitoral dos EUA, Rui Oliveira e Costa prevê que o duelo entre Donald Trump e Joe Biden seja decidido num ‘campo de batalha’ de 11 Estados, dos quais cinco com  resultado imprevisível: Flórida, Pensilvânia, Ohio, Carolina do Norte e Wisconsin. Os democratas têm mais Grandes Eleitores garantidos à partida, mas os…

História política eleitoral dos Estados Unidos da América e previsões para este ano

por Rui Oliveira e Costa
Professor de Ciência Política  e Administrador da Eurosondagem

I. A Constituição e o Sistema Eleitoral

Tanto a Constituição como o sistema eleitoral dos E.U.A. são resilientes, obra dos Pais Fundadores (George Washington, John Adams, Tomas Jefferson, James Madison, Benjamin Franklin e outros).

Na composição do sistema eleitoral, até hoje só foi alterado o ‘compromisso de Connecticut’, onde os escravos em termos de população só contavam 3/5 de um cidadão e em termos de eleição presidencial só o limite de dois mandatos, após o 4.º de Franklin Roosevelt (22.ª emenda).

Aliás a Constituição do E.U.A. nunca teve uma revisão. Só emendas, que têm que obter maioria qualificada de 2/3 nas duas Câmaras.

A Câmara Alta (o Senado) representa os Estados, que estão em plano de igualdade (dois para cada). Inicialmente, muitos Estados não elegiam os senadores. Era o governador (este sim eleito) que os escolhia. Ainda hoje, se um senador morre ou vai para a Administração ou se demite, o governador escolhe o substituto.

O mandato de um senador é de seis anos.

A Câmara Baixa (Câmara dos Representantes) representa os eleitores, num sentido proporcional à população, que atualmente vai de 1 a 53. Têm um mandato de dois anos. São 435 e, tal como os senadores, podem ser reeleitos. São em número ímpar e elegem um (ou uma) Presidente, que é a 3.ª figura do Estado, a seguir ao Presidente e ao vice-Presidente. Este vice tem o poder de desempatar uma votação no Senado (que tem um número par).

À junção das duas Câmaras, que detêm o poder legislativo, chama-se Congresso. Reúnem uma vez por ano para ouvir o discurso presidencial sobre o Estado da Nação e excecionalmente, o que é pouco frequente.

Na eleição presidencial, cada Estado tem um número de Grandes Eleitores que é a soma dos Senadores (sempre dois) mais os Representantes, que pode ser só um. A distribuição é proporcional, mas mitigada a favor dos mais pequenos, pois há um fator constante (dois para cada). Daí que nesta eleição indireta (que não é um colégio eleitoral, pois este não depende de eleições, como é o caso da Alemanha e da Itália – ou como aconteceu em Portugal com a recente eleição para as CCDR) haja 538 Grandes Eleitores, pois o Distrito de Columbia elege três.

Só o Maine (desde 1969) e o Nebraska (desde 1991) não têm o sistema ‘tudo para o vencedor’. Mas não tem proporcionalidade, que nos E.U.A. não existe em nenhum órgão. Estão divididos (o Maine tem quatro Grandes Eleitores – quase sempre democratas, e o Nebraska 5, quase sempre republicanos).

Mas cada Estado pode em qualquer momento decidir como quer eleger os seus Grandes Eleitores. Escolhem tudo para o vencedor para não perder importância. Se a Florida elegesse proporcionalmente, com os resultados que tem tido, seriam 15 para um e 14 para outro. No fundo só valia um voto. O Ohio, que elege 18, seriam quase sempre nove para cada – não valia nada e nenhum candidato lhe daria tanta importância.

O vencedor das eleições presidenciais pode, por isso, não ter mais votos dos cidadãos.

 Até hoje ocorreu cinco vezes:

1824 John Quincy Adams face a Andrew Jackson;
1876 Rutherford B. Hayes face a Samuel Tilden
1888 Benjamin Harrison face a Grover Cleveland
2000 George W. Bush face a Al Gore
2016  Donald Trump face a Hillary Clinton

Três vezes no século XIX e duas no século XXI. Nenhuma no século XX – e daí muitos terem estranhado o ocorrido neste século. 

Em caso de empate, ou se um terceiro candidato eleger Grandes Eleitores que não permita a nenhum candidato ter a maioria, cabe à Câmara dos Representantes eleger o Presidente e ao Senado eleger o vice-Presidente.

Em 1800, Thomas Jefferson (Sulista, Estado da Virgínia) e, em 1824, John Quincy Adams (Nova Inglaterra, Massachusetts) foram eleitos Presidentes pela Câmara dos Representantes. Há quase dois séculos que tal não acorre.

 

II. A Reeleição

A reeleição do Presidente dos E.U.A é a regra e a sua derrota a exceção. Das 30 tentativas de reeleição, 22 (73,3%) tiveram sucesso.

As oito não conseguidas (26,7%) estão enunciadas no quadro que se publica nas páginas seguintes.

 

III. O Bipartidarismo

1789 – Durante os primeiros 7 anos da Presidência de George Washington, só existiu o Partido Federalista. A partir de

1795, começa o bipartidarismo (quase sempre perfeito) com algumas tentativas sem sucesso de o mudar.

1796 – Tomas Jefferson funda o Partido Democrata Republicano, e com ele o bipartidarismo, pois o Partido Federalista continua sob a liderança de John Adams (vice e sucessor de George Washington). Jefferson é o primeiro Presidente não Federalista (venceu em 1800).

1820 – É fundado o Partido Nacional Republicano, que compete com o partido de Jefferson.

1828 – É fundado o Partido Democrata.

1836 – É fundado o Partido Liberal, que compete com o Partido Democrata.

1856 – É fundado o Partido Republicano, e com o desaparecimento do Partido Liberal, inicia-se o bipartidarismo entre Partido Democrata e Partido Republicano, que perdura até hoje.

1861 – Tem início a Guerra de Secessão que termina em 1865.

Nesta altura, os Partidos tinham ideologias e bases sociais e regionais bem diferentes das atuais.

Se o Mundo dá muitas voltas os Partidos Democrata e Republicano inverteram-se em quase tudo. Não foi de repente, mas foi sendo progressivo.

John Kennedy ganhou em várias Estados do Sul (incluindo o Texas), pois o seu vice Jonhson era governador deste Estado. As bases eleitorais foram mudando, mas algumas regras mantiveram-se. Assim, só um Democrata chegou à Casa Branca perdendo em Nova York (Truman, em 1948). 

E George W. Bush é eleito tendo perdido a Califórnia, até aí republicana. Estas são as exceções. Mas há uma regra que não teve exceção: nenhum republicano ganha sem vencer em Ohio.

IV. Sondagens e Resultados

Pese embora a elevada abstenção, as sondagens nos E.U.A. são fiáveis. Mas indicam percentagens nacionais com muito rigor (Hillary teve de facto quase 3 milhões de votos não potenciais vencedores).

Mesmo uma amostra nacional de 5000 pessoas dá uma média de 100 entrevistas por Estado. Nos últimos 70 anos, só duas vezes (Reagan e Obama e aquando da reeleição) os órgãos de comunicação social apontavam um vencedor. Em todas as outras foram omissos sobre quem iria ganhar.

Os candidatos e os seus partidos investem muitíssimo mais em sondagens estaduais – e têm sempre melhor informação.

Veja-se que em 2016 na última semana ninguém investiu no Ohio. Nem em televisão estadual nem em ações de campanha. É fácil de perceber que os democratas davam Ohio como perdido e os republicanos como ganho. Apostaram ambos onde sabiam que estava renhido (Virgínia e Florida, por exemplo). Assim vai ser também este ano. É, pois, com base nesta informação partidária que investem em dinheiro e tempo (anúncios televisivos, visitas, etc.). Trump está tão seguro no Texas (ao contrário da comunicação social) e Biden em Nova York que não gastam lá quase nada. É com base na História Política Eleitoral, e não em sondagens dos órgãos de comunicação social, que me atrevo a fazer as minhas previsões. _

V. As Eleições de 2020

Aqui vão as minhas previsões, ligeiramente diferentes das da comunicação social
americana e não só.

 

Republicanos Sólidos
21 Estados – 165 Grandes Eleitores

Texas – 38 
Indiana – 11 
Tennessee – 11 
Missouri – 10 
Alabama – 9 
Carolina do Sul – 9 
Louisiana – 8 
Kentucky – 8 
Oklahoma – 7 
Arkansas – 6 
Kansas – 6 
Mississippi – 6 
Nevada – 6 
Utah – 6 
Nebraska – 5 
Idaho – 4 
Alasca – 3 
Montana – 3 
Dakota do Norte – 3 
Dakota do Sul – 3 
Wyoming – 3 

Predomínio do Sul, Oeste e Estados Montanhosos.

 

Democratas Sólidos
18 Estados – 215 Eleitores + Distrito de Columbia – 3 Grandes Eleitores num total de 218 Grandes Eleitores.

Califórnia – 55 
Nova Yorque – 29 
Illinois – 20 
Nova Jérsia – 14 
Virgínia – 13 
Washington – 12 
Massachusetts – 11 
Maryland – 10 
Colorado – 9 
Connecticut – 7 
Oregon – 7 
Novo México – 5 
West Virginia – 5 
Maine – 5 
Hawaii – 4 
Rhode Island – 4 
Delaware – 3 
Vermont – 3 

Predomínio nos Estados do Pacifico, na Nova Inglaterra e em parte nos Grandes Lagos.

Campo de Batalha
11 Estados – 155 Grandes Eleitores
Destes 11 Estados, 3 estão pró-Republicanos:

Geórgia – 16
Arizona 11
Iowa – 6
E representam 33 Grandes Eleitores – que, somando à parte republicana sólida, dá um total de 24 Estados e 198 Grandes Eleitores. 

Dos mesmos 11 Estados do Campo de Batalha, 3 estão pró-Democratas:
Michigan – 16
Minnesota – 10
New Hampshire – 4
E representam 30 Grandes Eleitores – que, somando ao campo democrata sólido, dá um total de 21 Estados mais o Distrito de Columbia e 248 Grandes Eleitores.

Há ainda 5 Estados completamente imprevisíveis:
Flórida – 29 (Sul)
Pensilvânia – 20 (Nova Inglaterra)
Ohio – 18 (Grandes Lagos)
Carolina do Norte – 15 (Sul)
Wisconsin – 10 (Grandes Lagos)
Num total de 92 Grandes Eleitores, que irão decidir as eleições.