Resto do mundo aguarda para fazer a sua jogada

Resultado das eleições nos EUA pode vir a indicar o rumo do Brexit ou condenar o Governo de Bolsonaro.

Por todo o mundo aguarda-se com ansiedade o resultado das eleições nos Estados Unidos, a mais importante potência global. Para alguns países cujos líderes seguem uma orientação política próxima de Donald Trump, a sua reeleição seria mais um reforço da maré populista que abalou o planeta nos últimos anos; para os críticos do Presidente, uma vitória de Biden significaria o regresso à normal política externa dos EUA, uma estratégia de alianças que foi consensual entre republicanos e democratas durante décadas.

Para o primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, ter a possibilidade do chamado hard Brexit – ou seja, uma rutura completa nos laços comerciais com a União Europeia – pode depender da reeleição de Trump, que Johnson declarou ser um “amigo pessoal” e um inimigo da União Europeia, e poderá ser um ponto a favor nas suas ambições. 

É que, rompendo os laços com a UE, o Reino Unido precisa de ter outros mercados à disposição – os conservadores mais eurocéticos, como Johnson, sempre apontaram como possibilidade as antigas colónias britânicas, como a Austrália, mas sobretudo os EUA. Trump já se disponibilizou para tal, mas claro que isso só será possível se estiver na Casa Branca no final de dezembro, quando expira o prazo para um acordo entre Londres e Bruxelas. 

Já Biden fez um ultimato ao Reino Unido durante a campanha, exigindo como condição para qualquer acordo comercial com os EUA que Johnson cumpra o negociado com a UE quanto à fronteira entre a Irlanda do Norte, que faz parte do Reino Unido, e a República da Irlanda, para não pôr em risco o Acordo de Sexta-Feira Santa, que pôs fim à guerra civil. Os conservadores britânicos não ficaram nada satisfeitos.

Paciente União Europeia Os porta-vozes da União Europeia, sempre cuidadosos, afirmaram que só irão tecer comentários sobre as eleições após o seu resultado oficial. “Vamos aguardar que as autoridades eleitorais façam o seu trabalho”, afirmou o porta-voz da Comissão Europeia, Eric Mamer.

Contudo, apesar de ter pedido calma depois de Trump ter admitido “falsamente” que tinha vencido as eleições, o chefe da diplomacia da União Europeia, Josep Borrell, afirmou que apesar do resultado das eleições, estará disponível “para continuar a construir uma forte parceria transatlântica”. “A UE permanece disponível para continuar a construir uma forte parceria transatlântica, baseada nos nossos valores e história comuns”, escreveu Borrell no Twitter.

Da Rússia com amor O líder do comité de Relações Internacionais da câmara alta da Duma, Konstantin Kosachev, assegurou que a Rússia “beneficia de qualquer cenário em que o partido derrotado não precisa de recorrer a alegações de interferência externa”, numa referência às constantes acusações dos democratas de que Trump teria ganho em 2016 com apoio de hackers russos e que seria uma espécie de fantoche do Kremlin. “A América tem de voltar à política da sanidade. É hora disso. Quanto a nós, iremos sempre apoiá-la”.

Contudo, talvez por trás das costas, Putin esteja a fazer figas para que Trump, com quem manteve uma forte ligação nos últimos quatro anos, saia vencedor desta batalha. 

Apesar das relações entre ambos os países estarem algo tensas, os EUA impuseram mais sanções a Moscovo e Trump abandonou dois tratados nucleares cruciais e está prestes a sair de um terceiro. Contudo, com Joe Biden, que afirmou que a Rússia é “a ameaça global mais séria” para Washington, as relações com a Rússia só deverão piorar.

China não esquece Apesar de ambos os candidatos verem a China como uma ameaça, a verdade é que Pequim está no ponto mais baixo da sua relação com Washington dos últimos 40 anos. Não só houve constantes guerras comerciais entre os dois países durante o mandato de Trump, com graves estragos económicos mútuos, como as autoridades chinesas não escondem o desagrado por o Presidente dos EUA tratar a covid-19 por “vírus chinês”. 

No que toca a Trump, o Presidente chinês, Xi Jinping, tem referido que “atitudes arrogantes, hegemónicas e hostis não levam a lugar nenhum”. Já Joe Biden, apesar de se mostrar disponível para “reparar” as relações com países como a Rússia, Irão e Coreia do Norte, também prometeu promover uma investigação sobre o início da pandemia na China – contudo, garantindo que esta será de acordo com as regras internacionais

O Trump do Brasil aguarda pelo Americano O apoio de Trump pode não trazer grandes vantagens económicas para o Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro (carinhosamente apelidado de “Trump do Brasil” pelo republicano). No entanto, manteria o Brasil como um aliado estratégico dos EUA. 

Na eventualidade de Biden se tornar Presidente dos EUA, é possível que este “adote o rumo da União Europeia e passe a exigir o respeito de padrões internacionais em meio ambiente, proteção da Amazónia e política de género” ao Brasil, escreveu a Deutsche Welle.

 

Biden, o “cão raivoso” que é preciso “matar à paulada” A surpreendente boa relação de Trump com Kim Jong-un – surgida após semanas de ameaças mútuas de aniquilação nuclear, há uns anos atrás – sempre foi alvo de fortes críticas por parte de Joe Biden. Ora, isto não foi nada bem recebido pelo supremo líder da Coreia do Norte, que acusou o democrata de ser um “cão raivoso” que é preciso “matar à paulada”.

Embora os processos diplomáticos entre os dois países estejam em ponto morto há uns 20 meses, Trump prometeu que, caso fosse eleito, iria assinar “muito rapidamente” um acordo com Pyongyang. Já no caso de Joe Biden, especialistas políticos garantem que este não irá procurar aproximações com a Coreia do Norte.