Começar um tempo novo

A proposta de OE para 2021 que o Governo apresentou no Parlamento e que foi, por estes dias, sem novidade, aprovada na generalidade, revela, ainda assim, sinais indiscutíveis de que este ciclo político se esgotou.

por Miguel Barbosa
Gestor e vice-presidente do CDS

O documento demonstra a total ausência de uma estratégia para o país, de uma ideia de futuro ou sequer de um plano estável para fazer face à crise pandémica. Pior: o contraste entre o provocador otimismo do cenário em que assenta e a natureza retalhada e avulsa das medidas que propõe para fazer face a problemas muitos sérios, mostra bem como o Governo sabe já que este Orçamento não vigorará mais do que meia dúzia de meses. E mostra como o Primeiro-Ministro prepara já a entrada no novo ciclo, distribuindo benesses às clientelas do costume ou mitigando simbolicamente iniquidades históricas, ainda que, cinicamente, só a partir do segundo semestre.

O desnorte carimba, sem rebuço, a proposta do Governo:

• O aumento do investimento público em perto de mil milhões de Euros em setores historicamente deficitários, mal-organizados e de gestão caótica, cujas lacunas estruturais a pandemia veio pôr a descoberto – como a saúde e a educação –, sem qualquer efeito reprodutivo ou programático;

• O aumento da despesa corrente, ainda antes do pagamento dos juros da dívida pública, orçamentada em mais de cem mil milhões de Euros, bate recordes históricos e resulta essencialmente do acréscimo de custos com pessoal, designadamente com progressões na carreira, sem qualquer relação com a Covid-19 e que, portanto, veio para ficar e vai ser pago no futuro com idêntico aumento de impostos;

• A cegueira ideológica que capturou as políticas na Saúde, em nome da qual o Governo se recusa a recorrer à capacidade instalada do setor particular e social, preferindo abandonar os utentes à porta de um centro de saúde paralisado, entregá-los ao desamparo e ao medo de, numa urgência não-covid, recorrer a um hospital, ou mantê-los numa interminável lista de espera com que a doença não se compadece, privando milhares de portugueses do acesso aos cuidados mais básicos;

• A esmola no IRS que o Governo promete entregar às famílias com o dinheiro que é delas e que, abusivamente, lhes vem retendo para, à sua custa, se financiar gratuitamente e que, cinicamente disfarçou de devolução de rendimentos;

• E, sobretudo, a insistência numa irresponsável desconsideração por quem cria emprego e riqueza e por quem procura, através do trabalho e do mérito, deixar mais aos filhos do que recebeu: não se encontra nesta proposta uma medida estruturada ou eficaz de promoção do investimento privado, de incentivo à manutenção do emprego ou de alívio à asfixia em que vive a tesouraria da maior parte das empresas.

É por isso necessário preparar a chegada de um tempo novo, de novas políticas e de novos protagonistas. No CDS, há já vários meses que ouvimos o país e trabalhamos em conjunto com diferentes setores da sociedade para dar respostas alternativas. As propostas que apresentaremos são sóbrias, de fácil execução e respondem às prioridades de que depende o relançamento da economia: a proteção do rendimento das famílias, a manutenção do emprego, o apoio às empresas e o incentivo ao investimento, assim como o combate à exclusão dos mais frágeis e desfavorecidos.

Para proteger os rendimentos das famílias, o CDS propõe descer o IRS para os níveis de 2019 baixar significativamente as retenções na fonte, aproximando de facto o imposto retido do devido.

Para proteger o emprego, rejeita-se o caminho de prejudicar que tem de despedir e impõem-se estímulos a quem emprega, reduzindo encargos e majorando benefícios, incentivando o regresso à atividade em lugar da paragem.

Para aliviar o estrangulamento da tesouraria das empresas, exige-se ao Estado, antes de mais, que seja tão rigoroso e pontual a pagar como é a cobrar, permitindo-se que o pagamento de qualquer encargo se possa fazer por compensação direta, num esquema de conta corrente. Para compensar os prejuízos deste ano, é preciso poder abatê-los aos lucros do ano passado, admitindo transitoriamente um reporte ‘carry back’, que dará origem ao reembolso de algum do IRC pago este ano. É igualmente imperioso eliminar os pagamentos por conta e os PECs de quem não tem lucros.

Promover o investimento e apoiar as empresas significa fomentar a criação de riqueza, sem a qual não há como proteger os mais frágeis. Tornar o IRC mais competitivo, eliminar as tributações autónomas nas empresas com prejuízos, alargar e simplificar os benefícios fiscais ao emprego e ao investimento, são medidas imperativas a que o CDS dará voz.

Por fim, a preocupação em não deixar ninguém para trás impõem garantir medicamentos a quem escolhe pagar a conta do supermercado em detrimento da farmácia e assegurar aos doentes não covid, a quem o Governo encerrou as portas do SNS, uma via verde de acesso ao setor privado.

O CDS não abdica de liderar à direita. Este pacote de medidas é um punhado consequente de causas e razões agregadoras que Portugal possa voltar a acreditar. Construir o futuro é o nosso compromisso.