O PS e o PCP/Bloco estarão com saudades da troika?

Sejamos racionais e não emotivos, por muito que a covid nos condicione. Este OE já passou de aflitos na generalidade, com um défice de 4,3% do PIB. Mas parece que ainda o querem agravar na especialidade, num quadro de enorme incerteza internacional, sobretudo quando a ‘bazuca’ europeia aparenta tardar a chegar. 

Começo sinceramente a pensar se o PS mais os seus parceiros da esquerda, PCP e Bloco, não estarão mesmo com saudades da troika, quando vejo a possibilidade do OE 2021 proposto pelo PS ser aprovado com a chancela do PCP (ou do Bloco)… Leio e nem acredito como o PCP que atualmente representa no Parlamento cerca de 5% dos votos dos portugueses (12 deputados em 230) consegue ter tanta força junto do PS para ajudar a desequilibrar de forma estrutural as contas nacionais.

Sejamos racionais e não emotivos, por muito que a covid nos condicione. Este OE já passou de aflitos na generalidade, com um défice de 4,3% do PIB. Mas parece que ainda o querem agravar na especialidade, num quadro de enorme incerteza internacional, sobretudo quando a ‘bazuca’ europeia aparenta tardar a chegar. Com a agravante de se ignorarem inúmeros alertas que vêm sendo dados e parecem cair em cesto roto.
Por exemplo, o Conselho de Finanças Públicas tem sistematicamente chamado a atenção para a situação periclitante do país por causa da dívida pública, estimada para dezembro 2020 em 133,8% do PIB ou seja 268,3 MM euros. Ou mais grave ainda, porque segundo o Banco de Portugal, o endividamento da economia (famílias, empresas e Estado) atinge novo recorde de 738 MM euros (com o rácio do endividamento do setor não-financeiro ser 359,3% do PIB em setembro, mais 21,3% que em março e a dívida total do setor público estar em 335,3 MM euros, mais 900 milhões de euros que em março).

Como se não bastasse, esta semana, a Comissão Europeia foi bem clara na avaliação feita aos planos orçamentais, referindo que «não se pode apenas preocupar em combater a pandemia, mas também em sustentar as contas públicas a médio prazo!». Mensagem muito concreta dirigida a 6 países: Portugal, França, Espanha, Grécia, Itália e Bélgica, corroborando o que Centeno, ora Governador do Banco de Portugal, já tinha dito salientando que a dívida pública impede de fazer apoios massivos à economia (será que ainda se lembra que foi ministro das Finanças?).
Vemos ainda que na banca portuguesa há um problema clarinho de crédito malparado, mesmo estando mitigado pelas moratórias que, quando terminarem em 30 setembro 2021, irão certamente gerar enormes ‘defaults’. Aliás, segundo as notícias, já se fizeram no último trimestre provisões de 827 milhões de euros nos 5 principais bancos nacionais para fazer face à crise da covid.

Quanto à economia, a queda do PIB no 3.º trimestre (5,8%) até foi bem menor que no 2.º trimestre (16,5%). Pressurosamente, Centeno veio secundar o Governo ao dizer que em 2020 o PIB irá cair cerca de 8,1% (em junho, a previsão era de 9,5%). Mas então, onde andam as cabeças dos nossos políticos e a do ministro das Finanças perante esta segunda vaga bem dramática da covid que irá ter óbvios reflexos na queda da economia nacional neste 4.º trimestre? Exemplos? A Autoeuropa vai fechar em dezembro e produzir menos 7000 veículos ou o turismo que ainda trabalhou qualquer coisa no 3.º trimestre está hoje ligado à máquina, pelo menos até ao verão de 2021 (mesmo com vacinas a chegar no dealbar de 2021).

Neste enquadramento desastroso, por muito meritórias que sejam as causas sociais que todos apoiamos, onde e como iremos financiar mais despesa estrutural para o PS satisfazer os ultimatos do PCP? Não chega autorizar o XXI Congresso Nacional para 27 a 29 novembro, quando nestes fins de semana os portugueses têm andado confinados, reforçando a ideia de que os políticos são uma casta acima dos portugueses? Bem pode João Leão desviar as atenções para as emendas propostas do PSD (quantificadas pelo Governo em 700 milhões de euros) porque todos sabemos que as únicas a serem viabilizadas pelo PS serão as da esquerda de cuja abstenção depende para aprovar a votação na especialidade.

Curiosamente, perante as dificuldades das negociações com o PCP, o Governo relembrou-se agora que talvez o Bloco com as suas reivindicações das leis laborais fosse mais ‘soft’ e lá o convidou para reatar as negociações. Reviravolta ou apenas um confirmar que António Costa também gosta de ultrapassar linhas vermelhas, desde que bem entrelaçadas com o Bloco e PCP, mesmo que daí decorram consequências seriíssimas para as contas públicas nacionais? Assim, só pergunto: será que a aprovação do OE 2021 nestas condições, aliás conforme Marcelo exige, irá contribuir para, num prazo mais curto do que imaginamos, novamente apelarmos à troika para nos vir safar de mais uma bancarrota?