António Costa é verdadeiro quando está a reinar e intruja quando o assunto é sério. Vem isto a propósito das oito respostas enviadas esta semana pelo primeiro-ministro para o Tribunal de Santarém, onde este afirma que “desconhecia o quadro em que decorrera a recuperação do material furtado”. Mais, o líder governamental — que nos solilóquios com a Justiça tem de jurar por sua honra dizer a verdade e só a verdade — mete as mãos no lume pela lealdade e integridade do seu ex-ministro da Defesa, Azeredo Lopes, que o Ministério Público acusa de ter andado a contrabandear com o diretor da PJ militar a inopinada encenação. E isto quando até o próprio já o tinha confessado.
Recorde-se, a propósito, um SMS inctercetado no processo, que veio a público, e que António Costa, o homem das oito negas, não pode ignorar. No dia, em que a PJM, em comunicado, informa que o armamento deu à costa, o deputado socialista Tiago Ribeiro, reposta a honra das tropas, sente-se aliviado e decide, por correspondência eletrónica, felicitar Azeredo Lopes. E este não só não enjeita o feito, como se vangloria: «Foi bom: pela primeira vez se recuperou [sic] armamento furtado. Eu sabia, mas tive de aguentar calado a porrada que levei. Mas, como é claro, não sabia que ia ser hoje.»
Oito negas, Costa. Não teria sido mais pândego enviar numa pen a resposta que deu a Ricardo Araújo Pereira quando este lhe perguntou o que achava de o seu ex-ministro estar no pacote dos arguidos que iam a julgamento? «(…)Tenho de reconhecer que é um argumento muito original: o crime verdadeiramente não foi o roubo das armas, o crime verdadeiramente grave foi recuperar as armas. É tal a originalidade da narrativa(…) Estou curiosíssimo para ver esse julgamento».
Fique-se com um excerto de Uma Campanha Alegre, de Eça de Queiroz. Tem tudo a ver com as negas dos tempos que correm:
«A única crítica é a gargalhada! Nós bem o sabemos: a gargalhada nem é um raciocínio, nem um sentimento; não cria nada, destrói tudo, não responde por coisa alguma. E no entanto é o único comentário do mundo político em Portugal. Um Governo decreta? gargalhada. Reprime? gargalhada. Cai? gargalhada. E sempre esta política, liberal ou opressiva, terá em redor dela, sobre ela, envolvendo-a como a palpitação de asas de uma ave monstruosa, sempre, perpetuamente, vibrante, e cruel – a gargalhada! Política querida, sê o que quiseres, toma todas as atitudes, pensa, ensina, discute, oprime – nós riremos. A tua atmosfera é de chalaça».