2020. O ano com mais mortes da década

Mortalidade tornou a disparar em novembro. Já morreram mais 1755 pessoas do que no mesmo mês do ano passado. Pico de mortalidade, maior do que o de abril, vivido sobretudo no Norte e acima dos 75 anos.  

O número de mortes em Portugal este ano vai superar em muito o balanço de 2019.  A um mês do final do ano, a trajetória da mortalidade no país já não deixa dúvidas sobre as marcas no país e nas famílias. Até esta semana, morreram em Portugal quase 110 mil pessoas (109 343), quando em todo o ano passado se resgistaram 112 mil mortes e é no mês de dezembro, ainda pela frente, a par de janeiro, que se costuma registar maior mortalidade. O número de mortes tornou a subir de forma acentuada este mês, depois de picos de mortalidade em abril – na primeira vaga da covid-19 – e em julho,  na altura uma subida das mortes associada pelas autoridades de saúde e pelo Ministério a ondas de calor. 

Ainda com o mês por terminar, os dados disponíveis na Plataforma Nacional de Vigilância da Mortalidade, onde são registados todos os certificados de óbitos declarados no país, que o SOL analisou, mostram que este ano se registou até dia 26 (os últimos dados passíveis de analisar ontem) uma subida de 31% nas mortes no mês de novembro face ao que era a média de mortalidade neste mês na última década. Um balanço que deverá agravar-se, uma vez que os dados só costumam ser consolidados ao fim de algumas semanas. 

Embora este ano já vários meses tenham batido recordes da última década, o aumento de mortes resgistado este mês não tem precedentes e ainda não foi alvo de nenhuma análise pública por parte das autoridades de saúde, que, de resto, ainda não apresentaram uma análise sobre as causas de morte que registaram subidas este ano, marcado também por menor acesso a cuidados de saúde e, nos primeiros meses da epidemia, por uma quebra acentuada nas idas a urgências – que desde outubro voltaram também a registar nova descida, ainda que menor do que em março, quando caíram para menos de metade. 

Até dia 26 de novembro, morreram 9896 pessoas no país, mais 1795 do que no mesmo mês do ano passado. Registou-se mesmo o dia com mais mortes do ano – o que habitualmente acontece no pico do inverno, ou em dias de calor extremo, como aconteceu em agosto de 2018. Este ano, até aqui, o dia com mais mortes foi o domingo 15 de novembro, em que  morreram pelo menos 447 pessoas no país. Foi o dia em que foi reportado aquele que se mantém até aqui o dia com mais mortes associadas à covid-19, 91. Mas a covid-19 não explica tudo: nos últimos dez anos, até este dia, tinham morrido em média 317 pessoas. Morreram mais de uma centena de pessoas que em qualquer um dos anos anteriores.

O pior mês da pandemia

Novembro tem sido, de longe, o mês com mais mortes associadas à epidemia de covid-19, que avançou de forma galopante na região Norte em outubro, atingindo progressivamente mais idosos, os grupos de maior risco. Até dia 26, esta quinta-feira, morreram no país 1732 pessoas infetadas com covid-19, números que se sobrepõem quase com a diferença de mortes entre novembro do ano passado e este. São já duas vezes mais mortes associadas à covid-19 do que aquele que, até aqui, tinha sido o mês mais duro da pandemia no país, abril – quando a covid-19 foi associada a 820 mortes. E três vezes mais vítimas mortais do que no mês passado, quando os casos foram subindo de forma acentuada até o Governo determinar novas medidas de controlo da epidemia no final de outubro. 

Os dados disponibilizados pela DGS, que o SOL analisou, mostram que a maioria das pessoas que morreram infetadas este mês (88%) tinham mais de 70 anos idade: 360 tinham entre 70 e 79 anos e 1178 tinham mais de 80 anos. Registaram-se ainda 130 mortes entre sexagenários, 48 na faixa etária dos 50 anos e 16 mortes abaixo dos 50. 

O peso sobre os mais velhos

Se muitas das análises estão por fazer e dependerão da codificação das causas de morte, a cargo da Direção Geral da Saúde, é já evidente que o aumento da mortalidade que se viveu este ano se tem registado sobretudo entre a população mais velha e este mês em particular na região Norte, mais afetada nesta nova vaga da epidemia, com mais do dobro dos casos da região de Lisboa. 

A plataforma de vigilância de mortalidade mostra que o pico de mortalidade que se vive este mês foi mais acentuado no Norte, onde houve vários dias com mais de 150 óbitos, o que só costuma acontecer no pico dos invernos mais intensos em termos de gripe e frio. E não tinha acontecido este ano mesmo durante a primeira vaga, quando a região já tinha sido a mais atingida no país. 

Já na análise por faixas etárias, também disponível na plataforma EVM, verifica-se que as mortes têm estado acima do esperado acima dos 65 anos, mas de forma mais pronunciada acima dos 75 anos de idade. 
Analisando o ano completo, até dia 26 de novembro morreram 78040 idosos com mais de 75 anos no país, quando em todo o ano passado se registara 79444 mortes nesta faixa etária – um recorde que será também batido neste ano da pandemia. O mês em que a mortalidade mais disparou nos idosos em relação a 2019 foi o mês de julho: neste mês do ano em que habitualmente se registam menos mortes no país, morreram 7561 idosos com mais de 75 anos, mais 33,6% de mortes do que no mesmo mês do ano passado. O segundo mês com o maior aumento nas mortes de idosos é agora novembro, com uma subida de 25,1% dos óbitos de pessoas com 75 ou mais anos face a novembro de 2019. 

A forma como a epidemia atingiu de forma galopante os mais velhos, podendo não ser a única explicação para o aumento de óbitos, é também cada vez mais visível nos dados disponibilizados pela DGS, embora continue sem haver por parte das autoridades de saúde uma análise global sobre os contextos em que ocorreram mais contágios entre a população mais velha.  

Desde o início do mês, foram diagnosticados em Portugal mais de 136 mil casos de covid-19, mais do dobro de outubro, também com um aumento da testagem. O número de diagnósticos acima dos 70 anos subiu de 8500 casos em outubro para mais de 17 mil este mês, com cada semana a registar novos máximos de infeções nesta faixa etária. Acima dos 70 anos, a letalidade da covid-19 tem rondado os 9,6%, pelo que mesmo com um abrandamento dos casos é expectável que o número de mortes associadas à epidemia permaneça elevada. 

As projeções da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa apontam agora, perante um abrandamento dos casos, para que até ao final do ano possam registar-se cerca de 7 mil mortes no país associadas à  covid-19, um balanço que neste final de novembro atingiu já as 4276 mortes. 

Tendo em conta toda a mortalidade no país, este ano morreram até esta semana mais 10 mil pessoas do que na média dos últimos cinco anos no mesmo período e mais 7981 pessoas do que em 2019.