Ações políticas sem suporte técnico

Não há vacinas para todos ao mesmo tempo e também não haveria profissionais que conseguissem num mês vacinar dez milhões de pessoas…

Eu devo confessar que pouco sei da covid -19. Sei que tenho de usar a máscara em lugares fechados. Sei que devo trazer comigo o álcool gel para desinfetar as mãos. Sei que não devo almoçar e jantar com muitas pessoas, porque aumenta o risco de poder ser infetado ou de infetar outras pessoas – aliás, já tive uma quarentena porque almocei com alguém que estava positivo.

Não me meto em questões de saúde pública, porque também não sei nada de saúde pública – mesmo tendo já trabalhado num hospital durante nove anos. Admiro os médicos e os técnicos de saúde que estão a gerir esta Pandemia. Admiro-os porque do seu conhecimento e das suas investigações dependem as vidas de milhões de pessoas.

A chegada de uma vacina da covid-19 a Portugal em janeiro do próximo ano obrigou-nos a pensar numa estratégia para a vacinação dos dez milhões de habitantes do nosso país. Aliás, é assim todos os anos com a vacina da gripe. Tirando a Dra. Ana Gomes, todos os portugueses que querem ser vacinados têm de esperar a sua vez de receber a vacina conforme ao stock existente.

Assim em janeiro! Segundo o que li nos jornais, entre janeiro e março teremos quase um milhão de portugueses vacinados. Isto é notoriamente pouco, pois não passa de dez por cento da população total. Mas é o que há cá! Não há stock da vacina da covid-19 para todos ao mesmo tempo e também não haveria profissionais de saúde que conseguissem num mês vacinar dez milhões de pessoas ao mesmo tempo.

Houve, então, uma primeira polémica, quando se deu prioridade a alguns setores da sociedade em função da eficácia conforme a idade, a profissão e a exposição de pessoas em risco. Num pré-esboço de estratégia chegou-se a pensar em não vacinar nesta primeira fase quem tem mais de 75 anos, por – segundo li – não haver provas da sua eficácia nesta faixa etária.

Claro que se levantou grande alvoroço na comunicação social e nos meios médicos ao pensar que se iriam meter de parte aqueles que têm mais de 75 anos. Seria quase como que – mal comparado – meter os idosos em fila para entrarem na morte.

Ficou-me, no entanto, uma pergunta que não vi respondida por ninguém: se não havia, está demonstrada a eficácia das vacinas para maiores de 75 anos, não seria de esperar pelos estudos de eficácia para prosseguirmos com a vacinação desta faixa etária?

Se não está demonstrada a eficácia, quer dizer que os investigadores ainda continuam a fazer as suas pesquisas científicas. Ou seja, o que estamos a tratar nesta pandemia é fruto de anos de investigações científicas no âmbito da sociologia, da química, da bioquímica, da medicina e de muitas outras áreas. O progresso da ciência é algo de espantoso, que os nossos conterrâneos no tempo da Peste Negra gostariam de ter tido, mas não tiveram.

Admira-me uma afirmação proferida pelo nosso primeiro-ministro: «Há critérios técnicos que nunca poderão ser aceites pelos responsáveis políticos. Não é admissível desistir de proteger a vida em função da idade. As vidas não têm prazo de validade».

Porque acho estranho?

Simples! Esta afirmação diz-nos que pode haver critérios políticos contrários aos critérios técnicos. É ainda estranho que se diga que «não se pode desistir de proteger a vida em função da idade» e que «as vidas não têm prazo de validade», quando se encontra para aprovação um diploma sobre a aplicação da eutanásia que contraria esta lógica de pensamento!