Duas frentes, dois combates

Como Churchill disse numa hora negra como esta que estamos a viver, mesmo sabendo que seremos vencidos, temos de morrer a lutar.

Há duas semanas no SOL, João Brás escreveu uma crónica notável. Escrevo hoje na sequência dela.

1. O combate contra a ignorância. Que estamos a perder. Que comecei a perder quando há trinta anos lutei incansavelmente contra a ocupação da escola pelos (os mesmos de hoje) que a ocuparam para promover a ignorância. Está tudo nos textos que reuni no meu livro Os Anos Devastadores do Eduquês. 
É um combate perdido, mas praticável. O que enfrentamos é um programa: do anti-conhecimento em todos os domínios do saber, da eliminação dos valores da ‘escalada do homem’, que foram erguendo a civilização. É o programa dos que ocuparam o centro emissor estratégico para levar a cabo esse plano sinistro: a escola. 
A queda brutal dos resultados dos alunos portugueses no TIMMS, agora divulgados, inquestionavelmente atribuível à ação nos últimos seis anos do secretário de Estado (o ministro não existe) – com a destruição das mudanças de Passos Coelho/ Nuno Crato –, é a mais recente evidência desse objetivo ideológico de disseminação da ignorância. E roubaram-nos outro instrumento de esclarecimento e de iluminação: a leitura. Porque foram promovendo o iletrismo e mesmo o analfabetismo. (Ver o meu artigo Leitura e desenvolvimento, SOL, 5/12)

2. Outro combate – esse mais desesperante e desanimador –, noutro terreno, contra algo de outra natureza, mais pavoroso, é o combate contra a desrazão, contra o obscurantismo, o irracionalismo. A arma a usar é a razão. O apelo à iluminação da razão. Mas como abrir mentes que querem enganar-se a elas próprias?
Este combate tem de ser conduzido, parece-me, no registo, digamos, da filosofia, da maiêutica, da psicanálise. Mas, como Freud explicou – análise terminada, análise interminável –, a análise esgota-se, chega a um limite explicativo a partir do qual esbarra com uma barreira, na fronteira de outro território, de outra natureza: o da biologia.

3. Vou clarificar o que escrevi com a ilustração de um caso concreto:
Quem pode ignorar hoje que o comunismo e o nazismo (e a inquisição, etc.) são iguais na sua natureza, propósito, autojustificação e efeitos? Com o acesso à informação que existe agora, ninguém pode, não é? A União Europeia até aprovou, com o voto de todos os países, uma declaração afirmando a igualdade dos crimes nazis e do comunismo. E todavia… a foice e o martelo aí estão desfraldadas por dois partidos na nossa AR. E ainda há dias o PCP dizia que o capitalismo tinha de ser destruído pela força (isto é, matar os capitalistas). E todavia… um amigo do Facebook ainda hoje contrapunha aos crimes do comunismo os do capitalismo. Neste caso, trata-se de uma ignorância que devemos ajudar a eliminar, que é eliminável pelo conhecimento. Mas será apenas ignorância? Isto é, esse amigo quer ‘perceber e ver’ a diferença, tão óbvia? Ou pretende enganar-se a si próprio? 

Como escreveu João Brás, estamos a perder estes combates. E parece estarmos quase sós neles. Como ele também esteve. Mas não podemos deixar de combater. Como Churchill disse numa hora negra como esta que estamos a viver, mesmo sabendo que seremos vencidos, temos de morrer a lutar. Tal como exortou que se fizesse aos nazis: «Não paremos de lhes moer o juízo».