Os cinco ‘maiores’ de 2020

Uma doença relativamente benigna, que é perigosa sobretudo para a população com mais de 80 anos (40% dos óbitos foram em lares), vai provocar rombos económicos (e psicológicos) que se prolongarão por muitos anos e causarão graves problemas sociais no futuro.

Coronavírus

Figura nacional – e mundial – do ano foi, sem dúvida, o coronavírus. Ele corresponde à primeira pandemia num novo patamar civilizacional, caracterizado pela globalização e pela sociedade mediática. Sem a globalização, o vírus não se teria propagado tão rapidamente ou até poderia não ter cá chegado. É certo que a pneumónica também se disseminou velozmente, mas essa ocorreu no quadro de um acontecimento global: a 1.ª guerra mundial. Os grandes acampamentos e movimentações de tropas, os hospitais superlotados, as muito deficientes condições higiénicas contribuíram para a propagação rápida. Agora, esta foi consequência direta da nova sociedade global. Por outro lado, os media tiveram um importante papel na crise. Em Portugal, a população fechou-se em casa antes mesmo de o Governo ter determinado o confinamento. António Costa confessou que foi levado a decretá-lo porque as pessoas se anteciparam. E o pânico criado vai ter (já está a ter) consequências económicas devastadoras. Uma doença relativamente benigna, que é perigosa sobretudo para a população com mais de 80 anos (40% dos óbitos foram em lares), vai provocar rombos económicos (e psicológicos) que se prolongarão por muitos anos e causarão graves problemas sociais no futuro. Alguns governantes que tentaram desvalorizar o mal, como Trump, Bolsonaro ou Johnson, foram arrasados. Em Portugal, o número de óbitos em 2020 foi um pouco acima da média, mas está longe de ter sido assustador: cerca de 116 mil mortes, contra 111 mil no ano anterior e 113 mil em 2018. Há uma nítida desproporção entre o aumento da mortalidade e as consequências económicas que resultarão da pandemia. E a história ainda não chegou ao fim…

 

Donald Trump

Donald Trump, candidato derrotado nas eleições americanas, foi para mim a 2ª figura do ano. E também aqui se criou uma realidade virtual. Com raras exceções, os media não só nos EUA como em todo o mundo tomaram Trump de ponta e bombardearam constantemente o espaço público com notícias negativas. As fake news passaram a ser propriedade da esquerda. Trump foi acusado por Biden de ser responsável pela morte de 200 mil americanos por covid, o que é extraordinário: em países onde a mortalidade foi percentualmente muito superior, como a Itália, Espanha, Reino Unido ou França, ninguém responsabilizou os governantes pelas mortes; com a agravante de não ser Trump mas os governadores que determinavam em cada estado as medidas sanitárias. Em Portugal, com a mortalidade que houve até hoje, se a população fosse igual à dos EUA, teríamos cerca de 260 mil mortos – e ninguém se lembra de acusar António Costa por isso. A derrota eleitoral de Trump também é muito duvidosa, por três razões objetivas: 1 – houve um número de votantes absolutamente anormal (155 milhões, muito acima das eleições anteriores, que oscilavam entre os 127 e os 129), levantando suspeitas de uma ‘chapelada’; 2 – quase 80% dos votos por correspondência (os que permitiam fraudes) foram em Biden, invertendo em estados decisivos os resultados que se verificaram nas urnas; 3 – nunca um Presidente que aumentou a sua votação das primeiras para as segundas eleições foi derrotado (Trump subiu dos 66 milhões de votos para os 74 milhões). Há quem diga que, para ‘correr’ com Trump, todos os métodos seriam bons. Só que isso põe frontalmente em causa a democracia.  As últimas eleições nos EUA tinham sido contestadas pela ‘interferência russa’, estas ficarão manchadas pelas suspeitas de fraude.

 

André Ventura

A 3.ª  figura do ano foi André Ventura. Um verdadeiro furacão. É o maior fenómeno da política portuguesa dos últimos dez ou vinte anos. O aparecimento do Chega representou uma pedrada no charco e foi bom para a democracia, porque reequilibrou um sistema político que estava demasiado inclinado para a esquerda. E deu voz a um eleitorado que não tinha quem o representasse. Não foi Ventura que, com o seu ‘populismo’, inventou um eleitorado que não existia. Sucedeu o contrário: ele é o porta-voz de um conjunto de eleitores que não tinha em quem votar. Se não fosse assim, não teria subido tão rapidamente nas intenções de voto. Além disso, é bom que alguém expresse o descontentamento com o sistema. É bom que esse descontentamento seja medido eleitoralmente, tenha expressão, em vez de se traduzir no doentio aumento da abstenção. Muito atacado pela esquerda e pela direita bem-pensante, a realidade mostra inquestionavelmente que o Chega era um partido ‘necessário’. Inversamente, o CDS mostrou ser dispensável. Para que serve o CDS? Em que se diferencia do PSD? Mesmo nas causas fraturantes, não se vê diferença. Ventura veio mostrar ao CDS o que ele devia ter feito: assumir corajosamente a opinião de uma direita órfã. A política vive de coragem, da capacidade de fazer ruturas; ora, André Ventura teve-a, o CDS não. O melhor que os dirigentes do CDS têm a fazer agora é inscreverem-se uns no PSD e outros emigrarem para o Chega. E fecharem a porta.

 

Cristina Ferreira

Cristina Ferreira foi a grande protagonista no mundo das televisões e, mais geralmente, do entertainment. A ‘saloia da Malveira’ transformou-se em ‘rainha da TV’. A sua transferência da TVI para a SIC, há dois anos, tinha sido um grande facto mediático e levou a estação de Paço de Arcos a recuperar a liderança das audiências perdida há muito. Mas o ADN da SIC não era o de Cristina, pelo que esta foi sempre uma intrusa em Paço de Arcos. É certo que conseguiu o objetivo. Mas quando, inchada pelo sucesso, quis ser mais alguma coisa, quis começar a mandar, a SIC reagiu – e ela regressou à sua casa natural, a TVI. Chegou com ‘o rei (a rainha) na barriga’, mudou programas, despediu pessoas, contratou outras, tornou-se acionista. Julgou-se dona e senhora das audiências e pensou que podia levá-las para onde quer que fosse. Mas o povo deu-lhe uma lição, mostrando que tudo tem limites. A própria Cristina tem limites. Como apresentadora estava bem, como diretora, administradora, produtora, e, no fundo, patroa, atingiu o princípio de Peter.

 

Jorge Jesus

A 5.ª figura do ano que escolhi foi Jorge Jesus, o treinador português mais em destaque. Há dois anos e meio tinha saído do país cabisbaixo, depois de terríveis acontecimentos que abalaram o Sporting. Rumou à Arábia Saudita, país a que nunca se adaptou. Foi depois para o Brasil, onde atingiu os píncaros: ganhou tudo o que havia para ganhar, com uma equipa — o Flamengo — que não ganhava nada há muitos anos, só perdendo o título mundial de clubes para o poderoso Liverpool e mesmo assim pela diferença mínima. Ganhou o cetro de ‘mais carismático treinador português’, ultrapassando em popularidade Mourinho (que tem um palmarés muito superior). Tornou-se ‘o desejado’ de Luís Filipe Vieira para trunfo eleitoral,  e foi visto como o único treinador que poderia levar o Benfica a reconquistar a hegemonia ao FC Porto. Se tinha deixado Portugal pela porta pequena, regressou pela porta grande. A sua chegada ao aeroporto de Tires foi transmitida em direto pelas televisões. Todos o veneraram, mesmo os que antes o execravam. Mas, como aconteceu com Cristina Ferreira, os primeiros resultados foram dececionantes. Jesus dizia que ia pôr os jogadores a jogar o triplo, e pô-los a jogar metade. Veremos se recupera a chama. Caso contrário, arrisca-se a ser despedido, o que seria uma enorme humilhação. Mas já aconteceu aos melhores….