Campanha reduzida aos debates televisivos

Com a pandemia da covid-19, os duelos televisivos tornaram-se o centro nevrálgico da campanha. A dúvida é a de saber se terão efeito para combater a abstenção e mobilizar votantes num ato eleitoral atípico e com vencedor antecipado.

A campanha presidencial mais visível tem sido feita, sobretudo, com os debates televisivos. São vinte e sete, ao todo. E quanto valem os duelos televisivos, sobretudo em tempos de pandemia da covid-19? São importantes. Sim. Mas há senão: com  a pandemia e numas eleições que são consideradas poucos competitivas, uma vez que há um vencedor antecipado, este espaço de antena dos candidatos não vai propriamente combater a abstenção.

«Apesar de serem importantes, não vão revolucionar as taxas de abstenção que se esperam nem sequer a importância relativa destas eleições», afirmou ao Nascer do SOL o politólogo António Costa Pinto. Para o investigador coordenador do Instituto de Ciências Sociais,  «os debates televisivos, mesmo antes da pandemia, já eram importantes» pelo destaque na comunicação social. «Os portugueses  informam-se de política, sobretudo, nos meios de comunicação e fundamentalmente na televisão» , salienta Costa Pinto, sublinhando que a mobilização eleitoral, por norma, em Portugal, tem dois elementos: o lado televisivo e o chamado aparelho do partido. Ora, mesmo em eleições presidenciais, onde as candidaturas são unipessoais, os partidos continuam a fazer «a mobilização política das candidaturas». Porém, este segundo elemento de mobilização eleitoral está «coartado devido à pandemia». Ou seja, neste momento, «os debates televisões e as televisões são o elemento mais importante», sustenta António Costa Pinto. 

Olhando para os candidatos, a análise deve ter em conta os seus objetivos eleitorais. E os debates servem para isso mesmo: mobilizar ou segurar eleitorado.  Mas cada candidato tem metas muito particulares.  Para António Costa Pinto,  «no caso de André Ventura, o seu objetivo é colocar o seu partido e ele próprio em ascensão nas intenções de votos para as eleições legislativas. O mesmo acontece com Marisa Matias e João Ferreira que são candidatos de manutenção de um partido. 

A única dúvida vai para Ana Gomes, a ex-eurodeputada socialista, que não tem o apoio oficial do seu partido. «Como acontece muitas vezes em candidaturas próximas dos grandes partidos, quer do PSD, quer do PS, alguns notáveis dos partido podem pensar em criar correntes de opinião, ou qualquer outro tipo de organização. Logo se vê a seguir o que é que Ana Gomes quererá fazer com os seus votos», concluiu Costa Pinto.

Quanto à abstenção, o politólogo não tem dúvidas de que será elevada: «Estamos a falar de eleições em que um presidente se recandidata e tem, em princípio, [e segundo as sondagens] um vencedor à partida, como tem sido o caso na democracia portuguesa».

Por seu turno,  o politólogo Carlos Jalali realça ao Nascer do SOL que «as campanhas contemporâneas já não são campanhas de rua» mesmo antes da pandemia da covid-19. E, como os candidatos têm menores oportunidades de visibilidade mediática em ações de rua por causa da crise sanitária, «os debates acabam por gerar um momento televisão  que é importante num contexto  em que as outras formas de ter tempo televisivo são menores».  Assim, os duelos televisivos «ganham importância adicional». Neste quadro , «o interessante vai ser ver até que ponto pode influenciar e ajudar os candidatos a mobilizar os seus eleitores», advoga o também docente da Universidade de Aveiro, argumentando, tal como Costa Pinto, o duplo efeito dissuasor destas eleições: um recandidato, à partida, vencedor e o risco da pandemia.