Brasões. Petição contra ‘atentado histórico’

António Barreto, Bagão Félix, Fernando Rosa ou Carmona Rodrigues são alguns dos signatários da petição ‘Contra o Apagamento dos Brasões da Praça do Império’, que conta já com milhares de assinaturas.

Em agosto de 2014, a Câmara Municipal de Lisboa decidiu levar a concurso a reabilitação da Praça do Império, em frente ao Mosteiro dos Jerónimos, «excluindo dessa intervenção alguns brasões por, alegadamente, serem ‘símbolos do colonialismo’», pôde ler-se na moção apresentada na altura. Durante os seis anos que entretanto passaram foram inúmeras as críticas que choveram após ter sido tomada esta decisão, sendo que, agora, com as obras finalmente prestes a arrancar, está em curso uma petição ‘Contra o Apagamento dos Brasões da Praça do Império’, que conta já com mais de cinco mil assinaturas – número que, aliás, cresce de dia para dia.

Contactado pelo Nascer do SOL, um dos promotores da petição, Rafael Pinto Borges, presidente da Nova Portugalidade, explicou o que motivou a avançar com a petição:  «Uma indignação patriótica perante o que sabemos ser a destruição de património material e simbolicamente insubstituível por mero fanatismo ideológico do vereador e ex-candidato do Bloco de Esquerda à CML [Câmara Municipal de Lisboa] José Sá Fernandes»

Para a Câmara de Lisboa, entre os motivos para a remoção dos 30 brasões floridos estão, por um lado, os elevados custos de manutenção (24 mil euros anuais) e, por outro, o facto de serem «ultrapassados»  e de, no entendimento da vereação,  não fazer «sentido mantê-los». No entanto, para os signatários da petição, nenhuma das razões invocadas é válida, sendo que, relativamente à primeira (custos de manutenção), em 2017 «a Junta de Belém dispôs-se publicamente a fazer a manutenção dos canteiros», afirma Rafael Pinto Borges.

O presidente da Junta de Freguesia de Belém, Fernando Ribeiro Rosa, confirmou ao Nascer do SOL a intenção de assegurar a manutenção dos brasões nos canteiros e acrescentou que, caso isso não aconteça, já pediu à «arquiteta paisagista que ganhou o concurso da Câmara, Cristina Castelo Branco», para ver «se é possível que os brasões fiquem pelo menos na pedra da calçada para memória futura», visto que «os arquitetos têm sempre a última palavra». Fernando Ribeiro Rosa afirma ainda que sente que «há quem queira, à maneira talibã, cortar toda a nossa história» – referindo-se ao presidente Fernando Medina e ao vereador Sá Fernandes, por serem «os principais executantes deste atentado ao património». Foi por isso mesmo que, quando foi contactado pela Nova Portugalidade para ser um dos signatários da petição, o presidente da Junta de Freguesia de Belém o fez «com todo o gosto»

Além de Fernando Ribeiro Rosa, entre os subscritores estão António Barreto, António Bagão Félix, António Carmona Rodrigues, Dom Duarte Pio de Bragança, Luís Newton, Luís Cagliardini Graça e muitas outras personalidades.
Rafael Pinto Borges diz que as obras têm por base uma escolha extremista e acredita que, sendo este ano de eleições autárquicas, é tempo de «o Dr. Fernando Medina escolher o que quer representar: se uma esquerda moderada, tolerante, urbana e culta, que protege o património e aceita a História, ou o testa-de-ferro de uma ultra-esquerda ressentida, totalitária, sectária e radical».

A reabilitação
Foi no final de Agosto de 2014 que a Câmara de Lisboa anunciou a reabilitação dos em tempos luxuosos e bem cuidados Jardins da Praça do Império, ladeados pelo Mosteiro dos Jerónimos e pelo Centro Cultural de Belém. A intervenção não se destina especificamente à retirada dos brasões, mas ela está contemplada no plano. Na altura, numa nota emitida pela autarquia, podia ler-se que não se iriam «despender recursos financeiros a recuperar os brasões criados pelo Estado Novo das antigas colónias portuguesas e que há muito não existem, nem sequer como arranjos florais no local».

Ainda em Setembro desse ano, a Junta de Freguesia de Belém, que se propôs cobrir os custos de manutenção do jardim para que os brasões se mantivessem, lançou duras críticas à proposta, tendo inclusivamente o tesoureiro do organismo, João Carvalhosa, caracterizado a remodelação como um «atentado cultural». O mesmo salientou em Assembleia Municipal que os jardins da Praça do Império «não são armas ideológicas ou revisionistas», mas sim «património cultural de todo um povo». Para o deputado municipal do PSD, «querer alterar os símbolos ali existentes para colocar outros mais adaptados ideologicamente é uma agressão intolerável ao património cultural».

Em 2016, a questão voltou a público quando a CML discutiu a aprovação do relatório final do júri do concurso de «Concepção para a Elaboração do Projeto de Renovação do Jardim da Praça do Império» e a presidente do júri que avaliou as várias propostas, Simonetta Luz Afonso, admitiu que a remoção dos brasões tinha sido «a última» das preocupações do júri. A mesma afirma ainda que a maioria das críticas ao desaparecimento dos brasões se devem a «desconhecimento do projecto original».

O projeto vencedor, apresentado pelo atelier ACB Arquitectura Paisagista, tem como objetivo  «retomar o traçado de Cottinelli Telmo, recuperando o conceito original de 1940» e os valores da remodelação deveriam rondar os 499 mil euros e o processo deveria prolongar-se por 45 dias. No entanto, agora, sabe-se que os trabalhos, que ficarão a cargo da Decoverdi – Plantas e Jardins, vão durar quatro meses e com um custo a rondar os 778 mil euros, sendo que este valor já incluí a manutenção do espaço durante um ano.

Já este ano, as obras foram adjudicadas pela CML e com isso resssurgiram as críticas. Fernando Ribeiro Rosa tem sido uma das vozes mais críticas desde o início do projeto e afirmou ao Nascer do SOL que nem sabe se não há de «colocar lá um cartaz» a respeito do seu desagrado.

O Nascer do SOL tentou obter reações de Fernando Medina e de José Sá Fernandes, mas ambos não responderam até ao fecho desta edição.

A História dos Brasões

A Praça do Império foi construída em 1940 aquando da ‘Exposição do Mundo Português’ e o projeto foi assinado pelo arquiteto Cottineli Telmo. No entanto, o projeto inicial não previa a existência de brasões. Estes foram adicionados 21 anos depois, em 1961, no âmbito dos 500anos da morte do Infante Dom Henrique e da Exposição Nacional da Floricultura. As renovações previstas, anunciadas em 2014. tinham como objetivo «retomar o traçado de Cottinelli Telmo, recuperando o conceito original de 1940». As três dezenas de brasões floridos representam as armas das capitais de distrito, as ex-províncias ultramarinas e as Ordens de Aviz e de Cristo.