Médicos reformados sem resposta: “É incompetência”

Mais de 140 médicos, que se voluntariaram para ajudar o Serviço Nacional de Saúde, enviaram carta ao Governo a lembrar que podem ser úteis. Gentil Martins, de 90 anos, diz que ainda é “capaz de fazer alguma coisa”.

São 142 médicos reformados que querem ajudar, como voluntários, o Serviço Nacional de Saúde (SNS), mas dizem que o Governo nunca lhes deu oportunidade para tal. O desafio de colaborar com quem está na linha da frente no combate à covid-19 foi lançado pelo bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, no ano passado, e a lista de profissionais que se disponibilizaram para auxiliar nos hospitais em tempos de pandemia foi enviada para o Ministério da Saúde. No entanto, nada aconteceu, dizem. Agora enviaram uma carta à ministra da Saúde, Marta Temido, a lamentar o facto de nunca lhes ter sido dada sequer uma resposta. Ao i, o médico reformado Gentil Martins, de 90 anos, primeiro signatário da carta enviada, aponta o dedo ao Governo e garante que se trata de “incompetência pura”.

“Não vejo outra explicação lógica para a ausência de resposta. Ainda por cima há falta de médicos. Importam médicos alemães e têm aqui mais de 140 médicos voluntários para ajudar. E não temos resposta?. Está tudo parvo?”, questionou, deixando claro que a idade não deve ser entrave para ninguém.

“Podia ter 90 anos maus, mas tenho 90 anos bons. Ainda sou capaz de fazer alguma coisa. Se fossem competentes e responsáveis mandavam-nos resposta nem que fosse a acusar a receção. Agora, esquecer completamente não se faz. Façam um sistema de saúde que sirva as pessoas”, atirou Gentil Martins.

Além disso, o médico defende ainda que, neste caso, o que deveria ter sido feito era aproveitar estes profissionais de saúde e ajustá-los àquilo que ainda conseguem fazer.

“O Governo só tem de programar onde é que a pessoa é útil. Eu não sirvo como cirurgião, mas tenho a certeza de que posso ser um bom ajudante. Posso ajudar perfeitamente bem numa cirurgia, porque estou bem. Com certeza que muitos colegas meus, mais novos, estão capazes de fazer aquilo que faziam antes. O fundamental é que a pessoa ajude naquilo que conseguir ajudar. As coisas de maior responsabilidade, talvez não, mas as outras sim”, sublinhou, adiantando também que, quando se reformou, a idade da reforma era aos 70 anos e agora é aos 66. “Entre os 66 e os 70 há quatro anos. Antes, essas pessoas eram válidas; agora, já não são e não servem para nada”, rematou.

Em reação ao facto de não ter sido dada resposta a estes médicos, Marta Temido admitiu ontem, em conferência de imprensa, que “todos os profissionais são bem-vindos” e que, apesar de tudo, vai dar o encaminhamento necessário. “Recebi hoje [ontem] essa carta e irei encaminhá-la, como já fiz anteriormente noutras situações, para os prestadores de saúde. Os empregadores são os prestadores de saúde, não é o Ministério da Saúde”, explicou.

 

Vacinação para profissionais de saúde

No que diz respeito à vacinação contra a covid-19 em Portugal, Gentil Martins critica a forma como o plano está a ser feito, dizendo que não está a ser cumprido e reforçando o facto de os profissionais de saúde terem de ser, no seu ponto de vista, prioritários na toma da vacina.

“Se os médicos não forem vacinados, não tratam os doentes. As pessoas precisam de médicos saudáveis. Não é uma questão de egoísmo, é uma questão de necessidade. Se o médico estiver doente, como é que as trata? A primeira coisa que devemos ter são médicos e enfermeiros saudáveis. Todo o pessoal da saúde tem de ser saudável”, concluiu.