Impunes

Praticamente todos os governos que se têm sucedido nas últimas quatro décadas têm um factor em comum: o estarem pejados de gente inqualificável para as altas funções que lhes ofereceram, tanto ao nível de conhecimentos técnicos credíveis para tutelarem as áreas de que são responsáveis, como também pela ausência de preceitos morais que os tornem…

No entanto, o presente governo bate todos os recordes. Nunca um executivo saído desta partidocracia com quase meio século de existência teve tantos ministros incompetentes, incultos e vazios do mínimo sentido ético.

Nunca um governo foi tão mau como este, com tantos desastres de governação acumulados e dos quais resultaram demasiadas perdas de vidas humanas.

A dificuldade não está em seleccionar os piores ministros, mas sim em encontrar um que se destaque acima da mediocridade!

Mas, ao contrário do que foi prática comum no passado, provocada por uma insistente opinião publicada que não baixava os braços enquanto não fosse agraciada com notícias de demissões, para este governo a culpa morre solteira e os seus ministros, por mais disparates que protagonizem, são sempre recompensados com o apoio incondicional do homem do leme.

O rol de incapazes que continuam ministros é extenso, destacando-se, entre estes, a ministra da saúde, atendendo a que a gestão danosa do sistema de saúde pública está na origem de um número indeterminado de mortes inúteis, porque poderiam ter sido evitadas se a senhora em questão tivesse posto a vida humana acima da ideologia que professa.

Obviamente que as notórias falhas do SNS, que têm provocado o caos nos hospitais públicos, não podem ser imputadas, em exclusivo, à actual detentora da pasta, porque os erros vêm do passado.

Mas também não é menos verdade que a gestão da pandemia causada pelo vírus chinês tem sido desastrosa e essa, sim, é da inteira responsabilidade da ministra em funções.

Se em Março do ano passado se estava perante uma ameaça desconhecida, pelo que serão desculpáveis as omissões de medidas adequadas para a enfrentar, no tempo actual, em pleno período invernoso, era mais do que sabido, desde há muitos meses, que os hospitais, e em particular os serviços de urgência e de cuidados intensivos, iriam rebentar pelas costuras.

No entanto, a ministra cruzou os braços e nada fez! E só agora, depois de milhares de mortes, em que muitas delas poderiam ter sido poupadas se tivesse havido uma resposta atempada à previsível saturação da capacidade de internamentos hospitalares, é que se predispôs a recorrer à ajuda dos hospitais privados, a aceitar auxílio externo e, pasme-se, a abrir um hospital de campanha no Campo Grande, o qual veio aliviar, e muito, a situação aflitiva que se vivia na zona de Lisboa.

Temos depois o ministro da educação. Logo quando o primeiro confinamento impôs o ensino a distância, substituindo as aulas presenciais nas escolas, prometeu o que sabia não poder cumprir, ou seja, computadores para todos os alunos, ferramenta indispensável para que estes possam estudar a partir de casa.

Promessa a que o próprio primeiro-ministro se vinculou e que, obviamente, ficou na gaveta.

Como resultado, com um segundo confinamento ordenou o encerramento das escolas e, uma vez que os tais computadores nunca chegaram às mãos de quem deles necessita, determinou férias escolares para toda a gente, com a proibição do recurso a aulas online, medida restritiva essa que estendeu ao ensino privado, alegando querer preservar a igualdade entre os alunos das escolas públicas e os que estudam em colégios privados.

Quando se viu apertado com a sua decisão, veio a terreiro mentir com todas as letras, jurando não ter emitido essa directiva, mentira essa em que voltou a envolver o primeiro-ministro, que nos procurou também convencer de que o seu ministro não disse aquilo que todos ouviram.

Ministro que mente, sobretudo numa matéria de superior importância, só mesmo em Portugal é que se mantém no governo.

Do ministro da administração interna, já se perdeu a conta das trapalhadas de que tem sido protagonista.

Mas há pelo menos uma que, no mínimo, deveria ter conduzido ao seu irreversível afastamento: o caso do ucraniano morto no aeroporto.

O ministro descartou-se das suas responsabilidades e, impávido e sereno, assentiu que estas fossem endereçadas por inteiro à directora do SEF, levando-a à demissão, branqueando-se, dessa forma, o pesado silêncio e a apatia ministerial que se prolongou durante nove meses.

Nos últimos dias também o ministro da economia resolveu dar um ar da sua graça, aproveitando uma entrevista ao The New York Times para culpar os portugueses pelo agravamento da situação pandémica.

Disse ele, e passo a citar: "as evidências da mobilidade no país mostram que os portugueses não respeitaram as restrições no período das férias do Natal”.

Mais uma tremenda falsidade saída da boca de um ministro. Não houve restrições nenhumas no Natal, porque o governo, sob o alto patrocínio de Belém e de todos os partidos, entendeu por bem que tais restrições não se justificavam!

Um ministro que, em uma entrevista a um jornal estrangeiro, por sinal um dos mais lidos no mundo inteiro, lança acusações caluniosas sobre o seu próprio povo, só poderia ter sido demitido, e de imediato. Mas não, também ele negou ter dito aquilo que todos lemos e recebeu toda a cobertura, para o efeito, do seu chefe.

É, na verdade, difícil de entender as razões pelas quais estes ministros continuam em funções, sem que dos seus actos gravosos não tenha havido qualquer responsabilização política. A impunidade é a imagem de marca deste governo!

No entanto, bem mais grave, por se ter tratado não de uma conduta de negligência, mas sim de autêntica fraude, é o caso da titular da pasta da justiça.

A escolha, para a Procuradoria Europeia, de um magistrado que não foi o seleccionado pelo comité de peritos europeus, ignorando-se, assim, a candidata vencedora, apenas veio provar o que já todos há muito sabemos, que em Portugal os concursos públicos não passam de uma miragem e de uma farsa, porque as nomeações para cargos sob a alçada do Estado assentam em critérios de amiguismo e de compadrio, e não na qualificação técnica e na moral dos escolhidos.

Mas, para que o governo pudesse contornar o entrave colocado pela exclusão do seu candidato, com ligações familiares directas a duas figuras envolvidas em escândalos dos quais o PS não se livra, nomeadamente trafulhices da era socratista, houve que falsificar o seu currículo, condição indispensável para que o seu nome fosse imposto ao Conselho Europeu.

Atribui-se, assim, uma categoria profissional que ele ainda não atingiu, assinalando-o como procurador-geral adjunto, uma das premissas obrigatórias para o exercício do lugar em causa, em vez de procurador da República, posto que de facto desempenha.

Foi igualmente necessário conferir-lhe um registo de actividade falso, mencionando-o como sendo o autor da investigação a uma fraude relacionada com fundos europeus, também condição imperiosa para o referido cargo, no caso concreto num processo que envolveu a UGT, quando, na verdade, somente teve uma breve passagem pelo caso e já em fase de julgamento.

O governo, através da ministra da justiça, mentiu descaradamente ao Conselho Europeu, pondo em causa, perante os nossos pares europeus, o bom-nome dos portugueses e a todos nos envergonhando.

Todavia, mais do que mentir, orquestrou uma fraude que possibilitou a aceitação do candidato do regime na Procuradoria Europeia.

Uma vez descoberto o embuste, a ministra não teve a dignidade de assumir a responsabilidade de um acto que apenas a ela pode ser imputado, procurando, primeiro, remetê-la a um seu subordinado, forçado a demitir-se, e depois alegando que se trataram de dois lapsos sem importância.

Antes tivesse ficado calada! Os lapsos sem importância permitiram que o seu amigo procurador transpusesse a inexistência das condições obrigatórias para um tacho nas instâncias europeias, extremamente bem remunerado, com natural prejuízo para quem preenchia esses requisitos e se viu, assim, afastado de um cargo que lhe era merecido.

Em qualquer País onde a honra é um mandamento imperioso para quem exerce funções governativas, esta ministra teria sido imediatamente despedida e presente em Tribunal para responder por um crime de fraude.

Mas a honra, em Portugal, entre quem se passeia no topo dos órgãos do Estado, há muito que desapareceu. Estamos entregues a gentes menores, para quem a ética é coisa do passado!

Longe vão os tempos em que as catarinas e os jerónimos vinham para as ruas exigir a demissão de governantes por tudo e por nada. E, em quase todos os casos, por razões bem menos gravosas dos que estas aqui relatadas.

Longe vão os tempos em que a imprensa, escrita e falada, não se cansava, meses a fio, de bombardear sem descanso determinados membros do governo, até conseguir obter a demissão destes.

Contudo, nessa altura, não havia quinze milhões de euros para comprar o silêncio de grande parte dos jornalistas desta praça!

Pedro Ochôa