Regras são regras

por Pedro Ramos

Nova Iorque, fevereiro 2021

Queridas Filhas,

A força do sistema legal da região onde se vai investir é fundamental para os resultados de qualquer investimento.

Um investimento implica uma injeção de recursos económicos hoje para se obter proveitos ou ativos numa data futura. Esta expectativa está protegida por leis e contratos. Várias coisas podem correr mal entre o momento do investimento e o momento de colheita:

a. Falta de proteção dos direitos de propriedade privada (através por exemplo de nacionalização, expropriação ou cópia ilegal)

b. Dificuldade em proteger os direitos em tribunal devido ao atraso e /ou imprevisibilidade na resolução dos processos

c. Nível de corrupção que cria uma diferença substancial entre os direitos conforme estão escritos e a sua aplicação na prática

d. Desigualdade na aplicação da lei, havendo tratamento preferencial de uns (através de benefícios fiscais ou regulamentação especial) em relação a outros

Na decisão de onde investir o capital, em casos de igualdade de oportunidade um investidor prefere investir na região com uma maior força do estado de direito (’rule of law’). Dito de outra forma, para investir em regiões com menor ‘rule of law’ o investidor exige um maior lucro esperado dos projetos. Isto aumenta o custo de capital e reduz o nível de investimento em regiões com estados de direito mais fracos.

Como está Portugal em termos de Estado de Direito? Podia estar melhor… Na tabela 1 vemos que apesar de estar à frente de algumas economias do leste europeu, esta bem atrás dos seus vizinhos da Europa Ocidental.

Em termos de Estado de Direito quanto mais forte este é, melhor. Leis claras, aplicadas de forma equitativa, com os tribunais a fazerem-nas cumprir de forma expedita e clara. Isto é terreno fértil para inovadores e investidores.

O mesmo raciocínio não pode ser feito em relação à regulação. Aqui temos boa regulação e má regulação. Temos regulação insuficiente e, de forma mais comum, regulação excessiva.

Regulação é um conjunto de regras e procedimentos impostos por uma entidade reguladora para um setor de atividade específico. O seu objetivo é manter o funcionamento normal da atividade e a proteção dos agentes mais vulneráveis, em geral os consumidores. As entidades reguladoras não são eleitas e em geral têm relativa liberdade em emitir novas regulações sem necessidade de aprovação do publico ou agentes económicos.

A regulação nasce com um princípio nobre: limitar os preços cobrados aos consumidores por monopólios naturais, garantir serviço universal, proteger o ambiente, entre outros.

Ao longo do tempo, a natureza humana leva o número e escopo da regulação a metastatizar para âmbitos bem mais largos dos inicialmente pretendidos. Como disse o investidor Warren Buffett: «Não perguntes ao barbeiro se precisas de um corte do cabelo…». Muitos reguladores querem aumentar o número e impacto da regulação para aumentar o seu poder, o seu staff e o seu orçamento.

Contudo, a regulação excessiva corta a energia inovadora dos empreendedores. Com asas cortadas, têm menos hipóteses e incentivos para inovar e investir. E a sociedade ressente-se disso. Como investidor, a entrada de um regulador com ambições desmesuradas tem sido um bom indicador para vender e realocar os meus recursos onde a oportunidade para a inovação e crescimento são melhores.

A regulação excessiva impõe também um custo forte na sociedade. O exemplo mais simples está na nossa cidade. Durante muitas décadas o prédio mais alto foi o Empire State Building. Construído em 1930 demorou pouco mais de um ano a ser concluído.

A Freedom Tower tornou-se o prédio mais alto em 2014. Contudo, esta torre demorou 8 anos e meio a ser construída! Porquê? Temos agora melhores ferramentas, equipamentos e computadores!

Muitas explicações serão dadas, mas a regulação forte do setor feita em conjunção com os sindicatos é a principal diferença. Valeu a pena? Se medirmos o número de vidas perdidas na construção das duas torres parece que não. Os números são semelhantes (ver tabela 2).

Como investidores, devemos privilegiar regiões com leis e tribunais fortes e equitativos. E com regulação inteligente e ligeira. Os nossos retornos beneficiam disso, e as suas populações também.

Tabela 1

Tabela 2