Luz verde para reabrir em todas as regiões. “Vamos ter de guiar bem o automóvel”

Desconfinamento começa na segunda-feira com abertura das creches e regresso à escola dos alunos do 1.º ciclo. Hipótese de estudantes e professores virem a receber testes para fazer em casa como no Reino Unido não está excluída. Tudo será regulamentado na próxima semana.

Segunda-feira é dia de recomeço: na abertura no país, no regresso às escolas dos alunos mais novos e numa nova oportunidade para manter a epidemia controlada sem a ‘bomba atómica’ do confinamento. Desta vez, as linhas vermelhas estão traçadas à partida. Foram propostas pelos especialistas ouvidos na reunião no Infarmed e, com alguns acertos, assumidas pelo Governo. António Costa avisou que as medidas da reabertura serão revistas sempre que Portugal ultrapassar os «120 novos casos por dia por 100 mil habitantes a 14 dias» ou sempre que o índice de transmissibilidade ultrapasse o 1. Linha de risco máximo: 240 casos por 100 mil habitantes.

No final do ano passado, considerou-se que um concelho estava em risco máximo quando passava os 960 e o país chegou a um recorde de mais de 1600 casos por 100 mil habitantes no pico da epidemia, com Lisboa a passar os 2000 casos por 100 mil habitantes a 14 dias. Os cuidados intensivos atingiram níveis críticos e morreram quase 10 mil pessoas desde o início do ano com covid-19. Se a nova linha vermelha tivesse sido aplicada no ano passado, a partir do início de outubro as medidas teriam sido mais duras. E quando o país aliviou restrições no Natal a incidência a 14 dias passava os 500 casos por 100 mil habitantes, o dobro do que agora se estabelece como linha vermelha.

 

Luz verde em todas as regiões

Esta sexta-feira atingiu-se um novo marco, que dá a folga para o país reabrir em todas as regiões dentro dos indicadores assumidos pelo Governo. O Instituto Ricardo Jorge publicou o relatório semanal com o cálculo de incidência a 14 dias, mas a informação dizia respeito ao que se passava a 7 de março e Lisboa, onde os diagnósticos continuaram a baixar esta semana, também já não está com mais de 120 casos por 100 mil habitantes. A incidência a nível nacional situa-se agora nos 100,8 casos por 100 mil habitantes a 14 dias, o que já não acontecia desde o final de setembro. E na realidade é ainda mais baixa, dado que nas últimas duas semanas foram inseridos no sistema de vigilância cerca de mil casos antigos da região da Madeira. O Nascer do SOL procurou perceber várias vezes durante a semana por que motivo se incluem estes dados nos boletins atuais, numa altura em que este é um indicador usado para monitorizar o desconfinamento. Sem resposta, o facto é que puxam para cima a incidência a nível nacional.

O país está na realidade a começar a desconfinar com uma incidência cumulativa a 14 dias 91 casos por 100 mil habitantes, 36 a 7 dias. Lisboa é a região com a incidência mais elevada mas agora abaixo de 120 casos por 100 mil habitantes. O relatório semanal do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, que alertou para a questão da Madeira, passou a incluir o cálculo da incidência, mas os dados apresentados que levaram à conclusão no espaço público de  que Lisboa estava acima da linha vermelha traçada pelos especialistas diziam respeito a 7 de março.

Esta sexta-feira, com os dados referentes a quinta que surgem no boletim da DGS – portanto, no dia 11 de março – a incidência cumulativa a 14 dias na região de Lisboa e Vale do Tejo, continuando a ser a mais elevada no país, é agora de 116 casos por 100 mil habitantes.

As incidências atualizadas, que o Nascer do SOL calculou, mostram que o Norte vai começar a reabrir com uma incidência cumulativa a 14 dias de  68,8 casos por 100 mil habitantes, o Centro 76,9, Alentejo 68,3 e Algarve 60 casos por 100 mil habitantes. E este é o ponto de partida. O RT mantém-se abaixo de 1, mas a subir e quão longe está de passar essa fronteira não é consensual entre os especialistas. O INSA, que calcula o RT médio para períodos de cinco dias, com referência à semana anterior, apresenta como cálculo mais recente um RT de 0,8 entre 3 e 7 de março. Já a equipa da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que também está envolvida no grupo de trabalho que preparou e agora vai acompanhar o desconfinamento, calcula que atualmente já seja superior a 0.90.

Ao Nascer do SOL, o epidemiologista Manuel Carmo Gomes considera que este é um fator de preocupação e adverte que em breve o RT voltará a estar acima de 1, mas sublinha que a incidência é baixa e tudo o que acontecerá daí para a frente depende de comportamentos e da rapidez de resposta. «Com o desconfinamento vai aumentar o número de contágios», afirma. «O R tem tido uma tendência a subir e vamos desconfinar ainda mais do que desconfinámos, por isso é natural que o R passe para cima de 1. A partir daí teremos de conduzir bem o automóvel. Ou seja, vamos ter de acompanhar os indicadores que propusemos e quando um deles estiver a entrar numa zona laranja, responder rapidamente».

Em concreto, continua, «se a positividade começar a subir temos de responder com um reforço da testagem para conseguirmos apanhar o vírus e agora temos a nova variante inglesa dominante: provavelmente sobe mais depressa, ainda que possamos ter um efeito da vacinação pelo que existe alguma incerteza». Outro indicador importante, aponta, é seguir atempadamente se a percentagem de rastreios de contactos que demoram mais de 24 horas a ser feitos não aumenta. «Propusemos que isso não pode acontecer com mais de 10% dos inquéritos, mas o que já verificámos foi que quando isso acontece começam a aumentar os atrasos rapidamente. Portanto se for detetado que a percentagem a subir, é preciso o reforço imediato dos recursos que estão a fazer rastreios.  Em resumo, temos os indicadores e sabemos o que é preciso para lhes responder».

Até aqui, a testagem não tem estado a aumentar mas esta sexta-feira uma portaria publicada em Diário da República autoriza um regime excecional e temporário para a realização em autoteste de testes rápidos de antigénio. E abre várias portas em simultâneo que até aqui estavam fechadas no país: indica que estes testes poderão ser vendidos em locais de dispensa de medicamentos sem receita, o que na prática avança com testes sem prescrição médica, e que poderão ser vendidos por exemplo nas zonas de dispensa de medicamentos sem receita dos supermercados (algo parecido com o que aconteceu na Alemanha).

Por outro lado, poderá facilitar os planos de testagem regular por exemplo nas escolas. Segundo o Nascer do SOL apurou, a hipótese de os estudantes e professores virem a receber testes para fazer em casa não está posta de lado. A regulamentação da portaria, que implicará também definir como é que as pessoas comunicam os resultados dos testes que façam sozinhas, só vai ficar fechada na próxima semana.

A portaria entra em vigor este sábado, mas o Infarmed, a DGS e o INSA têm cinco dias úteis para decidir como serão feitos os testes e o que é preciso para garantir que sejam mais uma ajuda do que um novo problema.