Aparelho do PSD afasta mulheres

No momento em que Rio aponta o dedo à falta de mulheres na política, as estruturas locais do partido abrem guerras em sentido contrário.

Em Portugal, a representatividade das mulheres nas diferentes autarquias é muito baixa, tendo sido eleitas, em 2017, apenas 32 mulheres para o cargo de presidente da câmara, num universo de 308 autarquias. O PSD, através do Instituto Sá Carneiro, foi o partido que mais iniciativas promoveu no fim de semana e na segunda-feira passados para assinalar o Dia Internacional da Mulher, organizando uma Academia para formação política das mulheres sociais-democratas no sábado e uma conferência com mulheres autarcas eleitas nas listas sociais-democratas no próprio Dia Internacional da Mulher, segunda-feira. Na 5.ª Academia de Formação Política para Mulheres do PSD, Rui Rio, presidente do partido, fechou o evento com um discurso em que lamentou que o partido não tenha mais mulheres candidatas às eleições autárquicas de outubro próximo, justificando ainda  que tal resulta da falta de disponibilidade de mulheres para concorrer.

Estão «claramente subrepresentadas na vida pública e na vida política», concluiu Rio, que disse querer ter mais representatividade feminina nas suas listas e dar-lhes destaque na vida política. 

No entanto, se em Alvaiázere a presidente da Câmara social-democrata não se recandidata porque decidiu tomar conta da empresa da família, em Vila Real de Santo António e em Ponta Delgada são as estruturas locais do partido que boicotaram as recandidaturas das atuais presidentes de câmara, segundo apurou o Nascer do SOL. Isto para não falar do facto de, na lista de candidatos sociais-democratas lançada recentemente, surgirem apenas três mulheres entre os 100 nomes anunciados.

Conceição Cabrita, presidente da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António, foi eleita pelas cores do PSD em 2017. A autarca não foi nomeada para recandidatura, apesar de ter levado a cabo um mandato que, entre outros feitos, reduziu a dívida da autarquia em 20 milhões de euros. As vozes da estrutura local, apoiada pelo presidente da distrital, David Santos, apontam, porém, para a um regresso ao passado: Luís Filipe Gomes, que presidiu a autarquia entre 2013 e 2017, surge agora como o candidato social-democrata à Câmara algarvia. Gomes – antigo presidente da distrital de Faro do PSD que trocou a Câmara, por ter atingido o limite de mandatos, e pela música – quer voltar aos comandos da autarquia e conta com a maioria dos apoios tanto na concelhia como na distrital, e mesmo na direção nacional do partido, o que terá levado a atual presidente a anunciar a não recandidatura, para evitar o afastamento forçado pelo partido.
Conceição Cabrita – a quem Rui Rio nunca deu resposta ao pedido de reunião que a autarca lhe enviou em setembro passado – anunciou através de um post nas redes sociais que não será recandidata. «Sinto no mais fundo de mim que não é o momento de baixar os braços mas é o momento de estar presente na vida dos outros e, acima de tudo, na minha vida», confessou. O Nascer do SOL tentou contactar a presidente de câmara, mas não conseguiu.

Fonte social-democrata reconheceu ao Nascer do SOL que o caso é paradigmático do peso do aparelho e da discriminação das mulheres. Tal como acontece também com Maria José Lemos Duarte, em Ponta Delgada, onde as estruturas locais estão a tentar boicotar a candidatura da atual presidente, que ascendeu ao cargo em regime de substituição. O Nascer do SOL também não conseguiu contactar a presidente daquela Câmara açoreana.

Apesar de uma aparente vontade de Rui Rio em trazer mulheres para a política e de as levar às autarquias, a realidade é que, pelo menos na sua lista de candidatos para 2021, são poucas as que delas fazem parte, e as lutas de poder nas diferentes estruturas locais não parecem ajudar a cumprir esta vontade.

Em delcarações ao Nascer do SOL, o responsável pela coordenação do processo autárquico e secretário-geral do PSD, José Silvano, desvalorizou as querelas internas e disse desconhecer se a presidente da Câmara de Ponta Delgada será ou não candidata – remetendo para a autonomia PSD-Açores. E disse desconhecer quaisquer pressões para a não recandidatura da presidente da Câmara de Vila Real de Santo António, que equiparou à de Alvaiázere.