Paris. As luzes da cidade-Luz

Se pensarmos que o Paris Saint-Germain tem apenas 50 anos de existência, entendemos algo da distância entre a cidade e o futebol.

Hoje em dia não é possível falar de Paris sem falar do Paris Saint-Germain, mas se nos recordarmos que o clube foi apenas fundado no dia 12 de agosto de 1970 e que, portanto, ainda não cumpriu 50 anos de vida, precisamos de escavar bem mais fundo na mina da história do futebol para se entenderem os primórdios do jogo na capital da França.

Durante décadas, os parisienses como que desprezaram o futebol. Paris tinha mais que fazer. Era a capital das artes, do teatro, das folies-bergéres, das exposições que levavam centenas de pessoas ao Grand e ao Petit Palais, lugar onde se juntavam pintores e poetas, romancistas e filósofos, sedentos todos de absinto e de viver a vida até ao tutano. 

Se havia, no meio de tanta escolha, espaço para o jogo inventado pelos ingleses, era porque os próprios ingleses encontravam lugares onde pudessem pôr em prática o seu desporto favorito, tendo assim nascido, no início dos anos de 1890, o Standard AC e o The White Rovers, clubes que disputaram a primeira final do Championnat de Paris, organizado sob a égide da USFSA (Union des Sociétés Françaises de Sports Athlétiques). Meio clandestino, a verdade é que o Campeonato de Paris largou a disputa em eliminatórias na época de 1897-98 para adotar o estilo de poule, todos contra todos, algo de revolucionário para a época no que respeita ao futebol para cá da Mancha. E assim, na terceira edição da prova, já estavam nove clubes em compita: Standard AC, White-Rovers, Club français, Neuilly, Asnières, United SC, Paris Star, e a Union Athletique 1er Arrondissement. Um luxo. Embora demasiadamente ignorado.

Pós-guerras

Após o final da I Grande Guerra, houve uma forte tentativa de reorganizar o futebol parisiense e surgiram clubes mais poderosos. O Club Français agregava a grande maioria dos adeptos franceses e tinha como objetivo fazer frente ao Standart e ao White Rovers. Pelo caminho, outros fortes concorrentes foram surgindo como cogumelos: o Red Star e o Olympique de Paris, instalados a norte da cidade, e o CASG (Club Athlétique des Sports Généraux, o Stade Français e o Racing Club de France, depois conhecido como Racing de Paris, nascidos na zona de Colombes onde surgiu o estádio que albergou os Jogos Olímpicos em 1924.

O período que mediou entre as duas grandes guerras deslocou o centro do futebol francês para longe de Paris. No final dos anos 40, início dos anos 50, surgem clubes como o Nice, o Saint-Étienne, o Bordéus ou o Stade de Reims que ganham não apenas estatuto nacional como internacional. Todos eles participaram – o Stade de Reims conquistou o troféu em 1953, no Estádio Nacional, em Lisboa na Taça Latina, a competição que punha em compita os campeões de França, Espanha, Itália e Portugal, e o Stade de Reims atingiu duas finais da Taça dos Campeões Europeus, em 1956 e 1959, ambas perdidas para o Real Madrid.

O cenário alterara-se por completo. Paris e futebol já não eram duas palavras que combinassem muito bem – a despeito da primeira final dos campeões ter sido disputada no Parque dos Príncipes – e a Coupe des Champions Europeéns, criada pelo jornal L’Équipe na expectativa de conhecer um vencedor francês (nessa altura o Stade de Reims, de longe a melhor equipa francesa), só veio a ter um finalista gaulês pela primeira vez em 1976 (Saint-Étienne derrotado pelo Bayern de Munique) e um vencedor em 1993 (o Marselha que bateu o Milan na final). Aliás, essa conquista marselhesa continua a ser a única da qual os franceses se podem orgulhar ao fim de 65 edições da prova.

‘Toujours Paris’

Quando o Racing de Paris foi campeão de França na época de 1935-36, ninguém seria capaz de apostar que seria necessário esperar até 1985-86 para que outra equipa parisiense pusesse a mão no título. A proeza coube ao jovem Paris Saint-Germain, um clube nascido com o propósito de devolver a capital de França ao topo do futebol nacional.
Clubes como o Red Star ou o Racing desapareceram praticamente do mapa. Este último surgiu na I Divisão com uma aposta arriscada de parceria com a marca automobilística Matra em 1985-86. Um projeto megalómano, que meteu o treinador campeão europeu pelo FC Porto, Artur Jorge, e jogadores da categoria de Bossis, Louis Fernandez, Ginola, Pierre Litbarski, Rabah Madjer e Enzo Francescoli, mas que acabou por dar, como diz o povo, com os burrinhos na água.

Agora, nas mãos de um empresário do Qatar, Nasser Al-Khelaïfi, o Paris Saint-Germain, vencedor de sete dos últimos oito campeonatos, esgravulha no sonho mágico de vencer a Liga dos Campeões. Na época passada atingiu a final. Agora, ultrapassado o Barcelona, a chama mantém-se viva como as luzes da Cidade Luz.