Morrer com dignidade

E é nisto que o mundo se está a transformar. Numa idiotice pegada, onde os novos inquisidores vão fazendo lavagens ao cérebro, como se estivéssemos na Coreia do Norte ou algo parecido. Ou ainda no Afeganistão na parte controlada pelos talibãs, em que o Corão é ensinado de uma forma radical, para que as crianças…

Já foi há alguns anos, mas penso que se mantém atual. Numa universidade americana pediram aos alunos para desenharem um frango e a maioria desenhou-o já assado – já que não sabia como era o bicho vivo. Lembrei-me desta história a propósito de um programa que a televisão pública holandesa vai emitir à hora do jantar, em que personagens nuas vão respondendo a uma plateia de miúdos dos nove aos 12 anos.

Tudo porque muitas crianças pensam, dizem os organizadores, que o corpo humano é perfeito como os que veem nas redes sociais e que, por isso, é preciso desmistificar essa ideia. «As crianças são expostas a uma grande quantidade de anúncios todos os dias. A imagem que é apresentada é, frequentemente, manipulada e não aquilo com que um corpo se parece na vida real». Logo, escolhem-se umas personagens gordas, baixas, carecas, brancas, negras, asiáticas, e por aí fora, e os meninos vão perguntando se é bom ou mau, calculo eu, ter um corpo assim. «Existem partes do corpo de todas as formas e feitios… e ninguém deve ter vergonha delas», explicam os promotores citados pelo Observador. Não se sabe é se não vão ficar complexadas como os exemplos expostos…

E é nisto que o mundo se está a transformar. Numa idiotice pegada, onde os novos inquisidores vão fazendo lavagens ao cérebro, como se estivéssemos na Coreia do Norte ou algo parecido. Ou ainda no Afeganistão na parte controlada pelos talibãs, em que o Corão é ensinado de uma forma radical, para que as crianças peguem em armas para matarem todos os infiéis.

Na Europa, a história é outra, mas os métodos são os mesmos:_lavagens cerebrais onde todos temos que assumir que somos, os brancos, racistas; que é preciso rescrever a história e queimar os livros que não respeitam a doutrina dos novos inquisidores; que as mulheres que gostam de se vestir de forma sexy não o devem fazer; que a homossexualidade deve ser disciplina obrigatória; e que a democracia vigente só será perfeita quando se recuperar o espírito da Comuna de Paris e o povo conquistar o poder pela força das armas. A propósito dos 150 anos da conquista de Paris pelo povo, foram muitos os que surgiram a dizer que não vão descansar enquanto não se chegar a um exemplo desses, em que as eleições não terão qualquer resultado prático, pois o que interessará é o povo governar o mundo, através da força, como é óbvio.

O meu conceito de vida é bem diferente, onde cada um tem direito à sua liberdade, desde que acabe onde começa a do outro; em que os brancos, negros, muçulmanos e hindus são todos diferentes, todos iguais; em que as opções sexuais a cada um dizem respeito; em que homens e mulheres são diferentes, mas iguais; em que não temos que nos envergonhar do passado e nos devemos orgulhar do contributo que demos ao mundo – nomeadamente com os Descobrimentos –; ou que devemos lutar contra todas as formas de totalitarismo.

Por todos esses valores, digo que entendo que a legalização da eutanásia devia ser referendada, pois não estava no programa eleitoral do partido vencedor, e que votaria a favor. Se é verdade que a legalização da morte assistida pode levar a alguns atropelos fundamentais da vida humana, desde filhos que querem que os pais não estejam numa cama de hospital para receberem rapidamente a herança, até a profissionais de saúde que se fartem de tratar de doentes que estão há anos agarrados à cama, e decidem desligar as máquinas ou dar-lhes uma injeção para morrerem rapidamente.

Tudo isso terá de ser visto com muito cuidado, mas o sofrimento para lá do aceitável não deve ser obrigatório. A pessoa pode pedir para se pôr fim ao seu sofrimento. Ninguém merece estar preso para sempre a uma cama sem poder acabar com esse sofrimento. Veja-se os tão falados filmes Mar Adentro ou Million Dollar Baby e aprenda-se alguma coisa.

vitor.rainho@sol.pt