Maçonaria. Vital Moreira defende proposta do PSD para evitar “compadrio”

Maçons criticam proposta do PSD para que os políticos declarem associações a que pertencem

O constitucionalista e ex-eurodeputado do Partido Socialista Vital Moreira apoia a proposta do PSD para que os políticos e altos cargos públicos sejam obrigados a declarar se pertencem a associações como a maçonaria e Opus Dei.

“Não me parece que essa informação constitua um dado pessoal que deva ser protegido. A defesa do interesse público, que constitui o único fim de todos os cargos públicos, exige a declaração de interesses privados que com ele possam conflituar. E, muitas vezes, conflituam”, escreve, no blogue Causa Nossa, o constitucionalista.

Vital Moreira vai mais longe e alerta que “a filiação em grupos de interesses privados, em geral, e nas ‘irmandades’, em especial (dada a sua elevada solidariedade entre os membros), constitui um dos grandes fatores de favoritismo e de compadrio no exercício de cargos públicos, nomeadamente no recrutamento de pessoal, na contratação pública, no licenciamento e na fiscalização, na atribuição de subsídios e de outras vantagens públicas, na dispensa ou fechar os olhos ao incumprimento de obrigações públicas”.

O constitucionalista lembra que defende, há muito tempo, que “os titulares de cargos públicos (desde os políticos aos juízes) e os decisores públicos em geral devem declarar a sua filiação em associações privadas, desde os clubes de futebol às chamadas organizações dicretas, como a maçonaria e Opus Dei”.

A proposta está a gerar polémica, mas dificilmente será viabilizada na Assembleia da República. A líder parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, assumiu, no programa Circulatura do Quadrado, que “o PS está contra e espero que vote contra”. A socialista classificou a ideia do PSD como “um disparate”, porque as ligações a estas associações são do “domínio da vida privada”. O PCP também recebeu a proposta com muitas reservas e se os dois partidos votarem contra será chumbada.

Maçons atacam proposta A maçonaria reagiu de imediato. O grão-mestre do Grande Oriente Lusitano (GOL), Fernando Lima, enviou cartas ao Presidente da República, ao presidente do Parlamento e ao primeiro-ministro a alertar que a proposta viola a Constituição da República. O grão-mestre do GOL considera que abre um “precedente perigoso” e revela “um preconceito contra a maçonaria”.

Fernando Lima, em declarações ao Nascer do SOL, lembrou que dois ex-presidentes do PSD foram maçons. Emídio Guerreiro, que liderou o partido em 1975, e Nuno Rodrigues dos Santos, presidente do PSD em 1983, pertenceram ao Grande Oriente Lusitano.

O grão-mestre da Maçonaria Regular Portuguesa também assumiu uma posição pública “dada a gravidade dos factos”. Armindo Azevedo apela ao “bom senso das entidades que regem a nossa Nação, para que defendam os direitos e os princípios estabelecidos pela Constituição portuguesa”.

Ao i, Adelino Maltez, que se candidatou à liderança do GOL, em 2017, não tem dúvidas de que a proposta é inconstitucional e só serve para afastar as pessoas da política. “Isto visa afastar as pessoas da política e é pena. As pessoas, sujeitas a este olhar, receiam ir para a política”. Para o professor universitário, esta “visão controleira do Estado é ridícula. Há liberdade para ser budista, maçom, liberal ou outra coisa qualquer”.

secretismo e opacidade A proposta que deu origem a esta discussão foi apresentada pelo PAN em dezembro de 2019. O projeto de lei da autoria de André Silva prevê que a declaração seja facultativa, mas o PSD quer ir mais longe e propõe que seja obrigatório. A ideia é que os políticos declarem todas as associações a que pertencem.

O PAN argumentou, na altura, que “não é concebível que os titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos, sob quem impendem deveres especiais de transparência, continuem a não ter incentivos autónomos para declarar a sua filiação em organizações que têm regras de funcionamento marcadas por uma forte opacidade, por um grande secretismo e que apelam a fortes laços de hierarquia e solidariedade entre os seus membros”.

“Não tenho dúvidas de que a filiação em grupos de interesses privados, em geral, e nas ‘irmandades’, em especial, constitui um dos grandes fatores de favoritismo e de compadrio no exercício de cargos públicos”