O português de Portugal

E os políticos nem para dar o exemplo são bons. Por incrível que pareça, o refeitório e o restaurante da Assembleia da República estão abertos. Mas então serão os senhores deputados cidadãos de primeira e os restantes cidadãos de segunda?

por Álvaro Covões

Os portugueses são, ainda hoje, considerados um povo de brandos costumes. Diz-se que no Estado Novo os portugueses, com receio da autoridade do Estado, e da polícia política, não questionavam nem contestavam. Os políticos na época, para garantirem a tranquilidade do regime, além do exercício de força musculada sobre quem os questionasse, mantiveram o preço dos alimentos básicos, como o pão, no mesmo nível durante décadas. E assim o regime se manteve 48 anos.

46 anos passados do 25 de Abril, o povo continua brando. Ou seja, apesar das liberdades e garantias, da democracia e da Constituição, continuam a questionar pouco e a demonstrar receio da autoridade do Estado.

Este é o grande sucesso do confinamento em Portugal, onde não assistimos a manifestações populares, nomeadamente pela proibição do direito ao trabalho.

O peso dos funcionários públicos na sociedade é substancial. Esta é provavelmente a razão por que a carga fiscal é das mais altas da Europa, garantindo emprego para muitos e assegurando ‘tranquilidade’ popular. É bom lembrar que até aumentos aconteceram na função pública em pleno covid.

Este é um país, sob o ponto de vista económico, profundamente dividido em dois: o país público e o país privado.

Um país de pequenas e médias empresas, um país em que os trabalhadores do setor privado vivem há décadas sobressaltados, com receio de verem a sua empresa fechar, com receio do Estado, vivem calados e com medo. Os peritos que o Governo ouve, desconhecem o país real. Muitos dos assessores políticos, desconhecem o país real.

E o grande embate vai ser o da retoma económica. Muitas pequenas e médias empresas não vão reabrir. Muitas famílias vão ficar sem rendimentos, apenas porque os peritos insistem em manter a economia fechada. O comércio, a restauração, a hotelaria, a cultura, os serviços, vão ter de reabrir mesmo. Com este nível de apoios financeiros, as empresas vão colapsar. Vão ficar fora do mercado.

E os políticos nem para dar o exemplo são bons. Por incrível que pareça, o refeitório e o restaurante da Assembleia da República estão abertos. Mas então serão os senhores deputados cidadãos de primeira e os restantes cidadãos de segunda?

Qualquer economista percebe a importância de manter parte da economia a funcionar. Em Portugal optamos pelos setores primário, secundário e serviços essenciais, encerrando tudo o resto.

Não seria então de prever, num eventual novo confinamento, encerrar os que nunca encerraram, mantendo os que há 12 meses têm sido impedidos de trabalhar a funcionar?

A saúde mental dos portugueses. A saúde mental dos empresários. A sobrevivência do tecido empresarial composto por micro, pequenas e médias empresa tem de ser considerado de uma forma mais séria e eficaz.

Uma palavra ao senhor ministro da Administração Interna: não fica bem denunciar a discriminação do Reino Unido a todos os viajantes que vêm de Portugal e são sujeitos a uma quarentena obrigatória de 10 dias, quando nós obrigamos a uma quarentena obrigatória de 14 dias a quem chega do Reino Unido. Uma boa diplomacia económica garante-se com boas práticas e Portugal precisa de garantir os fluxos de turismo britânico para salvar o verão e, por consequência, a economia.