Pandemia coloca a nu as fragilidades da economia portuguesa

Alerta é do economista Eugénio Rosa que diz que o modelo de desenvolvimento em Portugal continua a basear-se em baixos salários.

Um dos aspetos que a crise gerada pela pandemia veio colocar a nu “foi a extrema fragilidade, dependência e vulnerabilidade da economia portuguesa”. O alerta é do economista Eugénio Rosa que diz ainda que esta fragilidade “determinou que os efeitos da crise estejam a ser devastadores, o que torna a recuperação muito mais difícil e demorada”.

No seu mais recente estudo, Eugénio Rosa defende que tal só acontece porque “o modelo de “desenvolvimento” que continua a imperar em Portugal assenta fundamentalmente em baixos salários e em produtos de média-baixa e baixa intensidade tecnológica e de conhecimento”.

Para sustentar a sua opinião, o economista utiliza um gráfico com dados do Eurostat que mostra os custos da mão obra em euros em Portugal, na União Europeia e na Zona Euro. A título de exemplo, no ano passado, o custo hora da mão de obra em Portugal – 15,7 euros – era menos de metade do custo hora da Zona Euro (32,3 euros), estando também longe do da União Europeia: 28,5 euros.

Eugénio Rosa usa ainda outro exemplo que, no seu entender, “torna ainda mais clara a situação de que o modelo de “desenvolvimento” português continua a basear-se fundamentalmente em baixos salários e na sobre explorações dos trabalhadores portugueses, pois mostra com clareza quão são mais elevados os custos de mão obra na UE”.

Vejamos o exemplo: no ano passado, o custo hora da mão obra na Zona Euro era superior em 105,7% ao de Portugal, e o da Zona Euro era 81,5% mais elevado do que no nosso país. Face a estes dados, também do Eurostat, Eugénio Rosa não tem dúvidas: “Portugal continua a ser um maná para as empresas, nomeadamente as estrangeiras que pagam salários de países não desenvolvidos. Tudo isto mostra bem a sobre exploração a que estão sujeitos os trabalhadores portugueses”, acusa.

Exportações No que diz respeito às exportações, o economista volta a usar dados específicos: em 2018, a percentagem de produtos de alta tecnologia nas exportações totais portuguesas representou apenas 4%, enquanto a média dos países da União Europeia foi de 17,9%, ou seja, 4,5 vezes mais.

No entanto, o emprego em Portugal em setores de alta e média tecnologia representava, em 2019, apenas 3,3% do emprego total, enquanto na União Europeia correspondia a 6,2%. “Estes valores revelam bem a fragilidade da economia portuguesa já que quer a estrutura das exportações portuguesas quer a estrutura produtiva do nosso país continua a assentar fundamentalmente em produtos de média-baixa e de baixa tecnologia e conhecimento”.

Isto “determina que a economia portuguesa, por um lado, seja extremamente vulnerável a crises e à concorrência externa e, por outro lado, esteja muito dependente de outros países em produtos de média-alta e alta tecnologia”. Por isso, Eugénio Rosa defende que “tudo isto é também uma consequência do baixíssimo investimento quer privado quer público feito no nosso país”.

E o investimento? Ainda baseado em dados do Eurostat, o economista diz que, no passado, o stock de capital (investimento) por empregado era 57,7% da média dos países da União Europeia e 50,8% dos da Zona Euro. “E a previsão para 2021 é de agravamento desta relação”, diz o economista, garantindo que “o próprio Estado dá o mau exemplo”.

Ora, entre 2012 e 2020, o Investimento público foi de 34.012 milhões de euros, enquanto o Consumo de Capital Fixo público atingiu 47.300 milhões de euros. Mas o que representam estes valores? “Isto significa que o novo investimento público foi inferior ao que se desgastou ou desapareceu pelo uso e pela obsolescência em 13.288 milhões de euros”.

“Assim, é evidente que a produtividade do trabalho será baixa, e nunca teremos uma economia e um país desenvolvido. A obsessão do défice está a destruir o país, pois sem investimento não há nem uma economia forte nem progresso”.

Face a esta análise, Eugénio Rosa não tem dúvidas: “10 anos após a entrada da troika, o governo e as entidades patronais parecem nada ter aprendido para evitar a repetição da mesma situação”