‘Lei’ das portagens cai de vez

O Tribunal Constitucional decidiu a inconstitucionalidade da norma que negava direito aos proprietários para se defenderem da acusação de passarem numa portagem sem pagar.

O Tribunal Constitucional confirmou, ontem, pela terceira vez (e definitiva), a inconstitucionalidade da lei que previa que o proprietário de um automóvel tinha apenas 30 dias para provar que não era o condutor de um veículo que passou numa portagem sem a pagar – os automobilistas deixam de ficar sujeitos ao prazo e, ao contrário do que acontecia até aqui, conquistam a possibilidade de provarem em tribunal que não estavam ao volante naquela ocasião.

Ao i, Gabriela Barreto, diretora jurídica do Automóvel Clube de Portugal (ACP), classifica esta decisão como “uma boa notícia, que peca apenas por tardia”. “Esta decisão vem deitar por terra uma norma que não era admissível para a Justiça portuguesa e que, muitas vezes, resultou em situações que penalizavam de forma injusta os proprietários legais dos automóveis em causa”, embora estes não tivessem qualquer responsabilidade na infração cometida. “É apenas de lamentar que tenha sido necessário aguardar praticamente 15 anos para que esta injustiça fosse corrigida”, diz. A norma cai de vez.

A lei agora considerada inconstitucional estava em vigor desde 30 de junho de 2006 e previa o prazo de 30 dias para que o proprietário do automóvel fornecesse às autoridades os dados completos do alegado condutor infrator (nome e morada completos e número de identificação fiscal). Caso não o conseguisse fazer dentro do prazo previsto teria de ser o próprio a assumir o pagamento do valor da portagem e ainda dos custos administrativos acrescidos em dívida (penalizações que, muitas das vezes, chegavam às centenas de euros). A partir deste ponto, o proprietário do veículo ficava sem direito a recorrer da decisão (ou a requerer a devolução do dinheiro).

“Não era admissível termos em vigor uma lei que retirava aos cidadãos a possibilidade e o direito de se defenderem e provarem que não eram eles que seguiam ao volante do veículo naquele momento. Era uma norma que não respeitava o direito à defesa e o princípio de presunção de inocência, como tal, não podia nunca estar de acordo com aquilo que devem ser as leis do Estado de Direito em que vivemos”, refere a diretora jurídica do ACP.

“Várias queixas” em 15 anos Durante vários anos foram muitas as queixas de condutores acusados de passar uma portagem sem pagar, mas que garantiam não se encontrarem ao volante, nem naquele local nem naquela hora, assim que a coima lhes chegava a casa. Gabriela Barreto admite ao nosso jornal que, neste período, diversos sócios do ACP fizeram chegar à associação reclamações do género. As razões variavam: títulos de propriedade dos automóveis que ficavam por alterar pelos novos donos (privados ou stands); carros emprestados; e até mesmo roubados. “Muitas vezes os proprietários não conseguiam identificar os condutores. Era difícil localizar os novos proprietários, as pessoas a quem, naquele dia, tinham emprestado o seu veículo, e ainda mais quem o tinha roubado. Isso resultava numa série de injustiças. Para agravar, os proprietários não tinham direito a recurso”, descreve Gabriela Barreto.

Agora, os proprietários que aleguem não serem os responsáveis pelo incumprimento numa via com portagens continuam, numa primeira fase administrativa, a terem de assumir o pagamento desses valores, mas, numa segunda têm a possibilidade de contestarem a decisão, provando em tribunal que não eram eles que seguiam ao volante.