A democracia tem dias…

Segundo Vasco Lourenço, a dupla cgtp/PCP já respondeu pela organização e segurança do desfile na Avenida, como se fossem os donos do 25 de Abril…

Em vésperas da celebração ritual do 25 de Abril, com a solenidade parlamentar e o desfile nas ruas promovido pelos ‘guardiões’ do costume, foi divulgada uma curiosa sondagem, realizada pelo ISCTE/ ICS, cujos resultados trouxeram algumas surpresas, ao revelarem um ‘estado de alma’ dos inquiridos, maioritariamente contrário à narrativa habitual para consumo mediático.

Em resumo: segundo o Expresso, só 10% dos portugueses ouvidos na sondagem considera viver numa democracia plena. A esmagadora maioria pronunciou-se por uma democracia ‘assim-assim’, defeituosa em diferentes graus, e, até, uma minoria de 4% defendeu que Portugal não é um sistema democrático.

São conclusões pouco abonatórias, quase meio século após o movimento que derrubou o regime anterior, embora se compreendam, tendo em conta que as antigas corporações continuam a mandar e as novas não querem ficar atrás. 
Em vésperas de mais um 1.º de maio, adivinham-se discursos, na mesma linha irreformável, sempre sob o patrocínio da CGTP/PCP, que, segundo o insuspeito Vasco Lourenço, foi a dupla que já respondeu pela organização e segurança do desfile na Avenida, como se fossem os donos do 25 de Abril…

Não admira, por isso, que os ‘organizadores’ se tenham desdobrado nos argumentos para barrar a participação de quem é surdo à sua ‘ladainha’. 

De facto, pretender comparar o PCP ou o Bloco com qualquer signo de liberdade, é tão bizarro como atribuir à ‘geringonça’ montada pelo PS as virtudes de um carro a sério… 

É uma ilusão perigosa, quando já passou tempo suficiente para se perceber que, geneticamente, os comunistas do PCP ou do Bloco, continuam adeptos fervorosos de regimes totalitários, fingindo que respeitam o jogo democrático e ‘as amplas liberdades’, enquanto escorraçam quem não recita a sua cartilha ou procura pensar por si próprio.
Basta uma singela incursão retrospetiva pela experiência vivida durante quase meio século, para concluir que o histórico pós 25 de Abril é fértil em atropelos e episódios pouco recomendáveis. 

Jerónimo de Sousa não é hoje menos devoto dos ícones soviéticos do que Álvaro Cunhal ao seu tempo, nem Francisco Louçã, apesar das vestes académicas e de conselheiro de Estado, alguma vez renunciou ao ‘chamamento de Trotsky’, como bandeira ideológica. 

Neste quadro, fortemente influenciado pelas esquerdas comunistas, bem pode a organização dos Repórteres Sem Fronteiras incluir Portugal, decerto por distração, no ‘top ten’ da liberdade de imprensa, quando os media se assemelham cada vez mais entre si, com raras exceções, pastoreados por súbditos obedientes aos clãs dominantes.

A sondagem ISCTE/ ICS arrisca-se, por isso, a ser um retrato mais genuíno sobre o pulsar do país do que se imaginaria, em particular, ao verificar-se que as críticas ao sistema são oriundas, sobretudo, de camadas desfavorecidas, cujo rendimento disponível não lhes permite ir além do viver ‘difícil’ ou ‘muito difícil’.

Depois, o ‘cartel’ de quem decide os festejos do 25 de Abril – como lhe chamou, apropriadamente, António Barreto –, só veio confirmar que há ‘maçonarias’ instaladas, democratas por alcunha. 

Quando a ala esquerda do PS se confunde com o BE e o PCP, e quando, à direita, o PSD não descola e o CDS se afunda, cedendo espaço ao Chega e à Iniciativa Liberal, convirá que alguém saia do conforto e retire a coragem do baú.

É urgente devolver a confiança aos portugueses, demonstrando-lhes que há futuro para além da clique agarrada ao pote, e que a estagnação ou o crescimento anémico da economia não são fatalidades, agora respaldadas pela pandemia, que tem as ‘costas largas’. 

É certo que os impasses se eternizam, porque convém à oligarquia, desde os tropeções na Justiça, com a incerta criminalização da corrupção ou do enriquecimento injustificado, até à politização da Saúde ou Educação, como ferramenta de doutrinação ideológica. 

Entretanto, o PS captura, metodicamente, o aparelho de Estado, partilhando os ‘despojos’ com o PCP e o Bloco, de que é exemplo recente a nomeação do diretor-geral da Segurança Social, sem outro currículo que não seja ser um ‘boy’ formado na JS e transitado por gabinetes ministeriais, incluindo o de António Costa. 

Perdeu-se o pudor e o Governo age como se tivesse ‘direitos de saque’ sobre território conquistado, sem ter de prestar contas a ninguém. Uma a uma, instituições com selo de independentes, foram caindo sob a égide do PS – Banco de Portugal, Tribunal de Contas, Procuradoria Geral da República, Conselho das Finanças Públicas.

Se os festejos do 25 de Abril ou do 1.º de Maio servissem para expor estes e outros abusos do poder, praticados com uma sobranceria que já nem disfarçam, talvez tivessem outro eco. Mas a liturgia obedece a um formato rígido, cujo sermão há muito que está escrito. E não muda…