Futuro de Espanha pode ser decidido nas urnas de Madrid

Isabel Diaz Ayuso afirmou-se como a grande figura da oposição, eclipsando o próprio líder do seu partido. A sua possível aliança com a extrema-direita do Vox pende no fio da navalha. 

As eleições autonómicas em Madrid, esta terça-feira, converteram-se num campo de batalha – no sentido figurativo, apesar de vários dirigentes políticos terem recebido balas no correio – que pode ditar o rumo da política espanhola. De um lado, temos Isabel Diaz Ayuso, do Partido Popular (PP), que encabeça o executivo madrileno, tendo conseguido ultrapassar o líder do seu partido, Pablo Casado, como rosto da oposição, ao mesmo tempo que rejeitava o Ciudadanos e se aproximava do Vox, de extrema-direita. Do outro, está o PSOE, do primeiro-ministro Pedro Sánchez, que vê o seu candidato, Àngel Gabilondo, seguido de perto nas sondagens pelo Más Madrid, fundado por Iñigo Errejón, antigo dirigente do Unidas Podemos, que apoia o Governo de Sánchez.

As sondagens mostram quase um empate técnico, dentro das margens de erro, entre duas potenciais coligações com visões radicalmente diferentes, à procura de maioria. O PP e Vox (com 40,9% e 9,4% das intenções de voto, segundo o El País) versus PSOE, Más Madrid e Unidas Podemos (com 21,2, 16,3 e 7,3%, respetivamente).

No entanto, seja para que lado penda a balança, o certo é que Ayuso conseguiu como ninguém cavalgar o cansaço face às medidas contra a covid-19, destacando-se ao recusar os apelos do Governo central para fechar ou restringir negócios. Ao mesmo tempo que criticava essas medidas de saúde pública com velhos chavões – “comunismo ou liberdade”, disse no Twitter a dirigente conservadora” – que trazem à memória as tensões da Guerra Civil. 

“Madrid será a tumba do fascismo”, ripostou o candidato do Unidas Podemos, Serigne Mbayé, um emigrante de origem senegalesa, de 46 anos, citado pela RTVE. Repetia o mote republicano durante o cerco à capital pelas forças de Franco, em 1936.

“Quando te chamam fascista, estás do lado certo”, respondeu publicamente a líder do executivo madrileno, dias após serem enviadas ameaças de morte ao ministro do Interior, Fernando Grande-Marlaska, à diretora-geral da Guardia Civil, María Gámez, e ao líder do Unidas Podemos, Pablo Iglesias – entretanto, chegaram um total de sete envelopes com balas e uma faca a vários dirigentes políticos. 

Escolha difícil Contudo, para lá da disputa pela memória da Guerra Civil, uma ferida sempre em aberto na política espanhola, são mesmo as preocupações do dia a dia que apoquentam muitos madrilenos. E, na prática, é-lhes colocada uma escolha bem complicada. Optar pela potencial coligação de direita, liderado por Ayuso, e a arriscar um ressurgimento da covid-19 devido ao manter das restrições levantadas, ou pelos partidos que sustentam o Governo, e os impactos económicos das medidas de mitigação. Não se trata de um dilema exclusivo de Espanha – muitos analistas traçam um paralelo entre a campanha populista de Ayuso e a de Trump, no final do ano passado, baseada na mesma premissa. 

Ayuso “conseguiu capturar esse sentimento geral de que as pessoas estão mesmo cansadas da pandemia, querem normalidade e ser livres”, notou Pablo Simón, cientista político da Universidade Carlos III, ao Guardian. Notando que, apesar de, nos últimos anos, o PP ter sido erodido pelo Ciudadanos, e sofrido um golpe enorme com o crescimento do Vox, “o sucesso dela à direita é avassalador e os confrontos com o Governo de Sánchez pagaram dividendos”.