O roubo legitimado

Foi preciso que um certo vírus se espalhasse entre uma determinada comunidade para que as autoridades portugueses, há muito adormecidas, acordassem para um flagelo que teima em persistir há vários anos.

A situação indigna em que vivem os imigrantes que vêm para Portugal laborar numa área para a qual os tugas não estão minimamente virados, porque trabalhar arduamente, no campo, já não é ofício para eles, é desde sempre conhecida de todos, mas assobiar para o lado foi a política assumida por todos os governantes que se têm alternado nas rédeas do poder, pouco interessados em resolver um problema que até agora não os afectava.

Razões, bem fortes, de saúde pública, fizeram-nos despertar para a realidade, levando-os a procurar uma solução que vem com mais de uma década de atraso.

E de que se lembraram os iluminados socialistas que têm em mãos os destinos do País? Recorrer a património privado para alojar uma parte insignificante dos infelizes provenientes da Ásia Central!

Estruturas físicas do Estado não escasseiam por esse território fora, nomeadamente dentro do distrito de Beja, cerne deste fenómeno migratório, nas quais teria sido possível recolher quem vive em condições desumanas, mas a opção recaiu, naturalmente, num espaço que tem donos que daí auferem os seus rendimentos ou no qual encontraram um sítio para viver ou, simplesmente, passarem algum do seu tempo.

Certamente que entre a cambada de assessores que inundam os gabinetes ministeriais, pagos a peso de ouro através dos nossos impostos, ninguém se lembrou de advertir os seus amos de que a maioria das casas que compõem aquele empreendimento turístico são pertença de particulares, pelo que a sua abusiva apropriação por parte do Estado constitui uma clara violação de todos os preceitos constitucionais que garantem o direito à propriedade privada.

Mesmo após ter sido alertado para essa realidade, o governo fez orelhas moucas e, a coberto da noite e servido-se de uma Instituição centenária, com louváveis pergaminhos no garante dos direitos das populações e na defesa da coesão territorial, agora transformada numa espécie de guarda pretoriana do regime, tomou de assalto aquelas instalações, ao arrepio do estado de direito que a partidocracia nos que fazer acreditar que representa.

Os próprios imigrantes envolvidos neste abuso de poder, sem culpa alguma porque não foram ouvidos nem achados para o efeito, foram abusivamente retirados de suas casas em plena madrugada, passando-se, assim, por cima das normas processuais penais que proíbem as autoridades policiais de entrarem em habitações particulares durante o período nocturno, e foram transportados, como se gado se tratassem, para um local que não escolheram e no qual não se sentem confortáveis.

Desde sempre, sobretudo entre aqueles que estudaram direito, que nos é ensinado que o Estado é uma pessoa de bem.

Nada mais falso na actualidade!

Temos a infelicidade de viver num Estado déspota, que despreza as liberdades individuais, e servido nos seus diversos escalões não por gente escolhida com base na meritocracia, como seria desejável e obrigatório, mas sim no peso do cartão de militância partidária, sendo que as preocupações das seitas que dele se apoderaram estão acima do interesse nacional.

Mais angustiante, em particular para todos quantos prezam a liberdade, é que a lei vigente, no caso concreto a que regulamenta a protecção civil, foi invocada pelas autoridades governamentais para se justificarem pelos seus actos.

Ou seja, o descarado roubo estatal com que fomos confrontados está, supostamente, legitimado por uma absurda lei que, ao invés de nos proteger, põe ao nossos bens pessoais à mercê de quem, escudado em poderes públicos de que foi investido, se lembra de nos arrombar a porta de casa e tomá-la de assalto.

O senhor que ainda está ministro da administração interna, uma verdadeira aberração da natureza, teve a ousadia de vomitar palavras no sentido de que não tinha que dialogar com os proprietários do espaço turístico em questão, porque a lei lhe permite ocupá-lo sem prévia autorização daqueles.

É a política do “eu quero, posso e mando” no seu máximo esplendor!

Nem Salazar, cujo nome, sempre que é entoado, continua a provocar urticária junto destes falsos democratas armados em defensores das amplas liberdades, mesmo no meio de guerras a sério, nada comparáveis a esta palhaçada que por aqui grassa, se atreveu alguma vez a apoderar-se do que não lhe pertencia!

Felizmente, apesar das sucessivas tentativas, muitas bem sucedidas, de governamentalizar o poder judicial, ainda há tribunais que se preocupam em salvaguardar o estado de direito, pelo que o Supremo Tribunal Administrativo suspendeu a requisição civil que permitiu a invasão, com recurso à força, das instalações turísticas nas quais os imigrantes foram despejados, ordenando a sua imediata retirada daquele local.

Aguarda-se, com natural expectativa, para se saber como o ministro que nunca o deveria ter sido vai descalçar esta bota, apesar de se antever as próximas jogadas jurídicas para protelar, ou mesmo inviabilizar, a decisão judicial hoje mesmo assumida.

Este é o Portugal socialista em que mergulhámos, mas por nossa exclusiva culpa, porque, mesmo perante os constantes escândalos que têm vindo a ensombrar a governação de esquerda, continuamos a depositar o nosso voto nos mesmos corruptos, incompetentes e autoritários de sempre.

Um povo dominado por uma cegueira colectiva, incapaz de descortinar a realidade da fantasia, que aceita, sem pestanejar, a irremediável condução com destino à pobreza.

Há duas décadas também os venezuelanos se deixaram seduzir pelas maravilhas do socialismo, aceitando, livremente, as falsas promessas que lhes foram oferecidas pelo chavismo.

Hoje, para não morrerem à fome, vêem-se forçados a vasculhar no lixo com o intuito de desencantarem algum alimentos, mesmo que podre, que lhes alivie o vazio que lhes enche a barriga.

É o que nos espera a nós, portugueses, se teimarmos em não abrir os olhos.

Porém, quando o fizermos, poderá ser demasiado tarde. Um dia, certamente nada mesmo distante, vamos acordar na república bolivariana de Portugal! 

  

Pedro Ochôa