Centeno. “O Novo Banco era novo, mas herdeiro de velhos problemas”

Foi preciso fazer dele um bom banco. E a sua reestruturação termina este ano. Atestada pela Comissão Europeia. Assim as instituições portuguesas o permitam”, garantiu o governador do Banco de Portugal.

Centeno. “O Novo Banco era novo, mas herdeiro de velhos problemas”

“O Novo Banco era novo, mas herdeiro de velhos problemas e com muitos e complexos desafios pela sua frente. Não era um banco bom”. A garantia foi dada por Mário Centeno aos deputados onde esteve a ser ouvido na  comissão de inquérito à instituição financeira. E acrescentou: “Foi preciso fazer dele um bom banco. E a sua reestruturação termina este ano. Atestada pela Comissão Europeia. Assim as instituições portuguesas o permitam”.

Mário Centeno, que estava à frente das Finanças quando o Novo Banco foi vendido à Lone Star, deixou claro que esta alienação resultou de “um imperativo legal” e “foi a forma encontrada, difícil, com riscos para o Fundo de Resolução, no quadro do funcionamento de um mecanismo contingente de capital”.

A venda de um banco de transição, recordou “não foi uma venda de uma qualquer propriedade que se não se vende hoje vende-se amanhã”. E defendeu que este apelo à procrastinação chama-se azar em finanças”.

E apesar de recusar a metáfora de “fruta apodrecida” que foi usada, esta segunda-feira, pelo seu antecessor no Banco de Portugal, Carlos Costa, chamou a atenção não só para a existência de ativos problemáticos, como também o facto de o banco estar subcapitalizado. “Não foi uma surpresa que a primeira tentativa de venda do banco tenha falhado em 2015. Que surpresa ninguém querer comprar um banco subcapitalizado e cheio de ativos problemáticos, por um valor superior ao que foi injetado no momento da resolução”, referiu.

No entanto, Centeno fez questão de deixar um alerta sobre o Novo Banco ao considerá-lo “uma instituição de referência no espaço bancário nacional”, defendendo que é “banco preferido por milhões de famílias e empresas para depositar as suas poupanças e para obter financiamento, para investir, inovar e criar emprego de qualidade”. E referiu: “Lembremo-nos de que amiúde, quando dizemos Novo Banco, queremos dizer legado do BES”. 
 
Processo penoso

O governador admitiu, porém, que o processo do Novo Banco foi “penoso socialmente, politicamente, financeiramente”, o que representou “uma lição” para todos os envolvidos. E esclareceu: “É penoso socialmente, politicamente, financeiramente, em termos de todo o processo que envolve o sistema bancário, e portanto é uma lição que todos temos que aprender”.

Mário Centeno lembrou ainda que “são sete anos praticamente decorridos desde o dia da resolução” do BES, que ocorreu em agosto de 2014, sendo “um processo difícil em qualquer latitude, em qualquer país, e em qualquer jurisdição financeira, política, bancária”, acrescentando que “sete anos é muito tempo, de facto. E é isso, para mim, pessoalmente, neste momento como governador do Banco de Portugal, e nas funções anteriores que ocupei, aquilo que mais define este processo”, disse o líder do banco central acerca do tempo passado.

Mário Centeno também lembrou o não recurso do BES às linhas de capitalização pública disponibilizadas durante a como troika no Governo de Pedro Passos Coelho. “Isso é um momento-chave numa intervenção precoce, se pudéssemos tê-la feito, no Banco Espírito Santo. Havia os meios financeiros, havia o enquadramento institucional para o fazer, e havia uma compreensão de todos os intervenientes, de todos os agentes do setor, da importância de sairmos da crise com um sistema financeiro capaz”, lembrando que “não foi isso que aconteceu no Banco Espírito Santo, portanto quando chegamos ao momento da resolução, temos de facto um conjunto de ativos de menor qualidade”.

Aponta dedo à auditoria

Em relação às conclusões da recente auditoria realizada pelo Tribunal de Contas (TdC), o ex-ministro das Finanças apontou o dedo ao documento por não ter apresentado a demonstração do cálculo do défice de capital do Novo Banco.
“Há algumas incorreções e estas incorreções derivam, penso eu, de uma incapacidade do Fundo de Resolução e do Banco de Portugal em esclarecer o Tribunal de Contas sobre como (…) são validados todos os valores”, esclareceu aos deputados e aproveitou para lembrar que o Fundo de Resolução teve “oportunidade de se pôr à disposição para juntamente com o departamento de supervisão prudencial do Banco de Portugal, fazer uma demonstração, juntando os dados aos manuais” e mostrando como “é que aquele exercício é feito”. 

Uma “recomendação” que não foi seguida pelo Tribunal de Contas e levou Centeno a “contestar de forma tranquila” algumas conclusões da auditoria, notando que “não é correto dizer que o número não foi validado e demonstrado”. 
Recorde-se que, de acordo com o documento, o TdC admitiu que “não tem sido devidamente cumprida a obrigação do Novo Banco reportar a informação sobre a execução do Acordo de Capitalização Contingente, por falta de formalização do acordo sobre a forma e substância do suporte dessa informação e pelo atraso de preparação desse suporte pelo Novo Banco (face ao prazo contratual de trinta dias), alegando depender de contas auditadas”, apesar de garantir que isso não será impedimento para a injeção de dinheiro público na instituição financeira.

Já em relação à venda e ao mecanismo de capital contingente em que o Fundo de Resolução, Mário Centeno disse que nunca escondeu que havia riscos na venda: “Em abril de 2017 vim ao Parlamento e utilizei 24 vezes nessa audição a palavra risco, o risco estava lá, estava reconhecido, era um exercício de maior dificuldade. Nunca utilizei a palavra não antes”. “O que fizemos na venda foi mitigar riscos. Disse-o em janeiro de 2018, em maio de 2018, foi mitigar risco. Quando se mitigam riscos, não se eliminam riscos”. 

Afasta compra

O governador do Banco de Portugal afastou ainda a hipótese de o Novo Banco vir a comprar o EuroBic por estar impedido de fazer aquisições até final do ano.

“O Eurobic está num processo de venda neste momento, que eu saiba o Novo Banco não pode fazer aquisições neste momento. A Comissão Europeia tem o libertar dessas restrições e isso não é um processo que eu veja compatível com o calendário que existe para a compra do EuroBic”, acrescentou.