Pandemia troca voltas às contas do Estado

O défice das Administrações Públicas agravou-se em 3.148 milhões até abril, atingindo os 4.845 milhões. Analista contactado pelo Nascer do SOL não se mostra surpreendido.

A pandemia continua a pôr em causa as contas da administrações públicas. De acordo com os últimos divulgados pela Direção-Geral do Orçamento (DGO), o défice agravou-se em 3.148 milhões de euros até abril, face a igual período do ano passado, subindo assim para 4.845 milhões de euros. Este agravamento deve-se ao «impacto do confinamento e da resposta à pandemia, incluindo as medidas extraordinárias de apoio direcionadas a famílias e empresas». Feitas as contas, a deterioração do défice resulta do efeito combinado da contração da receita (-6,3%) e do aumento da despesa primária (+6%).

Henrique Tomé, analista da XTB, admite que estava à espera destes números. «Devemos ter em conta o facto da atividade económica estar apenas agora a recuperar, depois de um início de ano condicionado devido ao aumento do número de infetados e devido às medidas de confinamento adotadas por todo o país», garante ao Nascer do SOL.
Até abril, a despesa com medidas extraordinárias de apoio às empresas e famílias atingiu os 2.761 milhões de euros, o que representa uma aceleração de 703 milhões face ao mês anterior. Também os apoios a cargo da Segurança Social (1071 milhões) mantêm um forte crescimento.

Os mesmos dados destacam também os apoios extraordinários ao rendimento dos trabalhadores (226 milhões), os subsídios por doença e isolamento profilático (115 milhões) e os apoios ao emprego (652 milhões), tendo a execução até abril ultrapassado o valor orçamentado para 2021 (776 milhões).

No caso dos apoios às empresas, as despesas atingiram 1.606 milhões nos primeiros quatro meses do ano. O gabinete de João Leão destaca medidas como o layoff simplificado (337 milhões) e o apoio extraordinário à retoma progressiva de atividade (315 milhões).

«Ainda no âmbito das medidas de apoio aos custos com trabalhadores, o incentivo extraordinário à normalização da atividade empresarial atingiu os 157 milhões, enquanto os apoios aos custos fixos das empresas no âmbito do Programa APOIAR ascenderam a 798 milhões, tendo a execução até abril superado em mais de cinco vezes a despesa realizada no ano de 2020».

No seu conjunto, os apoios a empresas a fundo perdido – para suportar custos com trabalhadores e custos fixos – atingiram os 1.606 milhões (excluindo isenções de TSU), tendo em quatro meses, sido ultrapassada a execução de todo o ano de 2020 (1.409 milhões).

Um comportamento que não surpreende o analista da XTB. «Tanto o aumento das despesas como do défice são resultado da baixa atividade económica referente ao início do ano devido às medidas de confinamento e à constante necessidade de existir uma intervenção por parte do Estado para apoiar as empresas e as famílias portuguesas», refere ao nosso jornal.

Receitas caem

Do lado da receita, as medidas de apoio ascenderam a 480 milhões, destacando-se a prorrogação de pagamento de impostos, a suspensão de execuções fiscais e a isenção da TSU – medidas de apoio à tesouraria das empresas e ao rendimento das famílias.

Face ao abrandamento da atividade económica, a receita fiscal e contributiva caiu 10%. «A generalidade dos impostos evidencia quebras, sendo de destacar a forte redução do IVA (-12,4%) em termos comparáveis (ajustada do efeito dos planos prestacionais)».

Por seu lado, a despesa primária cresceu 6% impulsionada pela Segurança Social (+15,5%, ou seja, o equivalente a 1345 milhões). No entanto, os mesmos dados lembram que excluindo as medidas específicas no âmbito da covid-19, destacam-se os acréscimos nesta área com prestações sociais (12,5%), nomeadamente com prestações de desemprego (39,3%) e com a prestação social para a inclusão (71,9%).

Também a despesa do SNS cresceu 5,7%, destacando-se o aumento muito elevado das despesas com pessoal (10,3%), em resultado sobretudo do reforço expressivo do número de profissionais de saúde em 6,6% (+8 968 trabalhadores face a abril de 2020). Já os salários dos funcionários públicos aumentaram 4,6%, refletindo as contratações de pessoal e os encargos com valorizações remuneratórias. O Ministério das Finanças chamou ainda a atenção para o «aumento muito expressivo de 6,3% da despesa com salários dos professores».

Uma tendência que, no entender do mesmo analista, «seria quase inevitável», embora a economia nacional esteja a começar «a reabrir», defendendo que «este será um processo lento e gradual».

Otimismo em relação ao futuro 

Para Henrique Tomé, os próximos meses deverão revelar-se positivos, especialmente quando o país conseguir atingir a imunidade de grupo através do processo de administração das vacinas contra a covid. E antevê: «O facto de nos estarmos a aproximar do período de verão poderá também dar o ‘boost’ necessário que a economia portuguesa precisava para recuperar a um ritmo mais elevado».