Turismo. Uma decisão “injusta”, “má” e “penosa” para o Algarve

Responsáveis do setor do turismo algarvio dizem que a decisão não se percebe. Os cancelamentos já começaram e há quem diga que o objetivo do Reino Unido é que os britânicos não passem férias fora do país

Um balde de água fria foi o que os empresários e responsáveis do setor turístico algarvio sentiram com a decisão do Reino Unido de tirar Portugal da sua ‘lista verde’, principalmente numa altura em que o turismo estava a começar a revitalizar.

A incompreensão face a esta decisão é notória. “Não percebemos qual a base racional em que esta decisão se suporta na medida em que o processo de vacinação no Reino Unido está já bastante avançado, com 75% dos adultos com uma dose e 50% com duas”, começa por dizer ao i João Fernandes, presidente da Associação de Turismo do Algarve.

O responsável lembra que também em Portugal este processo está a avançar e que os dois países têm até “níveis semelhantes da incidência da pandemia”. Já especificamente para a região do Algarve, João Fernandes recorda que a região “desde o início da pandemia que tem valores de novos casos e de óbitos substancialmente mais reduzidos que a média portuguesa”. É, aliás, a região em Portugal continental “com melhores resultados e é o principal destino com cerca de 2/3 das dormidas de britânicos em hotéis a acontecerem na região”.

E a decisão do Reino Unido já começou a fazer estragos. Diz João Fernandes que desde que os media britânicos começaram a anunciar a saída de Portugal da lista verde “houve logo um impacto nas reservas que estavam previstas para as semanas seguintes”. Mas é mais do que as reservas: “Há um impacto na confiança dos britânicos na medida em que estas decisões são, no fundo, inesperadas. Esperemos que tão breve quanto possível esta decisão seja revertida”.

Também João Soares, que representa o Algarve na Associação da Hotelaria de Portugal (AHP) e que é dono de uma unidade hoteleira algarvia, diz ao i que a decisão britânica “é muito má para o Algarve”. E explica: “Já estavam todos a preparar o verão. Muitos hotéis propuseram até muitos salários um pouco mais altos para segurar os recursos e agora vemos esta decisão acontecer, o que é, de facto, um drama”.

“Isto para nós, de facto, é uma perda enorme para o destino e para o próprio país até porque ia ajudar a economia nesta fase difícil. Vai ser uma chatice”, diz ainda João Soares, que não tem dúvidas que esta decisão poderá estar relacionada com questões económicas. “Os ingleses desde sempre defenderam que os seus cidadãos ficassem em solo britânico apesar das férias. Vamos ver se a parte diplomática consegue fazer alguma coisa”.

É que, apesar de outros mercados poderem continuar a passar férias em Portugal, não será a mesma coisa. “Nenhum mercado tem a expressão e a dimensão do mercado britânico. Há zonas no Algarve, como Albufeira, por exemplo, que é completamente dependente do mercado britânico”.

A decisão é, portanto, uma notícia “má e muito penosa”, principalmente pelos cancelamentos, uma vez que muitas empresas já tinham tudo preparado para este verão.

 

“É injusto”

O sentimento é partilhado por Elidérico Viegas, presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA), que considera a decisão “injusta” e que não é boa nem para o Algarve nem para o país. “Embora a decisão possa ser revertida daqui a três semanas – e nós acreditamos que seja, porque os números que temos estão abaixo daqueles mínimos considerados seguros – a verdade é que interrompemos um ciclo crescente em que vínhamos de um grande aumento de procura por parte dos ingleses e que, embora continuem a vir, óbvio que as restrições impostas no regresso, designadamente a quarentena, vai contribuir para desmotivar muita gente que pensava vir de férias e assim já não virá”, lamenta o responsável ao i.

E perfilha a opinião de João Soares, reforçando que o  Governo britânico tem desaconselhado os seus cidadãos a viajar. Aliás, aconselha toda a gente a não viajar. “Penso que a decisão é tomada também na perspetiva de evitar a saída de britânicos para o exterior, por razões económicas”. “O Governo britânico tem uma componente económica de tentar evitar que os britânicos viagem para o exterior e a covid-19 está a ser usada como arma de arremesso”, acusa.

Para já, não há dúvidas de que será um “grande golpe” para as empresas algarvias. “Tínhamos previsões de ter um verão melhor que no ano passado. Ainda não está totalmente em causa mas não é bom sinal”, diz.

O responsável lembra que os números algarvios são inferiores ao resto do país e não tem dúvidas: “Temos estado a ser penalizados por situações que o resto do país atravessa, nomeadamente a região de Lisboa”.

E defende: “A nossa diplomacia, em nome do interesse público, devia influenciar o Governo britânico no sentido de destinos como o Algarve poderem ser incluídos na lista verde dos destinos não só pelo nosso interesse mas no interesse dos próprios britânicos”. Até porque, na sua opinião, “está a pagar o justo pelo pecador”.

É que a situação é “complexa”. “Uma máquina que estava a crescer, que vinha a ser montada com companhias aéreas, transportes, hotéis, tudo isto exige muito cuidado na forma como estas coisas são abordadas, têm impactos muito complicados que exigiriam mais cuidado nas decisões políticas”, conclui Elidérico Viegas.